Por Josie Jeronimo
Do Correio Braziliense
Nas eleições de 2010, mais de 1,5 mil empresas do agronegócio fizeram doações de campanha. Só a Bunge Fertilizantes destinou R$ 2,8 milhões a candidatos que disputaram as eleições para a Câmara, o Senado e os governos estaduais no ano passado.
Durante as discussões do código, a presença do ex-ministro do Planejamento Martus Tavares, que atualmente é vice-presidente de gestão da Bunge, era frequente.
O cenário de enfraquecimento do governo e o descontentamento dos parlamentares — que tiveram as emendas canceladas e reclamavam da má articulação política com o Planalto — abriram uma avenida para a atuação dos arqueiros do agronegócio. Assim, as empresas escalaram seus melhores representantes para fazer o trabalho de convencimento dos parlamentares.
Um senador da base e integrante da bancada ruralista afirma que, depois da aprovação do código com a Emenda n° 164, o governo recorreu à lista dos “rebeldes” e calculou que, dos 273 votos pró-emenda, pelo menos 150 ocorreram pelo poder de convencimento dos lobistas do agronegócio, que aproveitaram o vácuo institucional existente na base do governo na Câmara.
Como o Planalto não se aproximou das bancadas aliadas, os lobistas foram a principal fonte de informação de grande parte dos parlamentares — a estimativa do Executivo é que apenas 10% dos deputados realmente se aprofundaram no debate do Código Florestal.
A crise política que atinge o núcleo duro do Planalto tem animado os ruralistas. Os representantes do setor produtivo acham que “o governo está fraco” e pressionam para que as Casas encerrem a discussão do código em 45 dias. A meta é que o texto seja encaminhado para a sanção presidencial antes do recesso parlamentar.
Lobistas pressionam deputados
O lobby do agronegócio treina pesado para o segundo round da votação do Código Florestal no Congresso. Antecipando a tendência de o Senado modificar o texto que veio da Câmara, representantes do setor articulam a ofensiva para conservar os 273 deputados que votaram favoravelmente à Emenda n° 164, que estende aos estados o direito de decidir sobre atividades agrícolas em áreas de preservação. Do outro lado, o governo calcula que basta resgatar para as fileiras da base 50 parlamentares rebeldes para enterrar a emenda de vez.
Mas a briga não vai ser fácil. Os lobistas do agronegócio apostavam em uma margem maior de apoio e agora exercem forte assédio aos parlamentares para evitar uma derrota no Congresso. Do quadro de votação nominal da Emenda n° 164, os representantes do setor produtivo elaboraram uma espécie de “lista negra”.
Os parlamentares que não apoiaram a emenda e foram eleitos em estados cuja economia é sustentada pela produção de alimentos e grãos sofrem represália. Em Mato Grosso, por exemplo, da bancada de oito deputados, dois votaram contra e foram apontados como “traidores” do interesse do estado por representantes do agronegócio.
Em reuniões nos municípios do interior, a decisão dos parlamentares de não aderir à proposta de flexibilização do código é exposta à população junto ao histórico negativo da atividade dos parlamentares.
O presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja), Glauber Silveira, afirmou que Mato Grosso vive um “problema serissimo” de representação política, citando os deputados Valtenir Pereira (PSB-MT) e Ságuas Moraes (PT-MT), e elogiou o “desempenho fantástico” dos parlamentares que aderiram à proposta. “Os deputados Ságuas Moraes e Valtenir Pereira votaram contra a Emenda n° 164, portanto, contra Mato Grosso”, declarou Glauber Silveira, após a votação.
Telefonemas
A pressão sobre os parlamentares não se restringe a Mato Grosso. Deputados de outros estados com tradição agrícola e que foram contrários à emenda relataram ao Correio que, após a votação, foram procurados via telefone por representantes do agronegócio.
Nas conversas, apesar do tom cordial, os lobistas lembravam a importância econômica do setor nos financiamentos de campanha e como a aprovação do Código Florestal nos moldes ruralistas pode trazer dividendos para as eleições de 2012. “Não me senti acuado, até porque eu não tive apoio político nem de financiamento de campanha, então eu tive a liberdade de votar conforme a orientação do meu partido”, afirmou um deputado, contrário à Emenda n° 164, que pediu anonimato.
Polêmica
A Emenda nº 164, de autoria de deputados do PMDB, foi aprovada com o substitutivo de autoria do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP). A emenda fez modificações decisivas no texto do novo Código Florestal em dois aspectos. O primeiro é a permissão de todas as áreas cultivadas em áreas de preservação permanente (APPs) nas margens de rios. Ao usar o termo “agrossilvopastoril”, a emenda permite praticamente todo tipo de cultivo nas matas ciliares. O outro ponto é a transferência aos estados da possibilidade de decidir sobre a regularização de APPs.