Por Maykon Santos
“A Universidade precisa ser pintada de preto,
de mulato, de trabalhador, de camponês”
A frase acima foi dita por Che em dezembro de 1959, após ser nomeado professor Emérito da Universidade de Santiago. Em outubro de 2009, completaram-se 42 anos da morte de El Che. Longe de tentar escrever algo a altura do papel dele na luta pela transformação da sociedade latino-americana, este pequeno texto visa demonstrar como Cuba cumpriu um dos sonhos de Che: transformar a Universidade Cubana com as cores do povo.
Antes do triunfo da revolução cubana, em janeiro de 1959, 23,6% da população cubana era analfabeta e, entre a população rural, o índice era de 41,7%. As universidades cubanas, todas públicas, eram um bastião das classes médias e altas, consequentemente branca e racista.
Che sabia disso e ao pronunciar suas palavras, o fazia declarando que para o sucesso da revolução cubana, a universidade teria que ter um fim social e caminhar no mesmo espírito da revolução cubana. O que, na essência, significava dar ao povo cubano condições dignas de vida. Para isso, era necessário formar quadros capacitados para a ilha escapar da dependência tecnológica estadunidense, médicos, professores entre outras áreas essenciais para o planejamento da Cuba socialista.
Cuba não perdeu tempo! Já em 1961, dois anos após o triunfo da revolução, se realiza uma campanha nacional para alfabetizar a população e Cuba é declarado, anos depois, o primeiro país do mundo livre de analfabetismo. Em janeiro de 1962 é feita uma reforma universitária na ilha, que entre outras coisas, definiu a educação como sendo um dever do estado, totalmente gratuita e democrática; estruturou as matrículas nas universidades de acordo com as necessidades do país; estabeleceu uma relação do estudo com o trabalho, princípio básico de toda a estrutura de cuba, do ensino infantil até a universidade.
No caminho de universalizar o acesso do povo aos bancos da universidade, Cuba cria em 1972 uma modalidade de ensino superior exclusiva para os trabalhadores. Os cursos são semipresenciais, com um regime especial: mais ou menos a cada 21 dias os alunos vão à universidade e permanecem de 3 a 5 dias. Continuam, por um contrato com os patrões, ganhando seu salário enquanto estão em aulas. As ofertas dependem da demanda. Não há limite de idade. A duração é flexível, pois devem apresentar a mesma quantidade e qualidade de disciplinas que os cursos regulares. O trabalhador faz os cursos relativos ao seu trabalho.
Até 2001 mais de 700 mil cubanos tinham se formado em um curso superior, algo em torno a 7% da população total da ilha. Se considerarmos os cubanos com mais de 24 anos, idade considerada ideal para a conclusão do curso superior, os números sobem para quase 11%. Um entre cada 7 trabalhadores cubanos tem nível superior e 1 em cada 8 trabalhadores tem formação técnica secundária. Um cubano tem, em média, 12 anos de estudo.
Além disso, não podemos deixar de ter mente que Cuba demorou quase duas décadas para planejar sua economia sob o viés socialista, o que privou boa parte das gerações mais velhas que viveram sob as ditaduras pró ianques de antes da revolução e os primeiros passos da revolução a ter curso superior. E na década de 90, após a queda do muro de Berlim, o país viveu uma grave crise econômica, tendo que se reinventar.
Uma das formas de se reinventar em Cuba foi a criação do Programa de Universalização do Ensino Superior. Programa criado em 2001, após um detalhado estudo das causas do abandono e do não acesso de muitos cubanos ao ensino superior no período de crise da década de 90. O trabalhou apontou duas causas principais na queda do número de matriculados em universidade em Cuba: a distância das universidades para muitos cubanos e a necessidade de trabalho, que impedia que os jovens cursassem o curso superior. Assim, Cuba criou os SUM’s (Sedes Universitárias) em cada município cubano. Cada SUM está ligada uma universidade cubana e oferece cursos semipresenciais. como também uma bolsa auxílio em dinheiro para que o aluno conclua seu curso. Os SUM’s criaram a necessidade de uma grande ampliação das vagas na educação superior em Cuba, acrescida de intensiva campanha de mobilização. Mas foram um sucesso! As matriculas no ensino superior de Cuba passaram 144.972 em 2001 para 606.323 em 2006. Praticamente todo jovem cubano em idade de cursar o ensino superior está matriculado em uma universidade cubana. Nas palavras de Fidel Castro: “Hoy, Cuba es una grande escuela”.
Sem contar o intercionalismo cubano, que tem na formação em nível superior de homens e mulheres vindos de toda a América Latina um dos seus maiores expoentes. Até este ano, mais de 20.000 estrangeiros haviam se formado em universidades cubanas, a grande maioria com bolsa integral do estado cubano. Através desta formação e das misiones cubanas espalhadas por vários países africanos e latino-americanos, só na Venezuela mais de 26 mil médicos cubanos apóiam as misiones deste país, Cuba salvou milhares de vida.
Além disso, como a educação cubana deve ter uma função social, não há taxas de concentração em determinados cursos, o que propicia à população cubana altos padrões de vida como uma relação de um médico para 168 habitantes; relação de professor/aluno de 12,8 no ensino fundamental, 12,0 no médio e 5,6 no superior; taxa de mortalidade infantil de 6,2 para cada mil nascidos vivos; erradicação de várias doenças como poliomielite, difteria, tétano, rubéola, meningite e sarampo.
Passados quase 40 anos da fala de Che, Cuba cumpriu este seu desejo e ao conseguir pintar a universidade cubana com as cores de seu povo, realiza o mais belo ato em memória à vida de Che!
Maykon Santos é professor da rede municipal de ensino de Santos/SP e militante do Círculo Palmarino/SP