1- Se há algo que não se pode deixar de notar na conjuntura atual é a emergência de Gilberto Kassab como um dos políticos mais astutos e bem assessorados do momento. Num período rápido de quatro anos, ele se colocou como liderança da esfacelada oligarquia (modernizad a) paulista e brasileira, assumiu hegemonicamente a fatia – que antes pertencia ao DEM – do pensamento liberal e consagrou atrás de si um corolário de políticas públicas que transitam da ultradireita até a centro esquerda, abrindo, assim, um espaço amplo de negociação com forças advindas da esquerda como PCdoB, PT e de direita, como o PSDB. Um traço importante nessa personalidade é a capacidade de diálogo, pois Gilberto Kassab apresenta a todas as forças sociais proposições, e, diplomaticamente, enfrenta as questões sociais e políticas com desembaraço. Subestimar tamanha personalidade é um erro de monta irreparável, como já sentiram os políticos de porte como Alckmin, Campos, Dilma, Lula, dentre outros. Isso denota a séria derrota que os professores sofreram nesta greve.
2- Uma das principais características de Gilberto Kassab (herança característica do populismo de direita de Ademar ou de Jânio) é ofertar com a mão esquerda e segurar (ou retirar) com a mão direita. Dessa forma, ele atrela a “negociação” numa lógica que, de antemão, é dele. E foi assim durante todo o período de (d)estruturação do movimento dos professores (seria interessante comparar com outras movimentações de categorias do funcionalismo como a dos sepultadores). Desde o início, ele definiu como lógica que iria “chamar” a categoria “pra briga”, sem que esta estivesse preparada. Desde o início, “ofertou” protocolarmente com a mão esquerda – quando sinalizou aceitar as reivindicações dos professores – e negou com a mão direita. E foi assim: o movimento nasceu extemporâneo, e tornou-se (em nove dias!) anacrônico.
3- Há diversas características que devem ser pensadas nesse processo: o atrelamento da diretoria do sindicato à lógica (liberal) da prefeitura, o domínio da diretoria do SINPEEM pelo grupo do Cláudio Fonseca, e a pouca (ou a falta de) hegemonia política deste grupo junto à categoria. O fato de as oposições do sindicato serem hegemonizadas por visões “obreristas” e “movimentistas” e, principalmente, o fato de a categoria pensar conservadoramente como liberais ajudam a explicar o s equívocos durante a greve promovida pelo sindicato. A “maioria” da diretoria do sindicato percebeu que foi derrotada e tenta apresentar as “migalhas” como vitória, a minoria (que votou junto com a maioria) percebe que foi derrotada, mas credita essa derrota à crise de direção, ao crer que o problema de consciência política ou sindical se resume a quantidade de diretores ou de conselheiros de uma mesma posição dentro da diretoria.
4- Tudo indica que o fôlego de negociação salarial da prefeitura era maior, e que a fragilidade do movimento facilitou a míngua dessa pequena negociação. O principal escopo – da PMSP -, em curto e médio prazo, não são as questões econômicas e sindicais e sim a questão política. Em termos táticos: desmoralizar uma categoria trabalhista permite implantar políticas que atacam profundamente a autonomia de “cátedra” – como o irregular projeto de dupla docência através de CJ, a implantação de apostilas, o fechamento de classes, o fim das “férias” na educação infantil – permite implantar políticas pedagógicas desconexas com a realidade (e necessidade) social das escolas, além de proletarizar o professorado. Em termos estratégicos: num momento de crise econômica, os cortes sociais são a base da recup eração econômica, para o pensamento liberal. Sem a oposição dos professores (e das demais categorias do funcionalismo) fica mais fácil implantar esses cortes de austeridades econômicas (inclusive com o “escanteamento” de um aliado desnecessário nesse momento).
5- Ontem “voltei” à escola após oito dias de greve, houve as tradicionais brincadeiras sobre as minhas férias (fui um dos poucos que fez greve), ao mesmo tempo, a grita contra o Cláudio era imensa. As pessoas que criticavam o presidente do sindicato não tinham feito greve, não foram às paralisações ou assembleias. Isto é a categoria de professores: fragmentada, desu nida, hedonista (a prestação). Não pensa – hoje – como trabalho e sim como liberal (o patrão). Julga que o contato com o “chefe”, um curso complementar de pedagogia em faculdades de qualidades duvidosas, contar o tempo para aposentadoria ou ter dois cargos é chave para seu o sucesso ou o coqueiro em meio ao tsunami.
6- Por fim, há uma imensa necessidade de expressar um projeto político-pedagógico que não seja apenas a afirmação de uma genérica “democratização” de instâncias conservadoras da atual educação, como o Ler e Escrever. É preciso repensar a política e o cotidiano das escolas como afirmação de um ethos, como afirmação de algo novo. É preciso dar sentido à vida escolar e relac ioná-la com o conhecimento, com a introdução à ciência e com o mundo do trabalho.
John Kennedy Ferreira
Sociólogo e Professor do Marcos Mélega
Conselheiro Norte (até o dia 16 de abril)
Militante da Refundação Comunista – Filiado ao PSOL – Democraticamente