Leia o pronunciamento do deputado Raul Marcelo sobre o desfecho da greves dos profissionais da educação do Estado de São Paulo.
Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, quero cumprimentar os servidores da Casa, as pessoas que nos acompanham pela internet, pela TV aberta e os que têm de pagar às empresas que exploram o serviço de TV a cabo, para assistir ao canal da TV Assembleia, porque, infelizmente, ainda não democratizamos os meios de comunicação no Brasil. Para ter acesso a um canal com conteúdo, as pessoas que já pagam impostos ainda são obrigadas a pagar a uma empresa privada, uma vez que, pelo UHF, muitas cidades do Estado de São Paulo não conseguem acessar nossa TV Assembleia.
Quero dizer, Sr. Presidente, que, neste mesmo horário, teve início a assembleia dos professores aqui na Capital, para discutir os rumos dessa greve que já tem mais de um mês e pode ter um fim trágico para todos os servidores da Educação.
Mesmo depois de toda essa mobilização, o Governo, insensível, não abriu sequer um canal de negociação, como já havia feito com os servidores da área de Segurança Pública quando fizeram sua mobilização.
Este é um Governo que, na verdade, atenta contra a democracia, o palco público para a resolução dos conflitos. Fora da democracia não existe o diálogo. Existe a perseguição, o aniquilamento. É a ditadura. Na democracia, os conflitos são dirimidos dentro do ambiente público, com discussão, debate, encaminhamentos.
Este é um Governo na tradição da elite brasileira, uma tradição velha, carcomida, retrógrada, que trata os conflitos na base da força, na bala, com ditadura. Se olharmos a História do Brasil, podemos constatar que os ricos direcionaram nosso País a não aceitar a democracia como parte da vida em sociedade.
Tivemos 350 anos de escravidão, e o Brasil foi último grande país a aboli-la. Nossa República teve dois processos de golpe militar – o de Getúlio Vargas e o golpe civil e militar que foi de 1964 a 1979 -, e o povo só pôde votar para Presidente em 1989, quando a ditadura acabou de fato. Até então o Presidente era eleito de forma indireta. Em 1989, foi eleito aquele “playboy das Alagoas”, Fernando Collor de Mello, pego roubando dinheiro público de maneira adoidada.
Se formos olhar, Sr. Presidente, a elite brasileira nunca teve apreço pela democracia, nunca teve a democracia como um fundamento da vida em sociedade. José Serra e os tucanos representam a essência da elite brasileira, ou seja, o desapreço pela democracia. O Governador José Serra acredita ser bonito não ter negociado com os professores e que isso enriquece seu currículo. Acredita ele que tratar os professores à bala de borracha, com cassetete, engrandece e enobrece sua personalidade. José Serra quer colocar esse fato como mote de sua campanha. Vejam a situação de retrocesso a que chegamos no Brasil.
Como um cidadão que se exilou – ele não foi exilado, mas se exilou – do país, que vive fazendo discurso em nome da democracia, quer colocar no seu currículo o fato de não negociar com grevista? A greve vem da “Place de Grève” na França, onde os trabalhadores se reuniam para reivindicar melhores condições, em uma época em que a jornada de trabalho era de 18 horas; crianças de cinco anos tinham de ir para a linha de produção. Foi nessa época que surgiu esse instrumento importantíssimo que é a greve. Imaginem o que seria o mundo hoje se os trabalhadores não tivessem o direito à greve!
O salário mínimo que é imoral, uma vergonha, poderia ser ainda menor; a jornada de trabalho, que as centrais estão lutando para reduzir para 40 horas semanais, poderia ser infinitamente maior. A situação de descalabro social no Brasil, se os trabalhadores não tivessem um instrumento como esse, poderia ser ainda maior. E o Governador diz, em alto e bom som, que com grevista não negocia. O vice-Governador, um homem que veio do Partidão – Luís Carlos Prestes deve estar se remoendo no caixão -, também enche o peito para dizer que não negocia com grevistas.
Os professores estão com um salário imoral, com um vale-refeição de quatro reais, tendo de trabalhar na Rede Municipal e na Estadual, dar aulas de manhã, à tarde e à noite.
A consequência disso é a situação da Educação. Quem está pagando a conta desse movimento antidemocrático do Governo de São Paulo são as nossas crianças, os alunos. Esses dias, fui dar uma palestra num colégio, perguntei sobre o primeiro governo de Getúlio Vargas. Perguntei quem o conhecia. Havia 50 pessoas na sala, só três levantaram a mão. Essa é a situação da Educação. O jovem está saindo da escola sem conseguir entender um artigo. Escreve o nome e pega um ônibus, mas não consegue entender o que o autor está querendo dizer, é um analfabeto funcional. Isso sem contar os analfabetos clássicos, que são um milhão em São Paulo. As pessoas não conseguem fazer contas simples de Matemática. E o Governo enche o peito dizendo que não atende a reivindicações de grevistas, como se grevista fosse sinônimo até de terrorista, de uma pessoa que está na ilegalidade, quando é um direito constitucional, uma questão fundamental para o avanço do processo democrático no País.
Queria lamentar, porque está em curso neste momento uma assembleia que aponta para uma derrota que não devemos admitir. A derrota dos professores em São Paulo é a derrota da sociedade paulista, é a derrota do Estado de São Paulo, é a derrota de todos aqueles que esperam que a Educação possa ser valorizada, que tenhamos investimentos na Educação para poder avançar na sociedade, e não retroceder. Uma pessoa sem educação, sem cultura tem uma tendência grande a caminhar para a barbárie, pois não conhece a nossa história, a história da humanidade, não tem acesso aos conhecimentos, não consegue progredir, produzir, ou seja, poder ser feliz. Sem educação isso é muito difícil. Educação não é um esforço individual, tem de ser um esforço da sociedade. O Estado tem grande responsabilidade nisso, em que pese sabermos que há muitos paulistas que, mesmo com toda falta de política pública na área da Educação, conseguem, pelo esforço pessoal, ter um nível cultural avançado, com acesso à leitura. Mas não podemos depender de esforço pessoal, isso tem de ser uma política pública. O Estado de São Paulo, o Estado mais rico da federação, infelizmente está dando um mau exemplo.
Esse cidadão antidemocrático, antinacional e antissocial, agora quer ser Presidente da República. Esperamos que isso não aconteça, pois é um desrespeito total ao processo democrático. O maior exemplo disso estão sendo os professores.
Sr. Presidente, queria desejar que essa assembleia da Apeoesp possa tirar boas conclusões para que a situação do Estado de São Paulo, principalmente quanto à Educação, possa avançar. Os professores têm um papel importante nisso, até porque enfrentam um adversário. Vejam a que situação chegamos: o Governo hoje é adversário dos professores, é até surreal, mas é o que acontece no Estado de São Paulo. Aquele que deveria ser um parceiro é um adversário dos professores. Só podemos lamentar uma situação como essa, pois a Educação tende a piorar no Estado.