Em primeira instância, a Justiça de São Paulo condenou a empresa “Folha da Manhã S.S.” a pagar 18 mil reais de indenização a Dulce Maia, ex-militante da VPR durante a ditadura militar.
O motivo: o “colunista” Elio Gaspari informou que Dulce estava entre os militantes (o jornalista prefere chamá-los de “terroristas”, colocando-se assim ao lado da extrema-direita militar) que explodiram uma bomba contra o Consulado dos Estados Unidos em São Paulo, em 1968. No atentado, um jovem que passava pela rua teve parte da perna amputada.
Publicado no Blog do Rodrigo Viana
Pois bem: Dulce (foto), que hoje é ambientalista e vive no interior de São Paulo, não participou da ação.
Dias depois do artigo ter sido publicado, Gaspari e a “Folha” assumiram o erro. O jornal poderia ter usado aquela frase lapidar, utilizada no caso da “ficha” de Dilma: “a participação de Dulce no atentado não pode ser provada, mas também não pode ser descartada”. Mas, não! Preferiu um “ERRAMOS” simples. Um ano atrás (quando os artigos saíram) a família Frias mostrava-se ainda mais comedida na hora de torturar os fatos.
A Justiça entendeu que , apesar do “Erramos”, cabe indenização. Veja o que diz o juiz Fausto José Martins Seabra na sentença:
“Impossível supor que todos os leitores da notícia inexata tenham também lido as erratas e os pedidos de desculpas do articulista. Além disso, “a publicação equivocada, por si só, dá margem à indenização. Eventual retificação a posteriori não faz desaparecer o ato ilícito praticado””.
Mais adiante, o magistrado dá um leve puxão de orelhas em Elio Gaspari:
“No caso em foco não se pode esquecer que a notícia inexata foi produzida por jornalista bastante respeitado por substancial obra em quatro volumes sobre a história recente do país, o que lhe impunha maior responsabilidade na divulgação de informações sobre aquele período.”
Importante lembrar que Gaspari assumiu o erro de forma “estranha”, escrevendo um novo artigo, com referências irônicas àquele que seria a “fonte” de seu erro. A fonte para seu primeiro artigo (que trazia a informação errada sobre Dulce) era o depoimento de Sergio Ferro (um outro militante de esquerda) à policia, em 1971. Ora, Gaspari não tem conhecimento que os militantes eram torturados para confessar o que sabiam e também o que não sabiam? Gaspari não tem conhecimento que os militantes – sob tortura – muitas vezes davam informações falsas (de forma heróica) para despistar a policia e salvar a vida dos que ainda estavam soltos?
Gaspari tem conhecimento disso tudo, sim. Mas preferiu usar a ironia…
“Passados 37 anos, Ferro julgou oportuno corrigir o testemunho” – escreveu o impoluto jornalista, em seu segundo artigo sobre tema.
Como se Ferro tivesse culpa por ter dado um depoimento “errado” sob tortura. “Por que demorou 37 anos para corrigir?” Essa parece ser a preocupação de Gaspari.
Ao fim desse “post”, publico na íntegra a sentença condenatória contra a “Folha”. Mas gostaria de ressaltar a observação feita por um dos advogados de Dulce Maia, ao anunciar à cliente a vitória obtida:
“Note que não passou em branco a notícia de que foi o Elio Gaspari o autor da mentira, a suposta autoridade em ditadura. Acho que eles recorrerão. E então aguardaremos por longo período. De todo modo, é um primeiro bom indicador que temos, ao ganharmos em primeiro grau. Exemplo pedagógico para a Folha de São Paulo e para o “ditadurista” Gaspari.”
(a sentença contra mais uma mentira da “Folha”)
583.00.2008.245007-8/000000-000 – nº ordem 146/2009 – Indenização (Ordinária) – DULCE MAIA X EMPRESA FOLHA DA MANHÃ S/A – Autos nº 583.00.2008.245007-8 21ª Vara Cível Central da Capital DULCE MAIA move AÇÃO INDENIZATÓRIA contra EMPRESA FOLHA DA MANHÃ S.A.
Em 12 de março de 2008 o jornal Folha de São Paulo, editado pela ré, publicou artigo de Elio Gaspari sobre as indenizações pagas às vítimas do regime instaurado em 31 de março de 1964. No decorrer do texto, mencionou de modo inverídico que a autora participara de atentado a bomba no consulado norte-americano nesta Capital.
Dois dias depois, outro artigo foi escrito pelo mesmo jornalista com a mesma notícia falsa, a qual lhe causou danos morais. Entende que a ré abusou de seu direito de informar, atingindo a honra e a imagem da requerente ao lhe atribuir a prática de um crime. Requer, portanto, o ressarcimento dos danos morais sofridos. A ré apresentou contestação a fls. 327/343. Negou ter cometido ato ilícito, pois exercera o direito de informar e criticar, assegurado constitucionalmente. Refutou a ocorrência de danos morais, pois a informação inexata foi corrigida e teceu considerações sobre eventual fixação da indenização. Réplica a fls. 351/359. É o relatório. Fundamento e decido. O feito comporta julgamento no estado (art. 330, I, do Código de Processo Civil), registrando-se que as provas pleiteadas pelos litigantes são absolutamente desnecessárias ao deslinde dos pontos controvertidos.
Incontroverso nos autos que a autora pertenceu à Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), grupo que tinha o objetivo de derrubar o regime instaurado em 31 de março de 1964 e implantar no Brasil, por meio da luta armada, uma democracia operária nos moldes marxistas e leninistas. É notório, ainda, que a ele e a outros grupos denominados terroristas foram atribuídas ações violentas consistentes em roubos a bancos, seqüestros de autoridades e explosões em imóveis públicos e privados. A autora negou ter participado do atentado de 19 de março de 1968 ao consulado norte-americano nesta Capital e a ré reconheceu na contestação, em consonância com o pedido de desculpas de seu articulista Elio Gaspari, publicado posteriormente, que de fato essa informação não era verdadeira.
O equívoco aconteceu e foi expressamente admitido por quem o cometeu, de modo que inexiste pertinência em apurar neste feito como a informação errada foi obtida. O que importa é saber se a ré apenas exerceu o seu direito de crítica e se a correção do erro tem o condão de elidir a responsabilidade civil pelos danos morais causados à autora, que são evidentes e dispensam prova, pois ocorreram in re ipsa. Ter o nome associado à prática de um crime do qual não participou é suficiente para sofrer sensações negativas de reprovação social, angústia, aflição e tantas outras que consubstanciam danos morais relevantes sob o aspecto jurídico e, portanto, indenizáveis. A ré sustenta que exerceu o direito de crítica assegurado pelo art. 27, VIII, da Lei de Imprensa. De fato, assim agiu ao tecer considerações e até mesmo juízos de valor sobre a discrepância entre as diversas indenizações pagas às vítimas do regime militar. Sucede, contudo, que a partir do momento em que afirmou a participação da autora no episódio relatado nos autos, não só extrapolou o direito de crítica, como olvidou o compromisso legal e ético com a verdade. Pouco importa que a autora tenha de fato pertencido a grupo ao qual foram atribuídas ações violentas nas décadas de 60 e 70. A notícia de que participou do atentado ao consulado norte-americano não era verdadeira e, assim, não pode prevalecer diante do direito à honra. Lembra Antonio Jeová Santos que “existe um consenso de que a imprensa assume o compromisso de informar não só o fato veridicamente, como também de explicá-lo em seu contexto, em sua verdadeira significação – a verdade acerca do fato – como recomendava a Comissão sobre a Liberdade de Imprensa dos EUA” (Dano moral indenizável. 2ª ed. São Paulo: Lejus, 1999, p. 325). A ré ainda arg
umenta que corrigiu o erro e, assim, não tem o dever de indenizar os danos morais sofridos pela autora.
Sem a necessidade de digressões acerca da forma e do lapso temporal consumido até que a retificação da informação inexata fosse veiculada, o fato é que a correção da notícia, ainda que se desse no modo, no tempo e no lugar adequados e com o mesmo destaque da informação falsa, não afastaria o ressarcimento almejado.
Impossível supor que todos os leitores da notícia inexata tenham também lido as erratas e os pedidos de desculpas do articulista. Além disso, “a publicação equivocada, por si só, dá margem à indenização. Eventual retificação a posteriori não faz desaparecer o ato ilícito praticado” (Enéas Costa Garcia. Responsabilidade civil dos meios de comunicação. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002, p. 294). Resta, pois, fixar o valor da indenização.
No arbitramento da indenização oriunda dos danos morais leva-se em consideração a natureza, a extensão e a repercussão da lesão, bem como a capacidade econômica dos envolvidos, de modo a compensar os prejuízos experimentados pela vítima sem que haja locupletamento e, de modo concomitante, punir o ofensor de modo adequado a fim de não transgrida novamente. No caso em foco não se pode esquecer que a notícia inexata foi produzida por jornalista bastante respeitado por substancial obra em quatro volumes sobre a história recente do país, o que lhe impunha maior responsabilidade na divulgação de informações sobre aquele período.
Por outro lado, a ré não adotou a postura arrogante de ignorar ou de tentar mascarar o seu erro, de modo que o valor indenizatório mínimo proposto com a petição inicial se mostra razoável e compatível com as peculiaridades vistas nestes autos e com os parâmetros acima apontados.
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a demanda para condenar a ré ao pagamento de R$ 18.000,00 à autora, com correção monetária desde esta data e juros de mora de 1% ao mês contados de maio de 2008, bem como a publicar no mesmo jornal em que a notícia inexata foi divulgada, o inteiro teor desta sentença. Pagará ainda a vencida as custas processuais e os honorários advocatícios da parte contrária, fixados em 10% sobre o valor da condenação. P.R.I. São Paulo, 17 de abril de 2009. Fausto José Martins Seabra Juiz de Direito FLS. 370: Custas atualizadas de preparo para eventual recurso no valor de R$ 364,16. ORD – RP – ADV MAURO ROSNER OAB/SP 107633 – ADV LUIS CARLOS MORO OAB/ SP 109315 – ADV TAIS BORJA GASPARIAN OAB/SP 74182 – ADV MONICA FILGUEIRAS DA SILVA GALVAO OAB/SP 165378
Publicado no Blog do Rodrigo Viana em 29/04