Dia 18 de novembro de 2009, a CPI da Dívida promoveu Audiência Pública com debate entre o ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga, e o Presidente do Conselho Regional de Economia do Rio de Janeiro, Paulo Passarinho. A Audiência foi proposta por requerimento do Deputado Ivan Valente (PSOL/SP), proponente da CPI da Dívida.
Armínio Fraga abriu a Audiência reconhecendo que a dívida brasileira não é pequena, e além disso é cara, ou seja, paga altas taxas de juros. Fraga reconheceu também que estas altas taxas de juros atraem o capital externo para investir na dívida interna, porém, afirmou que tais taxas são necessárias para o combate à inflação. Segundo ele, o crescimento do gasto social é o fator que tem aumentado a dívida, e que por isso o investimento público não pode aumentar, o que limita o crescimento econômico. Criticou o Projeto que acaba com o Fator Previdenciário, em discussão na Câmara, alegando que o problema das contas públicas é o gasto com a Previdência.
Por sua vez, Paulo Passarinho criticou o atual modelo econômico baseado na livre movimentação do capital, que coloca a política econômica nas mãos do mercado financeiro. Desta forma, o governo tem de satisfazer aos desejos do capital especulativo, beneficiando-lhe com altas taxas de juros da dívida interna e outras concessões, para evitar que tais capitais fujam do país. Denunciou que esta abertura financeira foi realizada de modo ilegal, de acordo com Ação das procuradoras do Ministério Público Valquíria Quixadá e Raquel Branquinho, e sugeriu que a CPI as convide para expor sobre o tema.
Citou 2002 como um ano no qual esta chantagem do capital se acentuou, exigindo nos títulos da dívida interna juros mais altos e prazos mais curtos, de modo a pressionar Lula, então candidato à presidência, a se comprometer a manter e aprofundar a política econômica de FHC, o que incluiu a aceitação do Acordo com o FMI. Exemplificou as imposições do FMI com o sistema de Metas de Inflação, adotado pelo Brasil a partir de 1999, no qual são estabelecidas altas taxas de juros sob a justificativa de controlar o nível geral dos preços. Dentro deste modelo, o país não pode crescer, impedindo as urgentes melhorias no sistema de saúde, educação e infra-estrutura.
Passarinho mostrou que desde 1995 o país não apresentou déficit primário, mas, pelo contrário, teve grandes superávits primários a partir de 1999, o que desmonta a tese de Armínio de que a dívida é alta devido ao excesso de gastos sociais. Passarinho ainda mostrou que atualmente a dívida interna é apresentada pelo governo com um estoque de R$ 1,3 trilhão, enquanto o seu valor efetivo é de mais de R$ 1,8 trilhão, incluindo-se as chamadas “Operações de Mercado Aberto” do Banco Central, que representam também dívida interna, remunerando os rentistas à taxa Selic às custas de vultosos recursos públicos. Tais operações são feitas principalmente para financiar as compras de dólares, sob a justificativa de que tais compras seriam necessárias para impedir a queda da moeda americana. Passarinho denunciou aos membros da CPI que, conforme afirmação de um especialista em mercado financeiro com 45 anos de experiência, tais compras de dólares terminam por acentuar ainda mais o processo de desvalorização do dólar, pois acaba atraindo ainda mais capital para o país, pois há a certeza de tais dólares serão comprados pelo Banco Central.
O Deputado Ivan Valente (PSOL/SP) ressaltou o pesado custo da dívida brasileira, que limita os gastos sociais e representa uma transferência de renda para o capital. Questionou Fraga sobre a negociação da dívida externa brasileira nos moldes do Plano Brady, da qual participou no início da década de 90. Questionou a razão pela qual o Banco Central não estaria localizando pactos que teriam sido firmados no exterior em 1992, requeridos pela CPI. Também perguntou por que tal dívida externa foi renegociada e transformada em Bônus Brady, apesar das sérias ilegalidades que já haviam sido apontadas naquele endividamento por 3 Comissões Parlamentares nos anos 80.
O Deputado Paulo Rubem Santiago (PDT/PE) também denunciou os mais de R$ 400 bilhões de “Operações de Mercado Aberto”, mostrando que elas não possuem respaldo legal, sendo inconstitucionais. Concordou com Passarinho em convidar as procuradoras Quixadá e Branquinho para Audiência desta CPI, e discordou de Armínio Fraga, mostrando que o verdadeiro déficit do país não é o da Previdência, mas sim, da Política Monetária, que exige pagamentos de mais de R$ 100 bilhões de juros da dívida. Denunciou também que a DRU (Desvinculação das Receitas da União) retira da Seguridade Social dezenas de bilhões de reais por ano, para permitir o cumprimento das metas de superávit primário.
Em seus comentários finais, Passarinho destacou o gráfico que mostra o Orçamento Geral da União de 2008, segundo o qual mais de 30% dos recursos são destinados para juros e amortizações da dívida, mesmo sem contar o refinanciamento, ou seja, a “rolagem”, que significa o pagamento de amortizações por meio da emissão de novos títulos. Enquanto isso, a educação recebe menos de 3% e a saúde menos de 5%.
Fraga, respondendo às questões de Ivan Valente, afirmou que os contratos da renegociação da dívida de 1992 existem, e manifestou estranheza quanto ao fato de que o Banco Central não estaria localizando-os. Quanto à ilegalidade da dívida afirmou que havia divergência de entendimento pois o governo, naquele momento, não considerava que a dívida externa era ilegal, mesmo que as Comissões Parlamentares tivessem concluído o contrário. Afirmou que o Banco Central não violou nenhuma lei ao regular o fluxo de capitais, e que uma suspensão de pagamentos da dívida não seria recomendável. Por outro lado, reconheceu que as taxas de juros brasileiras estimulam o rentismo.
Próxima reunião
A CPI realizará dia 25 de novembro, às 14:30h, Audiência Pública com o Economista Dércio Garcia Munhoz, que já assessorou comissões parlamentares da dívida na década de 80 e tem criticado a atual política de endividamento.
Rodrigo Ávila – da assessoria da Liderança do PSOL