Por José Paulo Guedes Pinto e Regina Egger Pazzanese
“Rendo homenagem muito especial, por fim, a todos os que defenderam a Petrobrás quando ela foi atacada ao longo de sua história – e ainda hoje – e aos funcionários e petroleiros que se mantiveram de pé quando a empresa passou a ser tratada como uma herança maldita do período jurássico. Benditos amigos e companheiros do dinossauro, que sobreviveu à extinção, deu a volta por cima, mostrou o seu valor. E descobriu o pré-sal – patrimônio da União, riqueza do Brasil e passaporte para o nosso futuro.
Olho para trás e vejo que há algo em comum em todos esses momentos, algo que unifica e dá sentido a essa caminhada, algo que nos trouxe até aqui e ao dia de hoje: é, sinceramente, a capacidade do povo brasileiro de acreditar em si mesmo e no nosso país. Foi em meio à descrença de tantos que querem falar em seu nome… O povo – principalmente ao povo – devemos esse momento atual.
É como se houvesse uma mão invisível – não a do mercado, da qual já falaram tanto, mas outra, bem mais sábia e permanente, a mão do povo – tecendo nosso destino e construindo nosso futuro.” Luis Inácio Lula da Silva, DISCURSO DO PRÉ-SAL, BRASÍLIA, 31 DE AGOSTO DE 2009
1. Introdução
Os últimos 20 anos foram marcados pela era da globalização. Baseada em um modelo de capitalismo que prioriza o lucro acima do bem estar da humanidade, esta era trouxe cada nação e a maioria das populações para uma maior percepção de que fazemos parte de um mesmo todo. Do Brasil ao Japão, da África do Sul à Sibéria, o avanço do capitalismo vêm padronizando o consumo, as mercadorias e os serviços. A revolução da internet (como uma linguagem universal) possibilitou uma ampla conexão entre os povos e a recente crise econômica, social e ambiental, bem como seus impactos mundiais, nos mostra mais uma vez que estamos todos interligados, seja para o bem ou para o mal.
Neste início de século, cada um de nós sente o clima mudar a cada ano que passa: mais quente, mais chuvoso, a biosfera se altera com uma rapidez jamais vista. A previsão para as próximas décadas é ameaçadora: escassez de recursos naturais, como energia, água e alimentos jamais vistos antes; cálculos prevêem que mais de um terço da população, ou seja, mais de 2 bilhões de pessoas, serão atingidas diretamente e, segundo as Nações Unidas, mais de 200 milhões de pessoas poderão se tornar refugiados climáticos até 2050 por consequência da crise ambiental.
Muito diferente do início do século XX, a humanidade cada vez mais se conscientiza do seu papel no delicado equilíbrio da natureza. Em todos os campos do conhecimento, em todos os poros da sociedade, o tema do aquecimento global aparece com força. Nunca o meio ambiente foi tão pautado. Além dos vastos filmes, livros, artigos e pesquisas que denunciam a sociedade baseada na extração do petróleo, as maiores empresas e os principais governos do planeta têm procurado em suas práticas amenizar as causas e enfrentar as consequências desta escolha.
Ser “verde” tornou-se um imperativo. Investimentos em pesquisa e desenvolvimento são redirecionados, novos mercados e oportunidades de negócio aparecem; algumas nações, mais que outras, compreenderam o panorama e vêm se comprometendo com pautas e metas para o equilíbrio entre o lucro e o ambiente sustentável.
Neste contexto, grande parte da energia que move o planeta, baseada no petróleo, no gás e no carvão mineral é fonte de altíssima emissão de poluentes à atmosfera terrestre. Estas emissões são uma das principais causas do desarranjo socioambiental na contemporaneidade. Uma forma de superar as mazelas trazidas pela queima destes combustíveis fósseis são as novas fontes de energia para servir à população mundial, atualmente na casa dos 7 bilhões. São as chamadas energias renováveis. São chamadas assim pois suas tecnologias utilizam a natureza de forma quase não poluente, aproveitando o ciclo natural da biosfera, para capturar energia (solar, eólica, oceânica etc.) renovável.
Tudo indica que elas serão o “petróleo” do século XXI. Só no ano passado, segundo a Agência Inernacional de Energia (órgão da OCDE), o mundo investiu mais de US$155 bilhões em novas energias limpas e planeja investir, entre 2010 e 2030, mais US$ 9,1 trilhões. Os países que mais investiram em energias renováveis foram os EUA, a China e a Espanha, sendo a energia eólica a que atrai a maior parte dos investimentos (US$ 50,2 bilhões em 2007), seguida da energia solar (US$ 28,6 bilhões) cujos investimentos crescem a uma taxa média anual de 254%, desde 2004.
No decorrer da história humana, prever panoramas e estar preparado para as mudanças, têm se mostrado vantajoso. Momentos como este na história, de previsões alarmantes, mobiliza nações e líderes e é neste contexto que pretendemos, com o presente artigo, refletir sobre os caminhos da Petrobrás, uma empresa que apresenta sua identidade e imagem associadas à força dos brasileiros e à “cara” do Brasil – e compreender como esta empresa tem se posicionado frente a este diagnóstico global.
O Brasil se insere no cenário atual como uma “jovem” República, com pouco mais de 100 anos de experiência democrática. Apesar dos nossos governantes desde o início do século XX defenderem a soberania e o desenvolvimento nacional autônomo, independente e modernizante, o que vemos na prática são governos sempre à cauda dos acontecimentos, importando modelos, costumes, conhecimentos e estratégias de países mais desenvolvidos. Tal atraso e falta de planejamento a longo prazo são capazes de manter o status da 10ª maior economia do planeta ainda como um país de terceiro mundo, ou, em desenvolvimento.
Apesar de termos, durante mais de um século, passado por variados regimes políticos, da república velha a revolução de 1930, da fase Getulista aos anos de JK, dos governos militares a redemocratização, mesmo com a forte industrialização e urbanização que o país sofreu ao longo destas mudanças de governo, a pauta de produtos primários tem até hoje um importante peso na economia.
A Petrobrás é um exemplo vigoroso deste atraso. Diferentemente do que apresenta Lula em seu discurso, defendemos que a empresa não representa o povo brasileiro, pois justifica suas ações e estratégias apelando para a nação quando na verdade prioriza o lucro acima dos interesses da sociedade. A história da Petrobrás traz consigo um símbolo, uma identidade de nação pronta para o progresso, com recursos abundantes para se tornar soberana. Os anos 50, do século XX, se foram, muita coisa mudou desde então, no entanto, o discurso de Lula poderia ter sido assinado por Getúlio, ou Juscelino.
Em pleno século XXI, onde as maiores potências estão redirecionado boa parte dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento de novas fontes de extração de energia veremos, a seguir, como a Petrobrás (“a cara do Brasil”), em nome do desenvolvimento brasileiro, se prepara para as próximas décadas.
* Agradecemos os membros do coletivo de Ecologia Urbana que ajudaram a dar o pontapé incial deste tema, especialmente, Manoel Galdino, João Paulo Amaral, José Corrêa Leite e Rafael Poço, bem como os pareceres de Ana Maria Guedes e Odilon Guedes.
José Paulo Guedes Pinto é economista, doutorando em Economia pela Universidade de São Paulo, pesquisador do Gpopai-USP, professor da FESP-SP e membro do Coletivo Ecologia Urbana. ([email protected])
Regina Egger Pazzanese é comunicadora Social, mestre em História Social pela Universidade Estadual de Londrina e membro do Coletivo Ecologia Urbana. ([email protected])
Ilustração: Marcelo Rampazzo ([email protected])
Fonte: Blog da Ecologia Urbana