Economistas que não sabem a diferença entre campos de petróleo e plantação de chuchu deveriam parar de tagarelar
CESAR BENJAMIN
A DESCOBERTA dos campos do pré-sal abre uma oportunidade única para o Brasil. Não podemos errar, como vários países já o fizeram em situações semelhantes.
É compreensível que o governo prepare internamente a sua proposta. Porém, uma vez formulada, ela deve submeter-se a um debate público exaustivo. A simples tramitação de um projeto de lei ou uma medida provisória no Congresso não será suficiente para conferir legitimidade a decisões que terão tamanha influência sobre o nosso futuro. O ano de 2010 se aproxima. O financiamento de campanhas eleitorais, como se sabe, é decisivo na formação das convicções de grande número de parlamentares.
A duração desse debate deve subordinar-se ao tempo que a sociedade brasileira necessita para definir com clareza o seu próprio caminho, de forma democrática e tecnicamente consistente, ouvindo todos os atores legítimos, sem pressões espúrias, seja de empresas, seja de grandes consumidores do exterior.
A nova província petrolífera, de impacto mundial, pode ser uma área conflitiva no futuro, pois se estende até regiões onde a soberania brasileira não é reconhecida por alguns países, entre os quais os Estados Unidos, que acabam de reativar a sua Frota do Atlântico Sul. A visita anunciada dos ministros Edison Lobão e Dilma Rousseff a esse país, para tratar principalmente do modelo para o pré-sal, é extemporânea.
Não devemos nos submeter à pressa deles. Nem sequer mapeamos a distribuição de petróleo e gás na extensa área abrangida. Ainda não sabemos se é um campo mais ou menos contínuo ou se são blocos estanques, o que tem óbvias consequências sobre a estratégia adequada.
Contamos com uma empresa brasileira capacitada a desenvolver esses campos, mas, estranhamente, ela vem sendo apresentada como problema, não como solução. O ministro Lobão confunde a opinião pública quando defende a criação de uma nova empresa, que seria 100% estatal, alegando que 60% das ações da Petrobras estão nas mãos de particulares.
Feitas as contas corretamente, o que a Petrobras paga aos acionistas privados gira em torno de 8% do seu lucro (antes do pagamento de tributos e da retirada das reservas), um percentual razoável. A nova estatal, sem capacidade operacional, servirá tão-somente para organizar leilões e gerenciar contratos.
O Brasil não pode delegar a empresas privadas a decisão de exportar suas reservas de petróleo, em ritmo acelerado demais, tal como a lei atual lhes assegura. Nesse caso, estaremos trocando um recurso não renovável, estratégico e que tende a se valorizar, por dólares que tendem a se desvalorizar e cuja entrada pode ter implicações negativas para o conjunto da economia nacional.
Ao contrário disso, precisamos aproveitar os efeitos multiplicadores da nova produção, seja pela construção de sinergias com os mais diversos setores da nossa economia, seja pelo melhor uso da renda que será gerada, considerando a sociedade como um todo, inclusive as gerações futuras.
Questões complexas, que exigem sério esforço de planejamento. Ávidos por parasitar 50 anos de esforço da Petrobras, testas de ferro e aventureiros têm pressa na definição do marco regulatório. Alguns já trabalham em modelos de financeirização do pré-sal. Para eles, quanto menos debates, melhor.
Deveriam ser convidados a se retirar. E economistas que não sabem a diferença entre campos de petróleo e plantações de chuchu -uns e outros, para eles, devem ser tratados por meio dos mesmos modelos matemáticos abstratos e entregues a decisões atomizadas- deveriam parar de tagarelar. Já fizeram muito mal ao Brasil.
CESAR BENJAMIN, 53, editor da Editora Contraponto e doutor honoris causa da Universidade Bicentenária de Aragua (Venezuela), é autor de “Bom Combate” (Contraponto, 2006).