Os atuais mandatários da Seppir – Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial – entraram para valer em campo em defesa dos interesses da FIFA, das empreiteiras e do aparato militar-repressivo que volta suas garras afiadas contra a população civil, de maioria negra. Salvador e Rio de Janeiro foram as cidades escolhidas para, em 03 e 04 de outubro, respectivamente, sediarem o Seminário “Promoção da Igualdade Racial no Contexto dos Grandes Eventos”
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Ainda de acordo com a matéria do portal da Seppir, durante o Seminário “os estados da Bahia e do Rio de Janeiro assinam um protocolo de intenções com a União, através da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República (Seppir/PR), visando a implementação de ações conjuntas que assegurem a inclusão da população negra nas atividades decorrentes dos grandes eventos esportivos mundiais”.
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[3], a manutenção de presos políticos (Múmia Abu Jamal, o líder indígena Leonard Peltier e os cinco presos cubanos, René Gonzalez – solto recentemente – Antônio Guerreiro, Gerardo Hernandéz, Ramón Labañino e Fernando Gonzalez), a violência praticada por rebeldes e forças da OTAN contra civis afrodescendentes pretensamente ligados à Kadaffi, na Líbia, ou ainda, sobre o fechamento do campo de concentração de Guantánamo (uma das promessas de campanha de Barack Obama)? É possível separar a política de agressão do Império contra nossos irmãos africano-americanos e seus reiterados atentados à soberania dos povos das políticas de aproximação com o governo brasileiro e suas reiteradas tentativas em transformá-lo em correia de transmissão da política do imperialismo para a América Latina?
Os Seminários sobre “Igualdade Racial no Contexto dos Grandes Eventos” foram realizados através de parceria entre o Ministério do Esporte, os governos da Bahia e do Rio de Janeiro, do Consulado Geral Norte-Americano no Rio de Janeiro e a Federação das Indústrias do Estado do Rio. Os seminários integram, ainda, o Plano de Ação Conjunto entre o Governo Brasileiro e o Governo dos Estados Unidos da América para a Eliminação da Discriminação Étnico-Racial e a Promoção da Igualdade e que a Seppir, o Ministério das Relações Exteriores (MRE) e o Departamento de Estado (EUA) coordenam.
A geopolítica da Seppir privilegia o “núcleo duro’ das políticas do Império, o Departamento de Estado dos Estados Unidos, em detrimento do diálogo e da cooperação com países como Bolívia, Venezuela, Equador e Colômbia – que já desenvolvem e discutem – a implementação de políticas públicas voltadas a afros e indígenas. Estes não foram convidados a participar destas iniciativas “benfajezas”, patrocinadas pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos. Para nós, não é mera coincidência que as políticas de “lei e ordem” e “tolerância zero” que se expressam na Política Nacional Anti-Drogas para a América Latina, tem justamente como seus principais entusiastas o Pentágono e o Departamento de Estado Norte-americano e que elas, hoje, sejam fundamentais para justificar ideologicamente as ações terroristas do estado brasileiro contra a população civil negra nas favelas e periferias do país.
[4]. Estas empreiteiras e empresários que ganham rios de dinheiro com a especulação imobiliária – com a tranferência de polpudos recursos do poder público – apoiam entusiasticamete a política de repressão violenta ao tráfico de drogas com a expulsão e controle da população civil, seja através da remoção ou do extermínio puro e simples.
O espaço urbano como fonte de negócio e lucro desenfrado precisa disciplinar seus inquilinos “indesejáveis” – afro-descendentes, indígenas, pobres – que reclamam cidadania e direitos sociais. A lógica é da formação de territórios segregados, apartados de condições mínimas de cidadania e inclusão social. A ocupação militar dos morros, favelas, suburbios e periferias e a política repressiva e de “tolerância zero” contra negros e pobres é o aprofundamento de um verdadeiro apartheid social que joga contra os avanços democráticos que o movimento negro, em trinta anos de luta, conquistou. Portanto, o que assistimos hoje é todo um conjunto de políticas – políticas de faxina étnica – que através de violentas intervenções urbanas em nome dos Mega Eventos (Olimpíadas e Copa do Mundo) vem atender os interesses de empresários privados, políticos corruptos, cartolas e mandatários das entidades esportivas.
Os representantes da população negra no poder, em particular as instâncias de Promoção da Igualdade Racial, em todo território brasileiro, parecem tender a serem absorvidos pelo branqueamento institucional e assimilam uma visão eurocêntrica, elitista e individualista inscrita, por mais de quinhentos anos de dominação, nas estruturas do estado neocolonial burguês.
Como dizia Malcom X em relação aos líderes negros integracionistas, nos Estados Unidos, a forma como se deu a institucionalização do movimento negro no Brasil – seja pela ocupação de cargos nos governos ou, por outro lado, através das Organizações Não-Governamentais – cumpre o papel de “tranqüilizar” a elite branca e afastar qualquer perigo de que uma rebelião negra tome de assalto os palácios do poder (Autobiografia de Malcom X).
Desta maneira, a Seppir faz o jogo da elite burguesa ao expor a falsa imagem de inclusão de homens e mulheres negras na mídia mundial, através dos empregos temporários oferecidos durante os mega eventos (Copa de Mundo e Olimpíadas), quando, na realidade, as condições de acesso à saúde, educação, moradia e direitos sociais entre negros e brancos continuam desiguais. A SEPPIR silencia diante da violência racista contra a população civil negra – pratica de forma indiscriminada em nome da guerra ao tráfico – as políticas de remoção, despejos e as Unidades de Polícia Pacificadoras. Afinal, para um setor do movimento negro a formação de uma elite negra é o meio mais eficaz de lutar contra o racismo e facilitar a “integração” do nosso povo à ordem burguesa. Para nós, apenas uma luta contra o racismo se inscreve na formação de uma nova ordem social pós-classista e pós-racial capaz de incluir todos os negros e negras.
[5]. Para termos ideia, a proibição da venda de bebidas alcoólicas nos estádios (proibida pela Lei do Torcedor) será suspensa a pedido da marca de bebidas patrocinadora da Copa do Mundo. Outro absurdo é o fim da meia entrada aos estudantes. Outro parlamentar que vem se destacando a frente desta luta contra os desmandos da FIFA, na Câmara Federal, é Romário Faria (PSB-RJ)[6].
A SEPPIR vê na Copa e nas Olimpíadas a possibilidade de incluir afrodescendentes, capacitando-os para as oportunidades de emprego e renda que surgirão. Também preocupa a SEPPIR que os reiterados casos de racismo, na Europa, se reproduzam no Brasil, e para isso, contam com o apoio da toda poderosa FIFA.
[7]. Este valor deve aumentar dado que a iniciativa privada exige por parte do poder público maiores e maiores contrapartidas – entenda-se “garantias” para seus investimentos [8].
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Em segundo lugar, o racismo no futebol não é algo específico dos gramados europeus. No Brasil, quem acompanha as quatro linhas e freqüenta os estádios pode acompanhar de perto manifestações hostis contra jogadores afro-descendentes ou, ainda, xingamentos racistas contra as torcidas do Flamengo e Corintians. Alguns casos chegaram a ganhar publicidade como o caso do jogador Antônio Carlos, do Palmeiras, que chamou Jeovânio, do Grêmio, de “macaco”. Em nenhum momento a SEPPIR procurou a CBF e o seu déspota Ricardo Teixeira cobrando ações afetivas contra este tipo de manifestação racista nas quatro linhas. Excetuando-se o caso do jogador Grafite, este casos são levados a sério ao ponto de chegar ao Congresso Nacional, ao poder público, e merecer algum tipo de ação. Em suma, o que quer a SEPPIR é “fazer média” com a toda-poderosa FIFA e o capo Ricardo Teixeira.
A atual gestão da SEPPIR optou por jogar no time de Ganga-Zumba. Para os mandatários da SEPPIR promover a igualdade racial é privilegiar poucos em detrimento de muitos. Esta é uma versão neoliberal das políticas de ação afirmativa tão necessária à democracia brasileira. No entanto, ou temos democracial real, com participação de todos, em que as políticas de ação afirmativa visam contribuir para acelerar a integração da comunidade negra, ou faremos o jogo de Ganga-Zumba, de conciliação com esta ordem social racista e excludente. Nós somos do time de Zumbi: queremos liberdade para todos! Fraternidade com igualdade, liberdade com justiça! Estamos ainda no começo do primeiro tempo, o povo negro merece respeito e vai virar o jogo contra os sehores da ordem neocolonial, enfrentando, nas ruas, a faxina étnica e o racismo!
* Gilberto Batista Campos é historiador, Coordenador Geral do Círculo Palmarino e militante do movimento negro do Espírito Santos. Joselício Júnior – Juninho é jornalista, Coordenador Nacional de Finanças do Círculo Palmarino e coordenador do Ponto de Cultura “De periferia para periferia- valorizando a cultura afro-brasileira” em Embu das Artes, SP.
[1]http://www.seppir.gov.br/noticias/ultimas_noticias/2011/09/bahia-e-rio-de-janeiro-realizam-seminarios-sobre-promocao-da-igualdade-no-contexto-dos-grandes-eventos-esportivos
[2]http://globoesporte.globo.com/Esportes/Noticias/Olimpiadas/0,,MUL1315524-17698,00-NA+BRIGA+POR+RIVAIS+DO+RIO+ENCARAM+FOGO+AMIGO+AO+LONGO+DE+SUAS+CAMPANHAS.html
[3] Wacquant, Loic. Da escravidão ao encarceramento em massa. Repensando a questão racial dos Estados Unidos. Disponível em: <www.newleftreview.org/?getpdf=NLR24703&pdflang=pt>> Último acesso em 16 de outubro de 2011.
[4] http://carosamigos.terra.com.br/index/index.php/component/content/article/156-edicao-174/1957-itaquerao-especulacao-imobiliaria-e-higienizacao-as-custas-do-timao
[6] http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default.jsp?uf=1&local=1&newsID=a3494957.xml&channel=13&tipo=1§ion=Geral
[8] http://www.jogoslimpos.org.br/destaques/investimentos-publicos-na-copa-substituem-os-privados/
[9] http://oglobo.globo.com/rio/mat/2007/06/27/296541129.asp