A matéria foi publicada no New York Times e é reveladora da forma como Obama tem tratado os imigrantes, para variar, há os que argumentam que as medidas mais duras de repressão se justificam para futuras mudanças na lei que favoreceriam os imigrantes legais, mas vale a pena conferir a opinião de representantes da comunidade hispânica que acreditam que isso não seja mais que um blefe para fazer aquilo que tradicionalmente sempre foi feito, criminalizar a imigração.
Julia Preston
Após as promessas iniciais do presidente Barack Obama de que moderaria a dura política do governo Bush para fazer cumprir da lei de imigração, o governo dele está implementando uma estratégia agressiva para a repressão da imigração ilegal, que baseia-se significativamente em programas que tiveram início com o seu antecessor.
Um recente conjunto de medidas irritou grupos de imigrantes e vários apoiadores hispânicos de Obama. Eles deram início a uma campanha nacional contra as medidas com pequenas manifestações de rua em Nova York e Los Angeles na semana passada.
Recentemente o governo investigou os documentos de funcionários de centenas de empresas, expandindo um programa – altamente criticado como deficiente – para verificar o status dos trabalhadores no que se refere à lei de imigração, fortaleceu um projeto de cooperação entre agências policiais federais e locais e rejeitou propostas no sentido de criar regras legais para regulamentar as condições nos centros de detenção de imigrantes.
“Estamos expandindo o policiamento, mas acredito que da forma correta”, disse em uma entrevista Janet Napolitano, a secretária de Segurança Interna dos Estados Unidos.
Napolitano e outras autoridades do governo argumentam que fazer cumprir sem rodeios a lei de imigração é algo necessário para persuadir os eleitores norte-americanos a aceitarem uma legislação que legalizaria milhões de imigrantes ilegais, uma medida que essas autoridades afirmam que Obama ainda espera implantar no final deste ano ou no início do próximo.
Essa abordagem aproxima Obama da posição que o seu rival republicano, o senador John McCain, do Arizona, defendeu durante a campanha presidencial do ano passado, uma postura que, na época, Obama rejeitou por achá-la muito dura para com as comunidades de latinos e imigrantes (McCain não respondeu a uma solicitação para que comentasse).
Agora essa estratégia de imposição da lei gerou uma cisão política entre o presidente e alguns defensores dos imigrantes e grupos hispânicos, cujos eleitores foram fundamentais para a vitória de Obama.
“Quando muito, os nossos sentimentos são mistos”, diz Clarissa Martinez De Castro, diretora de imigração do Conselho Nacional de La Raza, que aderiu às críticas, dirigidas principalmente contra Napolitano. “Nós entendemos a necessidade da imposição ponderada da lei, mas isso não significa expandir programas que com frequência provocaram violações dos direitos civis”.
Sob ordens de Napolitano, as autoridades de imigração abandonaram as frequentes prisões maciças de trabalhadores imigrantes ilegais em fábricas. Mas os processos criminais federais por violações da lei de imigração na verdade aumentaram neste ano, segundo um estudo feito pelo Transactional Records Access Clearinghouse, um grupo não-partidário que analisa dados governamentais. Segundo o grupo, em abril deste ano houve 9.037 processos envolvendo imigrantes nos tribunais federais, o que representa um aumento de 32% em relação a abril de 2008.
Napolitano disse em uma entrevista que não cancelaria inteiramente as operações repressivas contra imigrantes ilegais, conforme alguns parlamentares hispânicos sugeriram. “Continuaremos a fazer cumprir a lei e a buscar formas efetivas de fazer isso”, afirmou ela. “Esse é o meu trabalho”.
Napolitano, que como governadora do Arizona entrou em atrito com parlamentares republicanos que desejavam medidas mais duras contra a imigração ilegal, diz que está buscando maneiras de tornar os programas de repressão herdados do presidente George W. Bush menos truculentos. Ela quer também que as ações repressivas se concentrem nos membros de gangues de imigrantes ilegais e criminosos condenados, bem como em patrões que contratam rotineiramente imigrantes ilegais para explorá-los.
As autoridades de imigração começaram a investigar a documentação de emprego de trabalhadores em mais de 600 empresas em todo o país. Napolitano diz que, quando houver indicações de que um patrão está contratando imigrantes cujos documentos não podem ser comprovados, uma investigação criminal poderá ser aberta.
Ela também ampliou um programa federal, conhecido como E-Verify, que possibilita que os empregadores verifiquem eletronicamente as informações sobre a identidade dos novos contratados. Grupos de defesa dos imigrantes e associações de empresários têm entrado com processos para tentar anular o programa, afirmando que os bancos de dados nos quais ele se baseia estão repletos de erros que poderiam fazer com que cidadãos dos Estados Unidos tivessem empregos negados.
Mas autoridades do Departamento de Segurança Interna dizem que aperfeiçoamentos tecnológicos aprimoraram a velocidade e a precisão do E-Verify. Com 137 mil patrões registrados até o momento, somente 0,3% das 6,4 milhões de consultas que eles fizeram no ano fiscal de 2009 resultaram em recusas de emprego que mais tarde mostraram-se incorretas, dizem as autoridades. Mas os oponentes observam que isso ainda significa recusas errôneas de emprego para mais de 19 mil indivíduos.
Além disso, Napolitano ampliou um programa que realiza investigação do status perante a imigração de todas as pessoas detidas em cadeias locais em algumas cidades. E ela recentemente anunciou a expansão de um outro programa, conhecido como 287(g), devido ao estatuto que a autoriza, que permite a cooperação entre agentes federais de imigração e agências policiais estaduais e municipais.
Ao ampliar o 287(g), as autoridades federais também elaboraram um novo acordo, que será assinado por todas os cerca de 66 municípios que atualmente participam, e cujo objetivo é aumentar a fiscalização federal e esclarecer a prioridade de deportar aqueles imigrantes que são fugitivos criminosos ou que já estão atrás das grades.
Mas os defensores dos imigrantes não gostaram do fato de o novo acordo não incluir fortes medidas de proteção contra a discriminação étnica. Eles dizem ter ficado surpresos com o fato de Napolitano não ter cancelado o acordo de cooperação com o xerife do condado de Maricopa, no Arizona, Joe Arpaio, que se auto-denomina o “xerife mais duro dos Estados Unidos”. Grupos de latinos no Arizona acusam Arpaio de usar o programa para assediar moradores hispânicos.
“Se eles reformarem o 287(g) e Arpaio não mudar, isso não terá sido uma reforma”, afirma Frank Sharry, diretor-executivo da America’s Voice, um grupo nacional de defesa dos imigrantes.
Napolitano diz que cabe a Arpaio, assim como aos outros atuais participantes, decidir se assinará e obedecerá às regras do novo acordo de cooperação. Independentemente disso, o Departamento de Justiça deu início a investigações das práticas de Arpaio para verificar se há violações de direitos civis.
O governo Obama recebeu apoio pela sua posição quanto à questão da imigração de um importante democrata, o senador Charles E. Schumer, de Nova York, o diretor do subcomitê do judiciário sobre imigração, que elaborará uma reforma da lei de imigração no final deste ano.
Em antecipação àquilo que provavelmente será um debate furioso, Schumer pediu aos democratas que mostrem que estão levando a sério o cumprimento da lei de imigração, e chegou a solicitar a eles que deixassem de usar o termo “sem docume
ntos” para referirem-se aos imigrantes que estão nos Estados Unidos ilegalmente.
“Os democratas precisam convencer o povo norte-americano de que não haverá novas ondas de imigrantes ilegais após a aprovação da reforma”, disse Schumer em uma entrevista.
Os republicanos que opõem-se a qualquer legalização da situação dos imigrantes ilegais dizem que não estão nem um pouco impressionados com as novas medidas repressivas.
“Após 20 anos de promessas quebradas, é necessário muito mais do que gestos simbólicos”, criticou o deputado Brian P. Bilbray, republicano da Califórnia, que dirige um painel de imigração na câmara dos deputados.
Michael A. Olivas, professor de direito de imigração da Universidade de Houston, diz que os defensores dos hispânicos ficaram irritados com as medidas repressivas porque viram poucos sinais de que o governo estivesse se movimentando também deliberadamente no sentido de reformar a lei de imigração.
“Nós estamos com a pior de todas as opções”, afirma Olivas.
New York Times