Esta semana tivemos mais uma confirmação de como tem sido rápido o avanço da privatização da saúde pública no Brasil. A situação é preocupante e precisa ser debatida pelo parlamento e a sociedade brasileira.
Confira abaixo o pronunciamento do deputado federal Ivan Valente no plenário da Câmara sobre os abusos da saúde privada no Brasil:
Atendendo a um pedido de informação do jornal O Estado de São Paulo, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) apresentou um levantamento em que pelo menos 40% dos planos de saúde tem rede própria de atendimento no país, compreendendo hospitais, ambulatórios e centros de exames laboratoriais.
Segundo os dados divulgados, “a rede própria chega a representar 80% das opções ofertadas aos clientes. É o caso, por exemplo, da cartela dos planos Dix, os mais econômicos vendidos pela Amil. Com mais de 6,8 milhões de usuários, a operadora tem hoje 27 hospitais com a sua marca, além de 40 ambulatórios. No total, a verticalização já representa de 35% a 45% dos atendimentos do plano”.
O que isso significa: que as operadoras de planos de saúde, alvo de inúmeras ações judiciais por descumprimento de contratos e desrespeito aos direitos de seus conveniados, agora terão o poder de limitar as opções dos usuários na escolha da rede de atendimento, numa absurda verticalização do sistema e num flagrante conflito de interesse.
Segundo o jornal, o Presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), João Ladislau Rosa, contesta os benefícios da verticalização revelados pelas operadoras. ”Só quem ganha com isso é o plano de saúde. A partir do momento em que a livre escolha acaba, não há vantagens para o usuário. Ainda que iniciem o tratamento necessário no local de sua preferência, os pacientes podem ser transferidos a qualquer momento para a rede própria do plano”, alega.
Esta foi, por óbvio, a mesma conclusão da reportagem: “Na prática, o novo perfil dos convênios pode restringir a liberdade de escolha dos usuários, que se veem obrigados a agendar consultas e a realizar atendimentos de emergência, exames e cirurgias na rede direta da operadora. Geralmente, os procedimentos são agendados apenas por centrais telefônicas, que indicam médicos e equipamentos disponíveis de acordo com o modelo pago de plano”.
No entanto, os diretores dos Planos de Saúde entrevistados afirmam que “não consideram haver conflito de interesse” nesse processo de verticalização, como se este julgamento coubesse a eles, os maiores interessados no aumento da lucratividade proporcionado por este arranjo.
A situação não poderia ser mais esdrúxula.
Além do cinismo destes operadores, o caso expõe a grave falha na legislação e na fiscalização deste processo de verticalização, baseado na propriedade cruzada e no conflito de interesse, onde os donos dos planos de saúde são também donos das redes de atendimentos.
Mais um fato que comprova a conveniência da Agência Nacional de Saúde Completar (ANS), órgão fiscalizar ligado ao Ministério da Saúde, com as operadoras de planos de saúde.
O avanço dos planos de saúde no país não se dá ao acaso. É parte de uma política deliberada de enfraquecimento e privatização da saúde pública no país. Um processo que inclui o subfinanciamento do SUS, a falta de independência do poder público, como no caso “porta giratória da ANS” (processo pelo qual gestores de planos de saúde tornam-se diretores da Agência “fiscalizadora”), e o crescente poder econômico e político das operadoras de planos de saúde, já constituídos em poderosos doadores de campanhas eleitorais.
A saúde dos brasileiros não pode continuar refém dos interesses de mercado das operadoras dos planos de saúde, orientadas unicamente pela busca do lucro e da rentabilidade de seus investimentos.
O parlamento e a sociedade precisam reagir, criando mecanismos legais que inibam o avanço deste processo e garantam o fortalecimento do SUS, por meio de mais investimentos públicos.
Confirma-se novamente a necessidade (já protocolada pelo nosso mandato) de instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara dos Deputados para investigar os abusos cometidos pelos planos de saúde contra os usuários e discutir a necessidade de uma nova legislação e normas reguladoras para o sistema de saúde privado no país.
Saúde não é mercadoria! Vamos defender o SUS e a saúde pública, pelo bem do povo brasileiro.
Muito Obrigado.
Ivan Valente
Deputado Federal – PSOL/SP
11 de fevereiro de 2014