“Os programas de Dilma, Serra e Marina têm mais pontos em comum do que diferenças; a exceção é Plínio, que defende o socialismo”, escreve Frei Betto, escritor, em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, 02-09-2010.
Segundo ele, “a distância entre oposição e situação quase se anula e permite (…) a Henrique Meirelles despontar como o nosso Alan Greenspan, que ficou quase 20 anos à frente do Banco Central dos EUA”. “Ao contrário do ditado, o andor é de barro, e não o santo, afirma o frei dominicano.. Dilma ou Serra terão de governar sob pressão dos últimos redutos da oligarquia, o PMDB e o DEM, alvos de frequentes denúncias de corrupção, nepotismo e outras maracutaias”.
Eis o artigo.
O Brasil ainda tem muito a conquistar nos quesitos saúde, educação, saneamento, moradia, segurança e infraestrutura (rodovias, portos e aeroportos). É um gigante com pés de barro.
Contudo, nossa democracia se aprimora graças aos movimentos sociais, à mídia vigilante, à exigência de transparência e à adoção de leis como a Ficha Limpa.
Algo de novo marca a atual disputa presidencial. Os quatro candidatos com melhor posição nas pesquisas têm em comum muito mais do que julga nosso vão preconceito.
Nenhum deles vem das tradicionais oligarquias que se acostumaram a fazer na vida pública o que fazem na privada. Nem pertencem à elite brasileira ou nasceram em berço esplêndido. Os quatro se originaram na classe pobre ou média. Todos abominam a ditadura militar, o conservadorismo e tiveram na esquerda sua iniciação política.
Três foram vítimas da ditadura: Plínio (cassado e exilado); Serra (exilado) e Dilma (presa e torturada). Marina, alfabetizada aos 16 anos, sofreu a opressão do latifúndio amazônico. Filha do seringal e discípula de Chico Mendes, viu-se obrigada a se “exilar” da floresta para livrar-se da pobreza e da falta de escolaridade.
Os programas de Dilma, Serra e Marina têm mais pontos em comum do que diferenças. A exceção é Plínio, que não se envergonha de defender o socialismo. O PSOL vale-se do período eleitoral para divulgar suas propostas e se afirmar como partido. Isso oxigena o debate democrático.
Dilma, Serra e Marina se irmanam na arte de se equilibrar na corda bamba. Evitam tombar à esquerda ou à direita e adotam discurso que não desagrada nem a uma nem a outra.
Assim, a distância entre oposição e situação quase se anula e permite a Lula, que faz um bom governo, manter-se na confortável posição de quase unanimidade nacional. E a Henrique Meirelles despontar como o nosso Alan Greenspan, que ficou quase 20 anos à frente do Banco Central dos EUA.
Embora discurso de campanha seja como produto de feira livre – não passa recibo -, e os quatro candidatos apareçam envoltos numa aura de confiabilidade, o problema reside no andar de baixo.
Ao contrário do ditado, o andor é de barro, e não o santo. Dilma ou Serra terão de governar sob pressão dos últimos redutos da oligarquia, o PMDB e o DEM, alvos de frequentes denúncias de corrupção, nepotismo e outras maracutaias.
Marina, como já declarou, tentará suprir sua falta de alianças com um governo supostamente suprapartidário. O que, aliás, fez de fato o governo Lula, a ponto de merecer o apoio de Collor, Sarney, Renan Calheiros, Jader Barbalho, Roberto Jefferson e José Roberto Arruda.
Plínio, realista, sabe que a chance presidencial do PSOL é ainda um projeto de futuro.
Algo de comum entre os quatro chama a atenção: o silêncio diante da corrupção que assola a política brasileira. Os quatro são éticos, fichas limpas. Mas Dilma, Serra ou Marina, quem for eleito, terá de quebrar ovos para fazer a omelete.
Ou fazer de conta que, neste reino tupiniquim, que não se parece com a Dinamarca, nada há de podre.
Quem vencer verá.