Por Pedro Fuentes, Secretário de Relações Internacionais do PSOL
Escrevemos esse texto a poucas horas da conclusão da primeira conferência da Frente Nacional de Resistência Popular (FNRP) de Honduras,de modo que trata-se apenas de um informe inicial que pode ser completado. A FNRP reuniu cerca de 2 mil delegados/as provenientes de 18 departamentos que compõem o país.Os delegados foram eleitos em assembléias municipais e departamentais. Também participaram delegados do departamento “19”, formado por imigrantes hondurenhos que vivem em cidades dos EUA e Canadá, e que também se organizam na FNRP.
A Frente abarca a grande maioria das organizações camponesas, indígenas, trabalhadores organizados em praticamente todos os sindicatos, jovens, artistas e meios de comunicação. Assombrosamente, em Honduras não há só a imprensa oficial golpista, mas também a própria FNRP possui meios de comunicação em suas mãos: a rádio Globo e o Canal TC 36, ambos meios que transmitem diretamente todos os seus eventos,inclusive apropria conferência dos dias 26 e 27 de fevereiro. Dessa maneira, um setor politizado da população, que é grande, segue diretamente os acontecimentos políticos da FNRP.Mais assombroso ainda é a existência do jornal ‘O Libertador’ que faz uma denúncia contundente do regime e da grande burguesia hondurenha atualmente no poder. Na edição dessa sexta feira dia 25/2, as quatro primeiras páginas eram sobre os luxos da burguesia hondurenha e sua Dulce Vitta, com fotos de festas e celebridades passeando nos EUA e na Europa.
A importância é tal que estes meios pediram para participar com 3 delegados na Plenária Nacional que se formou com 150 delegados década departamento, representando diversos setores sociais. Na Conferência participaram delegados internacionais de diferentes países centro-americanos e do Brasil. Brasileiros, além do PSOL, estavam MST e PC do B.
A FNRP é uma organização com peso social e político de massas. Em poucos dias de estadia em Honduras isso parece como um fato palpável. Resistência é uma palavra com a qual se identificam amplos setores de massas. Por exemplo, os taxistas, que são um termômetro importante da situação, me disseram que80% deles estão com a resistência. Ou seja, a Frente agrupa setores já organizados, camponeses e trabalhadores, e conta com a simpatia das massas.
A Plenária Nacional foi um acontecimento fundamental de avanço desta poderosa organização social e política que é a FNRP. Um triunfo importante pela quantidade de delegados presentes, e porque se deu um avanço da construção e consolidação da direção política e das instâncias organizativas. O auge foi a eleição por unanimidade e a ovação a Manuel Zelaya como Coordenador Geral da FNRP e de Juan Barahona como Sub-Coordenador.
Além da eleição, foram debatidas as tarefas políticas da FNRP,cujo principal eixo é a volta de Zelaya e a realização de uma greve cívica para reafirmar a luta. O debate estratégico de uma política para tomada o poder foi longamente realizado. Não é por acaso que seja assim, já que o peso social e político adquirido pela FNRP coloca a tomada do poder como algo objetivo, uma etapa presente e viva. Apesar dos enormes avanços organizativos e políticos, porém, o debate estratégico sobre as vias de tomada do poder foi complexo e confuso. De um lado porque em Honduras não há uma realidade política totalmente clara. Apesar da FNRP ser uma força política e social importante,a atual correlação de forças não está favorável às massas e isso se expressa porque o governo está avançando com planos neoliberais e privatistas. Ainda assim, a volta de Zelaya tem simpatia das massas e isso ocorre porque os setores pobres e trabalhadores estão com ele. A diferença entre o governo Zelaya e este é clara: o nível de vida das massas e suas conquistas retrocederam junto com as restrições às liberdades democráticas.
Nesse contexto, a via para alcançar o poder tampouco é clara. Esteve em discussão a necessidade de criar um instrumento político com o qual se possa participar das eleições. A conferência votou unanimemente, seguindo uma frase da carta enviada a Zelaya em que dizia que há condições de participação das próximas eleições em 2013. Mas ao mesmo tempo, a carta dizia que as condições podiam mudar, e que as eleições eram táticas… E foi usada para uma votação demasiado taxativa, faltando tanto tempo. O período não parece permitir mudanças significativas de correlação de forças, e nem uma eventual tomada do poder por uma crise revolucionária que estimule a ação direta das massas. Assim, não ficou clara a relação entre o instrumento político-eleitoral e a própria Frente.
Este debate foi o primeiro passo da organização da FNRP como uma nova ferramenta. Apesar do debate ter se exasperado em posições antagônicas, o entusiasmo com a FNRP não decaiu entre os quase mil delegados. Todos os setores autenticamente representativos da base opinavam que havia sido uma primeira discussão e que o debate fortalece a FNRP. A combatividade,a militância e a valentia para enfrentar o golpismo consolidaram uma vanguarda valiosa em Honduras, e uma capacidade de organização também valiosa, que uma das mais ricas e importantes em todo o continente. Essa valentia foi palpável na Conferência. Muitos delegados foram ameaçados para não ir,outros foram presos na viagem, mas em nenhum momento isso afetou a plenária de modo negativo. Há muita garra e firmeza construída nesses quase 2anos de resistência,que custou a FNRP mais de 200 mortos.
A Plenária fez uma emocionante homenagem aos mortos na resistência. A tarefa de realização da própria conferência com tantos delegados já foi um salto crucial, que certamente terá repercussão nas bases da sociedade hondurenha, ampliando e fortalecendo a FNRP.