Resolução da Executiva Nacional do PSOL reunida em 27/01/2011
As eleicões 2010 inauguraram nova fase da disputa política no país lançando gigantescos desafios para a construção do PSOL e a luta pelo socialismo no Brasil. Enfrentaremos um governo apoiado por grande coalizão partidária, liderada pelo PT e o PMDB, com presença em importantes ministérios de forças políticas da direita tradicional, com maioria no senado, na câmara dos deputados e nos governos estaduais. Coalizão esta, que tem aplicado políticas econômicas e sociais que reproduzem os interesses do grande capital e a ordem conservadora. Também no processo eleitoral de 2010 ampliou-se a audiência de uma direita cada vez mais truculenta, que se alimenta de preconceitos e falsos moralismos, capitaneada pelo PSDB e o DEM com força em governos estaduais importantes que reúnem mais da metade do eleitorado nacional. Sendo assim, a direita enquanto força política programática e ideológica está a um só tempo no governo e na oposição, movimentando-se por conveniência. No essencial se unifica e constitui um campo polêtico de não-mudança mostrando no atacado alto grau de concordâncias e divergindo no varejo.
As eleiçoes foram disputadas num cenário de consolidação da hegemonia política burguesa em nosso país, para a qual o governo Lula, o PT e importantes organizações populares concorreram ativamente ao legitimarem políticas econômicas burguesas, discursos políticos e práticas conservadoras, e as ações coercitivas do estado de caráter antipopular. Por outro lado, as eleições também ocorreram num cenário de muitas dificuldades para os movimentos sociais e a esquerda, sem que o Conclat tivesse, naquele momento, alcançando a necessária unidade do movimento sindical e popular combativo; além da fragmentação da Frente de Esquerda (com as candidaturas de Zé Maria, PSTU e Ivan Pinheiro, PCB). Outro fator desfavorável foi a existência da candidatura de Marina Silva (PV) que, apesar do conteúdo fortemente conservador do seu programa, conseguiu ocupar um espaço simbolicamente progressista, que em 2006 havia sido ocupado pelo PSOL quando Heloísa Helena ficou em terceiro lugar na disputa presidencial. Diante deste quadro de dificuldades, a campanha presidencial do partido, encabeçada pelos companheiros Plinio Sampaio e Hamilton Assis foi um contraponto de esquerda e socialista às candidaturas do bloco dominante representada por Dilma (PT), Serra (PSDB) e Marina (PV). Plinio granjeou quase um milhão de votos e a legenda do PSOL para deputados federais um pouco mais, em um cenário em que o debate político de esquerda e socialista teve pouco espaço pela polarização conservadora entre os partidos da ordem (PT, PSDB e PV). O PSOL apresentou-se com um programa de esquerda de perspectiva socialista e conseguiu fortalecer-se como pólo de resistência à onda conservadora da politica neoliberal. Nos congratulamos, assim, com o companheiro Plinio de Arruda Sampaio pelo papel que cumpriu, para efetivamente melhor definir o perfil do PSOL diante dos trabalhadores e da sociedade brasileira, apesar das grandes dificuldades poli´ticas e materiais. Destacamos também a participação do companheiro Hamilton Assis, que cumpriu muito positivamente esta tarefa, seja levando as posições do PSOL no debate politico mais geral, seja na reafirmação do papel histórico e da atualidade da resistência, indigena, negra, feminista e popular. Porém, este resultado positivo não significa que o PSOL esteja consolidado como alternativa partidária. Ainda enfrentamos muitos obstáculos, a exemplo da baixa capilaridade social do partido, assim como a fragilidade de suas instâncias, mas avançamos na afirmação de um perfil mais partidário e melhoramos nossa imagem social, para o que a candidatura de Plinio/Hamilton foi fundamental. Nisto e na ampliação de nossa bancada parlamentar, consiste nossa principal vitória neste processo eleitoral. O PSOL foi assim a alternativa eleitoral de esquerda para um setor de vanguarda, enquanto que os partidos que se negaram a conformar a Frente de Esquerda tiveram um resultado marginal, denunciando assim seus equivocos estratégicos no terreno eleitoral.
O PSOL conseguiu expandir sua expressão institucional com a eleição de dois senadores, três deputados federais e quatro deputados estaduais. Por outro lado, apesar de não eleitos, devemos destacar os resultados eleitorais, a cargos majoritários e proporcionais, seja daqueles que tiveram uma votação relativamente melhor, seja também o papel de todas e todos que, mesmo com votações mais baixas, foram candidatos majoritários ou proporcionais e contribuiram em situações bem dificeis para levar as propostas do partido e construir a oposição programática de esquerda. A vitalidade do partido em um momento conjuntural extremamente adverso à nossa tática eleitoral, mostra que há um espaço a ser ocupado no espectro politico brasileiro por uma alternativa de esquerda e socialista. No entanto, consideramos uma perda ao projeto de esquerda e socialista a não eleição de Heloisa Helena (AL) e não reeleição de Luciana Genro (RS) e Raul Marcelo (SP), assim como a não eleição de outros companheiros com bom potencial eleitoral, a exemplo de Renato Roseno e João Alfredo (CE), Hilton Coelho (BA), Martiniano (GO) e Robaina (RS), dentre outros. O cenário pós-eleitoral é de enorme complexidade e muitas dificuldades exigindo de nosso partido a maior unidade possivel para que possamos continuar resistindo e avançando enquanto força politica de esquerda em nivel nacional. No que pese a atual correlação de forças, que pende favoravelmente ao governo e à oposição de direita, acreditamos que há um importante espaço para a construção de uma alternativa de esquerda neste pro´ximo peri´odo. Existe sempre, como foi verificado ate´ aqui na conjuntura, a possibilidade de o governo manter o arrefecimento da insatisfac¸a~o e consequentemente das mobilizac¸o~es populares, atrave´s de medidas compensato´rias ou pequenas concesso~es econo^micas, contudo, um dos fatores que podera´ provocar desgaste ao novo governo e´ a perspectiva de desacelerac¸a~o da economia em func¸a~o da continuidade da crise econo^mica internacional, agora transvertida de guerra cambial. O que, por sua vez, exigira´ novos apertos fiscais, ja´ anunciados pela equipe de transic¸a~o: aumento da taxa de juros e do supera´vit prima´rio; cortes dos gastos sociais (sau´de, educac¸a~o, reforma agra´ria, etc.); restric¸a~o de direitos previdencia´rios e subordinac¸a~o da previde^ncia pu´blica a` lo´gica de mercado atrave´s de medidas como a desonerac¸a~o da folha de pagamentos das empresas (acabando com o sala´rio educac¸a~o e reduzindo o desconto de INSS de 20% para 14%); arrocho salarial do funcionalismo federal; restric¸a~o ao cre´dito entre outras medidas.
A maioria que o governo obteve no senado e no congresso servira´ de base para a aprovac¸a~o destas medidas, ao mesmo tempo em que entrara´ em conflito com agendas progressivas vinculadas aos movimentos sociais e ja´ defendidas pelo nosso partido. Ja´ neste ini´cio de governo Dilma dois fatos importantes confirmam esta tende^ncia: o pedido de demissa~o do enta~o presidente do IBAMA frente a`s presso~es para que fossem aceleradas as obras da hidroele´trica de Belo Monte; e as medidas anunciadas pela nova Ministra da Cultura, apontando para um retrocesso na discussa~o sobre os direitos autorais no Brasil, sob o forte questionamento do movimento de cultura livre. Nesta perspectiva a oposic¸a~o de direita continuara´ enfrentando o mesmo dilema: ser oposic¸a~o sem conseguir, ou poder, diferenciar-se no essencial da poli´tica do governo. De nossa parte, devemos reafirmar e dar ampla ac¸a~o social e institucional a` nossa poli´tica de oposic¸a~o de esquerda e programa´tica ao novo governo federal e aos governos estaduais. Pela sua composic¸a~o poli´tica, o governo Dilma, assim como o de Lula, na~o e´ e nem sera´ um governo em “disputa”, dividido entre setores “desenvolvimentistas/progressistas” e “monetaristas/ortodoxos”. Apesar das contradic¸o~es e diverge^ncias que possam existir, como e´ natural em qualquer governo, a orientac¸a~o geral predominante, e que se reflete na indicac¸a~o de Anto^nio Palocci para a chefia da Casa Civil, esta´ baseada na defesa da mesma poli´tica liberal e conservadora que rege a economia desde a e´poca de FHC, baseada no cambio flutuante; disciplina orc¸amenta´ria para cumprir as metas de supera´vit prima´rio (transferindo bilho~es para o pagamento da famigerada di´vida pu´blica) e as metas de inflac¸a~o (fonte dos maiores juros do planeta e que continuam engordando o bolso dos banqueiros). Fatores estes que inibem qualquer poli´tica econo^mica progressista destinada a atender as demandas populares e fortalecer a soberania do pai´s. Por outro lado, a dupla crise social vivida no Rio de Janeiro (cata´strofe na serra e ac¸a~o militar nas favelas) desnuda, mais uma vez, as condic¸o~es socioambientais de barba´rie vividas nos principais centros urbanos do pai´s. Neste sentido, o que temos presenciado no Rio de Janeiro e´ uma demonstrac¸a~o cabal de incapacidade do capitalismo brasileiro em garantir condic¸o~es dignas de vida a estas grandes massas urbanas, devido a sua dina^mica baseada na concentrac¸a~o de renda e na reproduc¸a~o da desigualdade social e o uso dos espac¸os urbanos e rurais segundo os crite´rios da especulac¸a~o imobilia´ria e da reproduc¸a~o do capital. As quase mil mortes e os mais de 20 mil desabrigados na~o podem ser atribui´dos somente aos efeitos da “cata´strofe natural”, pois as mesmas tambe´m esta~o diretamente relacionadas a` falta de iniciativa governamental para evitar estas trage´dias, tendo em vista que o sucateamento da Defesa Civil e a falta de investimentos nos setores estrate´gicos para o combate a`s enchentes tambe´m e´ responsabilidade direta dos governantes. O relato´rio preliminar de inspec¸a~o realizado pelo CREA-RJ na regia~o serrana do Rio aponta que 80% das mortes teriam sido evitadas caso a legislac¸a~o ambiental do Pai´s fosse respeitada pelas prefeituras das cidades afetadas. Por este motivo, ale´m da solidariedade efetiva atrave´s da doac¸a~o de donativos aos desabrigados, o PSOL defende abertura de investigac¸a~o nas esferas dos poderes, para apurar responsabilidades dos governantes, vez que ja´ era de domi´nio pu´blico a possibilidade de chuvas fortes no vera~o, bem como va´rios alertas oriundos de especialistas. Defendemos ainda um plano de obras pu´blicas emergencial, com a criac¸a~o de um fundo nacional para a reconstruc¸a~o da Regia~o Serrana, capaz de gerar milhares de empregos nas atividades de construc¸a~o de moradias, estradas e postos de sau´de nas a´reas atingidas; a indenizac¸a~o de todas as fami´lias; e uma nova poli´tica de prevenc¸a~o de desastres naturais, aproveitando a tecnologia desenvolvida nas universidades, a partir do incremento do orc¸amento pu´blico destinado para estas a´reas. A trage´dia do Rio deu ainda maior centralidade para a questa~o ambiental no pai´s, abrindo inclusive espac¸o para que seja derrotada a nefasta reforma do Co´digo Florestal – com a possibilidade de atuarmos em unidade de ac¸a~o com diversos setores poli´ticos e sociais que va~o tomando cada vez mais conscie^ncia do que significa esta reforma proposta pelo governo atrave´s do deputado Aldo Rabelo (PCdoB). Precisamos abrir um amplo debate na sociedade brasileira sobre a urge^ncia de uma poli´tica ambiental para o Brasil, que ale´m da preservac¸a~o da Amazo^nia atrave´s de uma poli´tica de desmatamento zero, seja capaz de apresentar uma soluc¸a~o para as grandes cidades, onde se reproduzem as regio~es de risco fruto de uma ocupac¸a~o urbana desordenada e a falta de uma reforma urbana e agra´ria que enfrente este problema pela raiz.
Neste quadro de dor e sofrimento provocado pelas trage´dias so´cio-ambientais, a atitude dos parlamentares (deputados federais e senadores) de votaram um grande aumento de seus pro´prios sala´rios, enquanto o governo oferece migalhas aos desabrigados e uma proposta de reajuste irriso´rio para o sala´rio mi´nimo, provocou revolta e perplexidade na grande maioria da populac¸a~o. O aumento de 62% para os deputados, 134% para Dilma e de 149% para os ministros e´ um esca^ndalo. O PSOL foi o u´nico partido a votar contra este abuso de poder dos parlamentares e o u´nico a exigir o cumprimento das promessas de campanha do governo Lula em relac¸a~o a valorizac¸a~o do sala´rio mi´nimo. Lula prometeu dobrar o sala´rio mi´nimo em seus oito anos de seu governo, o que hoje representaria um sala´rio mi´nimo de R$700,00. Este, portanto, sera´ o valor que o PSOL defendera´ para o reajuste deste ano. Desde ja´ o PSOL reforc¸a a convocato´ria dos movimentos sociais e sindicais para a realizac¸a~o de uma manifestac¸a~o nacional em Brasi´lia, no dia 16 de fevereiro, para pressionarmos por um maior reajuste do sala´rio mi´nimo. O PSOL enfrentara´ esta nova conjuntura com um acu´mulo importante de experie^ncia na luta social e parlamentar, tendo consolidado bandeiras que hoje sa~o as marcas de nosso partido junto a importantes setores da populac¸a~o, a exemplo da luta contra a corrupc¸a~o, a luta pela aprovac¸a~o da Lei da Ficha Limpa (em que pese as contradic¸o~es dessa lei, pois a mesma vem sendo utilizada tambe´m na criminalizac¸a~o dos movimentos e lutadores sociais, como ocorreu nas u´ltimas eleic¸o~es com a condenac¸a~o a priori e injusta dos candidatos a vice-governador em Sa~o Paulo e o pre´-candidato a governador de Minas); a luta pela reforma agra´ria;a CPI da di´vida pu´blica e a luta por sua auditoria, articulada com a defesa de recursos para as poli´ticas pu´blicas sociais; a defesa do co´digo florestal contra a reforma orquestrada pelos latifundia´rios; a luta contra a Reforma da Previde^ncia e outras reformas trabalhistas que vem sendo articuladas pelo novo governo e a defesa dos aposentados pelo fim do fator previdencia´rio; a luta contra grandes projetos que representam um crime socioambiental, como Belo Monte e a Transposic¸a~o do Sa~o Francisco; a luta pela jornada de 40 horas semanais de trabalho, sem reduc¸a~o do sala´rio, que foi importante eixo de nossa campanha presidencial; a luta pela reforma poli´tica, especialmente quanto ao financiamento pu´blico de campanha e a ampliac¸a~o da democracia participativa, com a realizac¸a~o de plebiscitos e referendos sobre temas de interesse nacional; a luta por uma reforma tributa´ria progressiva e a taxac¸a~o das grandes fortunas; entre outras lutas que nos referenciaram enquanto um partido se´rio e dos mais atuantes. Fato reconhecido pela imprensa e jornalistas, que no pre^mio Congresso em Foco elegeram os tre^s deputados federais do PSOL entre os cinco melhores do Congresso Nacional. A esta pauta devemos incorporar com forc¸a a luta em defesa dos direitos humanos, incluindo a defesa permanente do mandato de Marcelo Freixo (PSOL-RJ), ameac¸ado de morte pelas mili´cias e hoje uma das principais lideranc¸as dos direitos humanos no pai´s, tendo ganho grande projec¸a~o apo´s o filme Tropa de Elite II em que sua luta e´ retratada por um dos principais personagens do filme, o deputado Fraga. O apoio a` luta de importantes segmentos que clamam pela democratizac¸a~o dos meios de comunicac¸a~o no Brasil tambe´m sera´ uma importante tarefa do PSOL, que entrou junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) com uma Ac¸a~o Direta de Inconstitucionalidade por Omissa~o (ADO n. 10) ajuizada pelo jurista Fa´bio Konder Comparato, que requer a` Corte que determine ao Congresso Nacional a regulamentac¸a~o de mate´rias existentes em tre^s artigos da Constituic¸a~o Federal (220, 221 e 223), relativos a` comunicac¸a~o social. Entre as provide^ncias, esta´ a criac¸a~o de uma legislac¸a~o especi´fica sobre o direito de resposta, a proibic¸a~o de monopo´lio ou oligopo´lio dos meios de comunicac¸a~o social e a produc¸a~o e programac¸a~o exibida pelos vei´culos. Este acu´mulo e este perfil que consolidamos ate´ aqui, e que constituiu hoje a base fundamental para futuros avanc¸os do PSOL, deve ser acrescido de uma dina^mica partida´ria que seja capaz de unificar e fortalecer a atuac¸a~o do partido diante das questo~es fundamentais da luta de classe e da luta social e cultural em geral, no pro´ximo peri´odo. Para isso, precisamos promover um rico debate no interior do partido visando politizar cada vez mais nossa intervenc¸a~o na luta social e institucional, tornando o III Congresso do PSOL, que sera´ realizado em setembro de 2011, um momento de acu´mulo programa´tico e fortalecimento orga^nico de nossa milita^ncia partida´ria. Junto ao processo de organizac¸a~o do III Congresso, devemos promover campanha poli´tica de massas baseada em alguns eixos priorita´rios. Esta devera´ ser articulada com uma campanha nacional de filiac¸a~o no partido, buscando acolher os novos militantes que simpatizaram conosco no processo eleitoral, assim como melhorar nosso padra~o organizativo. Esta campanha sera´ coordenada pela executiva nacional, com materiais unificados para todo o pai´s, incluindo um plano de formac¸a~o que inclua materiais e eventos partida´rios unificados.
Executiva Nacional do PSOL
Brasilia/DF, 27 de janeiro de 2011