Pronunciamento do deputado federal Ivan Valente – PSOL/SP
Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados,
No início do mês, a Presidenta Dilma Rousseff veio ao Congresso Nacional apresentar sua mensagem na abertura dos trabalhos legislativos de 2011, e nesse momento destacou alguns aspectos e propostas de sua política para a área educacional. Na quinta-feira, dia 10, a Presidenta esteve em cadeia nacional de rádio e televisão para falar sobre a educação nacional.
Como já nos acostumamos a ouvir apenas propagandas oficiais mas que não se materializam com a mesma intensidade, nas ações governamentais, é uma boa novidade vermos a educação ocupando dois momentos tão destacados e termos a oportunidade de ouvir a Presidenta falando a milhões de brasileiros que a educação de qualidade deve ser prioridade em seu governo.
Chamou-nos atenção, no entanto, o fato de em nenhum momento a Presidenta Dilma mencionar o Plano Nacional de Educação, cujo projeto de autoria do próprio governo tramita nessa Casa.
Ficou a impressão de que o governo implementará sua política educacional de acordo com as conveniências e sem se ater às metas e objetivos de médio e longo prazos que o Plano deverá estabelecer repetindo, assim, a postura dos dois presidentes que a antecederam diante do PNE de 2001. Nada se falou também sobre o aumento de recursos para a educação.
A proposta mais concreta que nos foi apresentada é, por outro lado, exatamente a mais preocupante e contraditória: a criação do Programa Nacional de Acesso à Escola Técnica, o PRONATEC, uma versão do PROUNI agora voltada para o ensino técnico de nível médio.
O programa, segundo a Presidenta, será composto por um conjunto de ações voltadas para quem deseja fazer um curso técnico, mas não tem como pagar. O governo vai isentar instituições particulares de ensino profissional em troca de bolsas de estudo.
A idéia foi apresentada pela candidatura tucana nas eleições do ano passado com o nome de PROTEC e, naquela altura, foi criticada pela então candidata. Agora, a vemos absorvida sem problemas pelo governo petista.
A justificativa é ampliar o caminho de acesso à educação profissional para jovens do ensino médio e para trabalhadores sem formação. Trata-se, no entanto, de uma proposta infeliz e contraditória atémesmo com o que foi feito no governo Lula, no setor do ensino técnico.
Até então a estratégia da gestão petista era elevar a participação federal no segmento, especialmente no segundo mandato de Lula, por meio de construção de unidades de ensino profissionalizante em todo o país.
O programa segue o mesmo princípio do ProUni, que inegavelmente ajudou a diminuir o déficit financeiro de instituições particulares de nível superior de qualidade muito questionável.
Ao trocar impostos por bolsas em instituições precárias, oferecendo para a população mais pobre cursos sem qualidade, o governo aprofundou a desigualdade de acesso ao ensino superior. E agora apontam uma ação semelhante: ao invés de ampliar a oferta de escolas técnicas públicas que são reconhecidas nacionalmente por oferecem um ensino de melhor qualidade, optam por injetar recursos públicos em instituições privadas de qualidade duvidosa e sobre as quais existe pouco ou nenhum controle.
A iniciativa privada será a única beneficiada, com garantia de redução de suas vagas ociosas, sem qualquer investimento ou preocupação com a qualidade. Ao contrário, passará cada vez mais a tratar a educação como mera questão mercadológica. É a garantia dos lucros!
Alguns jornais noticiaram inclusive que o BNDES criará uma nova linha de crédito, de cerca de R$15 bilhões, para as entidades do Sistema S e a oferta de financiamentos com juros subsidiados pelo governo para empresas que promoverem qualificação para seus empregados. Ações que vão na direção oposta àquela que a sociedade manifestou no documento final da CONAE (Conferência Nacional de Educação), que indicava aplicação de recursos públicos exclusivamente nas instituições públicas de ensino.
A essência dessa proposta é a privatização e a mercantilização da educação. Não por acaso, as reportagens também informam que a proposta do PRONATEC foi formulada pelo MEC em parceria com o empresariado.
A situação se mostra ainda mais inaceitável, Senhor Presidente, quando percebemos que o governo deixou de gastar mais de R$ 8 bilhões com a educação no ano passado, segundo os dados disponíveis sobre a execução orçamentária de 2010. Esses recursos poderiam ter sido investidos na ampliação da rede pública de ensino técnico e em muitas outras ações para a melhoria da educação básica e da formação profissional.
Se compararmos com o que foi gasto no ano passado com o pagamento de juros e amortizações da dívida pública R$ 264 bilhões no total, ou seja, cinco vezes mais do que a União gastou com a educação a proposta fica mais absurda.
É um começo ruim para o governo Dilma, que destoa do discurso e das promessas de valorização e melhoria da qualidade da educação nacional, coisas que só são possíveis quando a educação étratada como direito fundamental, que deve estar acessível a todos e todas em instituições públicas, algo que exige grandes investimentos públicos.
Se a Presidenta de fato acredita que esta é a grande hora da educação brasileira e se realmente pretende mobilizar todos os brasileiros e brasileiras para lutarmos juntos por uma educação de qualidade, então ela deve abandonar essa proposta e urgentemente resgatar tudo que foi elaborado com o processo da Conferência Nacional de Educação, de 2010, na qual profissionais, gestores, pesquisadores, estudantes e diversos outros segmentos organizados apontaram claramente um outro rumo para a educação nacional.
Muito obrigado.
Ivan Valente
Deputado Federal PSOL/SP