Ao postar minha opinião e dúvidas sobre a marcha das vadias houve três tipos de manifestações: a) de concordância, inclusive, de feministas, b) aqueles q julgam que não conheço o movimento e tentam insistentemente educar minha ignorância, aqueles que percebem o debate e a preocupação sobre o temário..
Kennedy Ferreira
Agradeço aos que concordaram com minhas preocupações, agradeço aos que se preocuparam com minha ignorância. E por fim, aos que perceberam minhas ponderações e as preocupações, vou tentar trocar um pouco de opiniões.
Creio que um dos elementos – fortes da ampliação – da base de sustentação da reação neoliberal foi a desestruturação da antiga divisão de trabalho e social.
Ou seja, as propostas expostas por movimentos (sensíveis até então ao debate socialista) gays, usuários de determinadas drogas, feministas, jovens, negros, sem tetos, indígenas… entraram na agenda burguesa (neo liberal) pelo viés meritocrático e por cotas compensatórias
O elemento meritocrático é sensível ao vermos o valor medicinal e agregado da maconha no mercado (basta ver os resultados na bolsa de NY e européia), como insistentemente nos apontam liberais como Clinton, FHC entre outros.
O valor dos gays é mostrado pela sua performace artística ou gerencial, e a lista das dez mulheres mais importantes do mundo feita pela revista Forbes e Fortune, nos dá o poderoso recado de onde é desejado que ocorra a ação “feminista”.
A família (fordista) e as estruturas educacionais (ascendentes) faliram e deram lugar a novos personagens e a uma imensa reciclagem dos papeis sociais que estes devem cumprir.
Alguns estudiosos do tema (Chistopher Lash. Por ex na Rebelião das Elites.), chamam atenção para a perda do papel do homem como protagonista do lar e também para desagregação psico-social que esta insere na violência doméstica. Já que não raro vemos, o homem – proletário – secundado, na esfera de mercado e nas esferas familiares tanto pela companheira como também por filh@s.
Séculos de educação machista (do proletariado), séculos de embrutecimento, tem como fruto a condenação do gay, jovem, mulher, etc, pela perda de seu papel dentro da sociedade competitiva.
Lash nos chama atenção para o fato dos espaços burgueses (por excelência machista) assimilarem as mulheres, gays, negros… pelos seus méritos. Um bom costureiro, uma boa executiva, um bom negro jogador de futebol ou golfe passam a fazer parte do universo burguês e de sua esfera de consumo e cultura. A discriminação deixa de estar no topo e é remetida para (as históricas) vítimas dos sistemas.
Serão os espaços proletários onde ocorrerão a discriminação homofôbica, machista ou racistas enquanto os espaços burgueses como a Paulista ou Copacabana serão por excelência o espaço de sua manifestação de liberdade.
Isso é mais forte num país em que as tradições conservadoras e positivistas, sempre determinaram os espaços populares como da ignorância e do medo, sempre reservaram as classes (e elites) cultas e letradas a tarefa de levar aos de baixo a civilização e os bons costumes.
O discurso hedonista e meritocrático são por excelência a força (pós moderna) da reação burguesa e sua capacidade hegemônica arrasta para a mesma ciranda diversos setores, inclusive de esquerdas.
Se as bandeiras da liberdade individuais devem ser universalizadas, o escopo dos socialistas, comunistas, anarquistas e do proletariado e povo oprimido, não podem ter como prática a mesma razão e interesse burguês.
Liberdade do negro não é ser ex-jogador e cuidar da agenda da copa e ajudar a desabrigar milhares de outros negros em função do lucro das empreiteiras (apontado inclusive como futuro presidente da república), liberdade gay, não pode ser reduzido a ter reconhecido seus méritos como costureiros ou bailarino, a liberdade da mulher não pode ser reduzida a tomar decisões empresariais ou governamentais como jogar bombas na Líbia, acabar com a economia grega ou pelo fator previdenciário ou de cortes de verba na saúde e educação. A liberdade do jovem não pode ser vista como dirigir um carro de 800 mil dólares e atropelar um operário-negro de bicicleta ou jogar gasolina ou lâmpada fosforescente em sem tetos índios, ou mesmo… gays.
Para os ativistas sociais, a liberdade do outro deve elevar a do outro ao infinito, e não ao (resumido) mercado. As práticas e as expectativas da mulher num baile funk ou da marcha das vadias tem em essência o mesmo escopo e o mesmo desejo: a busca da felicidade dentro das regras do mercado.
Penso que a (nossa) luta é outra. Penso que é fundamental retomar a ação e idéias igualitárias junto ao proletariado e a setores do povo oprimido, que é onde as mulheres e os homens são as princiapis vitimas do machismo. Penso que é importante retomar atividades como exemplo a “casa das mulheres do Grajaú” na década de 70 e 80, retomar a valorização das práticas societárias frente as individuais.
Retomar a valorização da ciência e o conhecimento como propriedade social, o que implica inclusive, lutar para que as vitimas de estupros, mas também os estupradores, tenham tratamento de saúde, (como ocorre, por ex., no – mesmo – Canadá, onde o estuprador é reconhecido como doente, inclusive com presidios diferenciados).
A questão – fique bem claro – não é discutir a importância da luta por direitos (sociais e físicos) das mulheres (e outros setores civis).
A questão é não reduzir uma luta política – tão importante – como a das mulheres, a liberdade de vestimentas, de costumes que são traçadas pelo mercado a cada 5 anos, “como ditam as tendências da moda” ou reduzir a violência a uma medida tão pífia.
A cobertura mediática (para uma manifestação de 500 ou 700 pessoas) foi semelhante a dada há poucos anos ao movimento Cansei ou a poucos dias , a vazia marcha contra a Corrupção, o que mostra desde já, o interesse das forças da ordem.
Não me surpreenderá se nos próximos anos houver um carro de desfile para a Xuxa (e outras socialites) , patrocinio de langerie ou de sex shopping.
E ao mesmo tempo, as classes populares continuarão a ser o cenário do medo e da repulsa, inclusive para alguns setores de esquerda, quando o assunto for a participação e os direitos iguais de homens e mulheres, gays e lésbicas, de negros e negras….já que esse movimento tem classe social, raça e espaço político.
Kennedy Ferreira
É Sociólogo e Professor
Militante da Refundação Comunista e filiado ao PSOL