Façamos da interrupção, um caminho novo.
Da queda, um passo de dança,
Do medo, uma escada,
Do sonho, uma ponte,
Da procura, um encontro!
(Fernando Sabino)
O Partido Socialismo e Liberdade, em sua III Conferência Nacional Eleitoral, manifesta sua solidariedade pelas vítimas do descaso do poder público e das intensas chuvas que castigaram o estado do Rio de Janeiro. Já foram resgatados mais de 200 mortos, sem contar as muitas perdas que ainda estão sob os escombros no morro do Bumba, em Niterói. Os levantamentos oficiais contabilizam cerca de 10.000 desabrigados e desalojados na Região Metropolitana do estado. A tragédia do morro do Bumba, favela cujos moradores pagavam até IPTU, construída ao longo das últimas décadas em cima de um lixão, é a prova mais cabal da crueldade e irresponsabilidade do atual prefeito de Niterói, Jorge Roberto Silveira (PDT), que mesmo tendo ciência dessa grave situação, desde seu primeiro mandato em 1989, nada fez para evitar essa tragédia.
Sem dúvida, essas fortes chuvas se relacionam com a crise ambiental que vivemos, mas é um erro culpar a natureza pelas vidas desperdiçadas. A grande maioria das mortes poderiam ter sido evitadas com investimentos em urbanização e habitação pelo poder público. A agressão ao meio ambiente pode explicar o volume recorde de chuvas que atingiu o Rio, e nos serve novamente de advertência para a necessidade de um meio ambiente sustentável, contudo não inocenta governos que fingem ignorar os direitos da população.
Com cinismo e covardia, Lula e Sérgio Cabral não vacilam em apontar os culpados pela tragédia: os favelados. Aqueles que insistem em sobreviver quando expulsos dos centros das cidades para as periferias, que teimam em construir suas moradias mesmo contanto somente com terrenos íngremes ou alagados. Esses governos criminalizam os moradores de periferia para não admitir as verdadeiras causas dos desabamentos – o descaso de suas gestões, a insuficiente urbanização de favelas, regularização fundiária e construção de moradias populares, bem como os irrisórios investimentos em contenção de encostas. Descaso esse que ficou patente ao vermos os apartamentos construídos com os recursos do PAC sendo inundados, apresentando infiltrações ou rachaduras.
O presidente Lula fez coro com Cabral, e também com os prefeitos Eduardo Paes (Rio de Janeiro) e Jorge Roberto Silveira (Niterói), entre outros, para culpar os moradores das áreas de risco, ao mesmo tempo em que esconde a falta de planejamento e critério de seu governo em administrar os poucos recursos destinados à prevenção de desastres. Seu ex-ministro da Integração Nacional, o baiano Geddel Vieira Lima (PMDB), canalizou para a Bahia, 64 das verbas da Secretaria Nacional de Defesa Civil (vinculada à Integração Nacional), enquanto o estado do Rio de Janeiro ficou com menos de 1% das verbas do programa. Infelizmente, Geddel não utilizou esses recursos para beneficiar o povo baiano, que hoje também sofre com enchentes e desabamentos. Enquanto isso, segue o sucateamento do Instituto Nacional de Meteorologia, que não recebe significativos investimentos em tecnologia e sequer equipamentos para previsão da intensidade das chuvas.,6%
O PSOL repudia a tentativa de criminalização das favelas em andamento, especialmente em um momento que se torna tão explícita a responsabilidade dos governantes pelo ocorrido. Mais do que nunca, teremos que solidariamente fazer com que o luto do humilhado – daqueles convertidos em resíduo humano pelo capital – transforme-se em luta por uma cidade com justiça social, direitos humanos e moradia digna para os trabalhadores e trabalhadoras. Teremos que fazer dessa revolta uma voz que esbraveje a imoralidade de uma Cidade da Música ou de um Caminho Niemeyer, feitos à revelia da poesia dos morros e dos caminhos coletivamente possíveis de serem trilhados, dos caminhos interrompidos violentamente pelas enchentes e deslizamentos, dos caminhos que foram soterrados debaixo do lixo do consumismo no Morro do Bumba.
Como medidas imediatas, exigimos que seja garantido, em primeiro lugar, a construção de moradias e o aproveitamento de prédios ociosos para as famílias que moram em áreas de comprovado risco de desabamento. Emergencialmente, as famílias atingidas devem ser cadastradas e abrigadas em alojamentos com infra-estrutura digna e atendimento social. Não toleraremos nenhum processo compulsório de remoção, como anunciado pelo prefeito do Rio de Janeiro Eduardo Paes. O reassentamento das famílias deve ocorrer com a participação da população!
Nessa luta, será necessária a mobilização da população, das associações de bairros, dos sindicatos e de todas as organizações populares e estudantis, para que essa tragédia não caia no esquecimento e para que novos acontecimentos como esses não venham a se repetir. Desde já, nos somamos às lutas em curso nas comunidades e nos incluímos nas campanhas de solidariedade organizadas pelo povo e pelas entidades de caráter sindical e popular, que estão coletando donativos para as famílias desabrigadas e desalojadas.
III Conferência Eleitoral Nacional do PSOL
Rio de Janeiro, 10 de janeiro de 2010