Mais uma vez os direitos dos trabalhadores estão na mira do plenário da Câmara dos Deputados. Iniciamos hoje a batalha em torno das Medidas Provisórias (MPs) 664 e 665. Essas medidas são a essência do ajuste fiscal imposto pelo governo Dilma aos trabalhadores, reduzindo direitos como o seguro defeso, o seguro desemprego, a pensão por morte, o abono salarial e o auxílio doença. Em resumo, o governo propõe ampliar o prazo para que esses benefícios possam ser concedidos aos trabalhadores, ampliando a vulnerabilidade e a instabilidade no emprego. Os relatórios apresentados como resultado das comissões especiais que analisaram as MPs atenuam os efeitos das medidas, mas não são suficientes para barrar a natureza regressiva das duas MPs.
Conhecidas também como pacote de maldades, as MPs incidem principalmente sobre as pessoas de mais baixa renda e nas condições mais precárias de trabalho. Parece que o governo Dilma seguiu a lógica da menor resistência: se tem de cortar, optou pelos setores com menos organização sindical e corporativa e de menor capacidade para causar indignação na grande mídia. De fato, não haverá panelaço nas varandas dos bairros mais elitizados de São Paulo contrário às medidas.
O governo, além de assumir a pauta derrotada nas eleições, ainda contraria o que havia dito nas eleições, de que não haveria cortes aos direitos dos trabalhadores. Isso tudo se soma ao contigenciamento de verbas públicas em áreas básicas, aos seguidos aumentos na taxa de juros, à diminuição do poder de compra dos trabalhadores e aumento do endividamento das famílias. Ou seja, um quadro onde os mais penalizados são justamente os mais pobres.
As MPs serão analisadas após a votação apertada nesta Casa do PL 4330, que ampliou a terceirização no Brasil. Contra esse projeto formou-se uma grande frente de setores populares e progressistas e houve uma intensa mobilização nas redes sociais que teve a capacidade de alterar o voto de muitos parlamentares. O resultado dessa unidade foi um forte dia de mobilizações no último 15 de abril que mostrou a força dos trabalhadores e conquistou alguns avanços. Naquele episódio, porém, já vinha sendo anunciada a contradição fundamental do campo governista: engajado contra o PL 4330, esses setores agora estão na linha de frente da defesa do draconiano ajuste fiscal.
O cenário que vemos agora é outro, com o governo chantageando a base aliada, oferecendo cargos e apressando as nomeações para não perder a votação no plenário. É preciso que se diga, são projetos da mesma natureza, apesar de tratarem de temas diferentes, assim como a terceirização provoca a precarização nas relações de trabalho, a retirada de direitos promovida pelas MPs aumenta a desigualdade e deixa os trabalhadores mais fragilizados.
Sob o pretexto de “combater distorções” e “economizar” R$ 18 bilhões em 2015, as MPs privilegiam ainda mais a realização do chamado “superávit primário”, ou seja, o pagamento da dívida pública, que beneficia principalmente grandes bancos e investidores. Os R$ 18 bilhões, alegado como economia pelo governo, representam apenas cinco dias de pagamento da dívida pública federal, previsto em R$ 1,356 trilhão neste ano, ou 47% de todo o orçamento federal de 2015.
Como temos alertado, esta é a verdadeira distorção do orçamento público, que privilegia banqueiros e grandes investidores, às custas dos direitos dos trabalhadores, aposentados e pensionistas. Ao invés de retirar direitos dos trabalhadores, o governo e o Congresso Nacional deveriam realizar a auditoria da dívida pública, prevista na Constituição de 1988 e jamais realizada, e aprovar o projeto de lei que taxa as grandes fortunas.
É preciso que se diga que o texto original das MPs era muito pior, no caso da MP 664, propunha um período de carência de 24 meses de contribuição para a concessão de pensão por morte, exceto para os casos de acidente do trabalho e doença profissional ou do trabalho. Também previa a absurda redução à metade em todas as novas pensões (com um adicional de apenas 10% por dependente), a redução do tempo das pensões, a diminuição do valor do auxílio doença, a privatização das perícias médicas do INSS, dentre outros graves itens.
Emendas propostas pela bancada do PSOL à MP 664 foram acatadas pelo relator e amenizam os estragos aos pensionistas. As emendas do PSOL eliminaram a redução em 50% nas pensões e a carência de 24 meses para a obtenção da pensão por morte – previstas na MP original, editada pelo governo. O texto do relator prevê prazo mínimo de 18 meses de contribuição para que a pensão por morte seja concedida para o cônjuge ou companheiro e de dois anos de casamento ou união estável.
Também foram aceitas pelo relator as emendas que vedavam a privatização das perícias médicas do INSS – ficando restritas às situações nas quais haja “impossibilidade” ou “incapacidade física ou técnica” de realização de perícias por parte do INSS.
Outras emendas propostas pelo PSOL, como a que impede a redução no valor do auxílio doença e a que mantém o auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão, foram rejeitadas.
O relator também cometeu mais uma violência contra os brasileiros ao permitir o desconto de 8% sobre o benefício do Seguro-Desemprego, a título de contribuição para o INSS – uma espécie de fator previdenciário. Tal medida retirará cerca de R$ 2,6 bilhões anuais dos desempregados, enquanto grandes empresas continuam sendo beneficiadas com generosas desonerações nas contribuições para o INSS.
Já o projeto de lei de conversão da MP 665 prevê que o brasileiro deve trabalhar no mínimo 12 meses para ter acesso ao seguro desemprego, em uma primeira solicitação, e 9 meses, em uma segunda solicitação. A MP do governo propunha 18 e 12 meses, respectivamente – a legislação atual determina, em ambos os casos, 6 meses.
Em relação aos trabalhadores rurais o disparate permanece: eles terão que comprovar terem recebido salários nos 6 meses anteriores e terem sido empregados por pelo menos 15 dos últimos 24 meses. O tempo de concessão do seguro desemprego também muda para um período de no máximo 5 meses. A MP também altera regras do abono salarial e seguro defeso, concedido aos pescadores.
Na avaliação do PSOL, apesar do projeto de conversão ter reduzido o tempo de trabalho necessário para o trabalhador ter acesso ao seguro-desemprego (em relação à Medida Provisória), ainda assim, tal tempo está sendo duplicado, na primeira solicitação, e acrescido em 50% na segunda solicitação, em relação à legislação vigente antes da edição da MP.
Por todas as razões expostas acima, mantemos nossa posição contrária as MPs 664 e 665. Que toda justa indignação causada por ocasião da votação do PL 4330, também esteja presente agora. São direitos dos trabalhadores que estão sendo negociados como algo de menor importância para se promover o ajuste fiscal.