Dois textos recentes publicados no site nacional do PSTU sobre o cenário das pré-candidaturas do PSOL à presidência da República deixam claro uma coisa, o PSTU procura um álibi para não integrar a Frente de Esquerda*.
Por Márcio Bento – Secretário de Comunicação do PSOL SP
Uma das maiores dificuldades no campo do que poderíamos definir como esquerda socialista é a ausência de um nome com maior penetração de massas, capaz de furar o cerco que de forma deliberada tanto o governismo como a direita tradicional e sua mídia se esforçam em construir para os socialistas. O nome da Heloísa Helena em 2006 mesmo sem um programa mais definido foi capaz de criar certa coesão nos setores de esquerda e sem dúvida representou uma alternativa mais ampla.
Mas e agora, definitivamente não temos Heloísa Helena, que a despeito da possibilidade de fortalecer e construir o PSOL nacionalmente preferiu ser candidata em Alagoas. Mas temos a possibilidade inédita de selar um projeto coletivo, um programa que seja construído de forma partidária, desde a base e que seja submetido a uma discussão mais ampla junto aos demais partidos e setores que podem somar numa frente de esquerda. Não só o PSTU e PCB, mas setores que não se renderam à lógica do menos pior e à linha de menor resistência expressa pelos dois governos Lula e que deve ser reeditada com a campanha Dilma. Isso deveria incluir um diálogo com o MST, a Consulta Popular, os setores mais progressistas da igreja católica, a intelectualidade de esquerda, e com todos aqueles que historicamente lutaram pela construção de um programa de mudanças e viram suas expectativas frustradas no governo Lula.
Para se chegar a isso teríamos que superar rapidamente as fortes tendências na esquerda voltadas tanto para a fragmentação como para o perfil auto-proclamatório, que mesmo com todo o isolamento político que estamos vivendo, se recolocam com força. Tudo indica que quando mais se precisa de unidade, mais a esquerda se vê propensa a se dividir e pior, parece mais fácil a unidade a partir de uma figura com apelo de massas do que com base num programa (em 1994, por exemplo, o PSTU apoiou Lula, mesmo com um programa que já era muito mais moderado do que em 1989).
O PSTU parece, pelos artigos dos companheiros, repetir a velha formula de apostar na derrota do PSOL e na traição de seus quadros. Isso, caso acontecesse, segundo a interpretação dos seus dirigentes abriria um espaço à esquerda que viabilizaria sua política. Assim são rápidos nas caracterizações, mas incapazes de propor uma alternativa e atuarem de forma mais ampla e plural.
Nunca é demais lembrar que foi nas páginas do jornal do PSTU que se deu um dos episódios mais vergonhosos da história da esquerda brasileira. Quando num editorial, a direção do partido simplesmente ordenou a seus militantes que não assinassem as listas de apoio para a fundação do PSOL. Uma exigência legal, que naquela ocasião obrigava o PSOL a obter mais de 500 mil assinaturas para obter sua legalização e que não representava nenhuma adesão, compromisso ou subscrição política, apenas um apoio formal para que uma nova organização partidária tivesse o direito de existir do ponto de vista legal, nada mais do que isso.
Mais do que uma discordância política, essa ação demonstrou uma orientação autoritária, de quem tem dificuldade de conviver com as diferenças e fazer um debate mais amplo, e principalmente, de quem faz da aposta na derrota de outros setores a condição para viabilização de sua política.
O comportamento do PSTU em relação à pré-candidatura do companheiro Plínio parece repetir esse roteiro. Quando sua pré-candidatura era empunhada por setores minoritários do PSOL, o PSTU colocava nas páginas do Opção Socialista que estava em curso um desrespeito com um companheiro que tem história e que portanto merecia um tratamento mais adequado. Agora, que sua pré-candidatura ganhou musculatura e vem sendo capaz de ampliar, o PSTU se apressa em demarcar com Plínio e mais uma vez é rápido nas caracterizações, sem, como é de praxe, analisar a fundo a situação da esquerda.
Trata de forma superficial algumas questões, uma delas a entrevista do Plínio à revista Carta Capital. Diz que Plínio elogiou Lula, aliás, algo que também está sendo usado de forma deturpada na disputa interna do PSOL. Quando na verdade, Plínio simplesmente fez uma caracterização de que Lula é mais sagaz do que FHC, mais capaz de se comunicar com o povo e dizer aquilo que a massa quer ouvir, o que explica sua popularidade. Essa é a comparação feita, é aí que Lula foi melhor do que FHC, uma constatação, não um posicionamento político. Outras conclusões só são possíveis por aqueles que querem instrumentalizar minúcias da fala do Plínio para daí fazer a disputa política. Nessa prática, parece que o morenismo interno e externo ao PSOL se equivale.
O PSTU trata as pré-candidaturas do PSOL como se não houvesse partido, só pré-candidatos. Se for Babá, será um programa. Martiniano outro. Plínio um terceiro. Não, o programa do partido não será definido com o nome do candidato. É óbvio que as candidaturas expressam diferentes pontos de vista internos ao PSOL, muitas vezes, em essência, não tão diferentes como muitos gostariam na luta interna, mas quem fechará o programa não será o candidato, mesmo que seja escolhido com maioria esmagadora de votos. Mas o partido, no debate coletivo, num processo que já está aberto desde a base.
Plínio era bem quisto pelo PSTU quando era um nome de resistência, agora que passou a ser um nome viável, entrou na alça de tiro. Como vimos até o que é retórico é atacado. O que pode ser um efeito de argumentação passa a ser considerado como uma posição política. Qualquer desculpa serve, no velho esquema sectário já denunciado por ninguém menos que Leon Trostky. É só voltar ao seu celebre Programa de Transição, quando diz: “os sectários são capazes de distinguir apenas duas cores: o branco e o preto. Para não se exporem à tentação, simplificam a realidade.”
O que está em jogo para a esquerda socialista é sua própria sobrevivência, é abrir uma clareira quando nossos algozes, governistas ou não, estão ai prontos a sacrificar o debate programático no altar do pragmatismo político e da conciliação de classe. Criar uma frente, com política, programa e uma linha de campanha que fure o cerco, que dialogue com o povo, que mantenha acesa a chama da resistência são elementos decisivos para os que não se renderam, nem se venderam à ordem dominante.
Márcio Bento – Secretário de Comunicação do PSOL São Paulo
* Os artigos em questão: A pré-candidatura do PSTU e a frente classista e socialista – assinado por Zé Maria e O debate sobre as pré-candidaturas do PSOL – assinado por Eduardo Almeida.