Rodaram no Brasil, nesta quinta-feira (3/7), imagens de um micro-ônibus parcialmente esmagado pelo desmoronamento de um viaduto em obras na capital mineira, Belo Horizonte. Fatalidade ou responsabilidade política?
Ricardo Alvarez
O acidente ceifou a vida (até agora) da jovem motorista de 25 anos, Hanna Cristina Santos
A construtora responsável pelo acidente chama-se Cowan SA e o viaduto em questão resulta de uma parceria da prefeitura da cidade e do governo federal como parte da infra estrutura de mobilidade urbana para a Copa 2014.
A empresa ganhou a licitação associada à Construtora Delta que, depois de vencido o certame, se retirou do negócio. A Delta é a àquela mesma que doava viagens e outras benesses para membros do governo estadual do RJ. O governador Sergio Cabral aparece em vídeo num show do U2 com um guardanapo na cabeça e bastante solto. O bicheiro Carlos Cachoeira viabilizava os negócios e as vantagens.
Voltando ao viaduto que ruiu em Belo Horizonte, resta saber os motivos que levaram à tragédia. A construtora Cowan SA, em nota disse lamentar “profundamente o ocorrido” e que enviou ao local uma equipe de técnicos para investigar as razões da queda. Desnecessário, pois as causas são sobejamente conhecidas.
A Cowan gosta muito do Rio de Janeiro e de Minas Gerais. Seus vínculos são fortes e duradouros. Contribuiu com a campanha de Aécio Neves para governador em 2006. Aécio, hoje adversário do PT no plano federal, articulou uma aliança entre PSDB e PT em 2008 elegendo Marcio Lacerda (PSB) para prefeito de BH. Marcio é o atual prefeito que contratou a empreiteira para construir o viaduto que desabou.
Mas a Cowan também tem amigos no Ministério dos Transportes, com quem tem contratos. Seus jatinhos particulares já estiveram à serviço de Michel Temer, vice-presidente da República, que em 2012 participou de um evento eleitoral de Lúdio Cabral (PT), candidato então à prefeito.
Para ser justo com a construtora e não partidarizar a discussão, veja o que disse o empreiteiro mineiro Walduck Wanderley (ex-dono da Cowan e já falecido) que despejou R$ 800 mil na campanha à presidente de FHC em 1998. “Eu apoiei Fernando Henrique, mantenho meu apoio e sei que fiz um investimento bem-feito…”, diz o empreiteiro. Que sinceridade cortante.
Como as relações são amplas (PMDB, PSDB, PT, PSB e outros) a COWAN ganhou a concessão de 30 anos do serviço de coleta e tratamento de esgoto da Zona Oeste da cidade do RJ. Como presente, patrocinou uma viagem de lazer ao Caribe, em abril de 2012, para o secretário municipal de Urbanismo, Sérgio Dias, e o secretário estadual de Governo, Wilson Carlos.
Se eu perguntasse à você leitor: quantas vezes este tipo de notícia frequentou seu cotidiano nas últimas décadas? Perdeu a conta, não é mesmo!
Esta esbórnia instituída entre poder público, eleições e obras e serviços públicos é a matriz dos problemas que envolvem as relações incestuosas entre o interesse social e os lucros privados.
Se as pessoas querem debater o problema da corrupção no Brasil creio que deveriam buscar a fonte da maldade. Ela não resulta de “desvios morais e éticos pessoais”, ela é a exata medida das regras eleitorais em vigor. O predomínio do toma lá da cá. E ponto.
Enquanto prevalecer o financiamento privado de campanhas eleitorais estas notícias não cessarão, ao contrário, vicejarão como cogumelos em dejetos bovinos sob umidade.
O financiamento público de campanhas não resolve esta promiscuidade da noite para o dia, mas aponta para um caminho mais sólido que privilegie o debate político sobre os negócios eleitorais.
E como você pode ver, esta orgia mata. Que o digam as pessoas próximas da jovem Hanna Cristina Santos.
Ricardo Alvarez
Geógrafo, é professor e editor do site Controvérsia
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