Pronunciamento do deputado federal Ivan Valente – PSOL/SP
Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados,
Na semana passada, o governo federal apresentou publicamente a proposta do Plano Nacional de Banda Larga, que deve ser publicada em decreto nos próximos dias. A medida deve ser celebrada. O Estado brasileiro finalmente reconheceu que é preciso agir para enfrentar os enormes obstáculos na garantia do acesso do conjunto da população brasileira à internet. Como o próprio governo reconhece, o acesso à internet no Brasil hoje é caro, de baixa qualidade e ofertado em velocidades lentas, resultado de um modelo que, historicamente, deixou para o mercado resolver aquilo que deveria ser tratado como um direito do povo. Segundo dados do governo federal, a internet no Brasil é lenta: só 33% das conexões são de até 256 kbps e apenas 1% das conexões são superiores a 8Mbps.
O Plano apresentado pretende massificar a banda larga, levando o acesso a 40 milhões de domicílios, através de duas iniciativas principais: isenções fiscais para operadoras e fabricantes de equipamentos, e oferta do serviço a preços mais acessíveis a partir da atuação, no atacado, da Telebrás. No entanto, ainda não está claro até onde vai a oferta de tráfego de dados pelo governo. Oficialmente, o plano prevê a oferta em “localidades sem prestadores de serviço de comunicação com preço elevado ou baixa atratividade econômica em áreas de baixa renda nas regiões metropolitanas”. Em teoria, o Estado poderá entrar onde não haja oferta adequada. Mas esta redação, genérica demais, não resolve a questão.
A experiência já nos mostrou que o mercado não atenderá o conjunto da população brasileira, mesmo recebendo subsídios do governo. A lógica das grandes prestadoras de serviço não é garantir o direito da população, e sim auferir lucro. Isso seguirá deixando de fora milhões de brasileiros, já excluídos do acesso à informação e da possibilidade de exercerem seu direito à comunicação, via produção e difusão de conhecimento e cultura.
Ou seja, ao Estado não deve caber o papel de oferecer a banda larga na ponta apenas onde o mercado não atua. É preciso estar presente nas regiões onde a oferta existe, mas é inacessível – sobretudo se consideramos a chamada venda casada (pacotes de telefonia, internet e TV dos assinatura), que barateia o custo da banda larga apenas para quem tem condições de contratar outros serviços. Do contrário, o PNBL pode acabar criando “classes” diferenciadas de acesso, como os ricos com conexões domiciliares com capacidade de download ilimitada e os pobres freqüentando lan houses.
Por isso, é preciso instituir em definitivo o regime público para a prestação do serviço de banda larga no país. É isso o que prevê a Lei Geral de Telecomunicações para os serviços considerados essenciais à população e é isso o que defendem especialistas do setor e o conjunto de organizações da sociedade civil que participaram do processo da primeira Conferência Nacional de Comunicação, que aprovou resolução neste sentido. O regime público é condição para que o Estado tenha assegure obrigações de universalização (e não apenas massificação), qualidade, velocidade e continuidade do serviço, bem como o controle das tarifas.
O modelo apresentado no Plano Nacional da Banda Larga, no entanto, está centrado na oferta do serviço pelo mercado, sem determinar regras efetivas para garantir a boa prestação do serviço. Sem isso, corremos o risco de repetir, na expansão da oferta da banda larga no país aquilo que cansamos de ver na prestação do serviço de telefonia fixa ou móvel, com as operadoras sendo as campeãs nos órgãos de defesa do consumidor. Todo este debate ficou claro na audiência pública que realizamos em março justamente na Comissão de Defesa do Consumidor desta Casa. Para a imensa maioria dos participantes, é mandatório que o governo federal estabeleça o regime público para a internet no país.
Não é uma tarefa fácil. O simples anúncio do Plano, com as lacunas tratadas anteriormente, já provocou a grita das empresas de telefonia e dos partidos de direita, todos são contra a reativação da Telebrás. Segundo reportagem da Folha de S.Paulo, as empresas de telefonia pretendem inclusive acionar a Justiça para inviabilizar o plano. Telefônica, OI, Vivo e Claro são contra o papel de gestora do Plano pela Telebrás. Alegam que a presença da estatal na oferta de banda larga “quebra os contratos firmados” no processo de privatização do setor de telefonia – um dos maiores crimes cometidos contra o interesse público brasileiro. O Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e Serviço Móvel Celular e Pessoal (Sinditelebrasil) também divulgou nota agressiva contra o PNBL. Ameaçam boicotar o Plano.
Já o DEM anunciou que acionará a Justiça contra o PNBL. Segundo o líder dos democratas aqui nesta Casa, deputado Paulo Bornhausen, ligado às empresas de radiodifusão, o objetivo é barrar a “reestatização da Telebrás” para evitar o “desequilíbrio na competitividade do mercado”. Os lobistas não param de se manifestarem nas rádios e jornais, na tentativa vã de convencer a sociedade de que a quebra dos monopólios não atende aos anseios do povo.
Fica claro, portanto, que será necessário muita mobilização e pressão popular para garantir que o Plano saia do papel e que, de fato, leve um serviço de banda larga de qualidade para todos os brasileiros e brasileiras, sem exceções. O Brasil precisa de uma política de acesso à rede efetivamente inclusiva e sustentada no interesse público, onde o Estado não se limite a um papel regulador – que neste caso ainda é limitado – e assuma o compromisso de efetivação deste direito da população.
Para concluir, Senhor Presidente, gostaria de deixar registrada a carta que foi divulgada por dezenas de organizações da sociedade civil, reconhecendo os avanços promovidos pela criação do PNBL, mas apontando algumas lacunas e diretrizes importantes que precisam ser consideradas em sua implementação.
Muito obrigado.
Ivan Valente
Deputado Federal PSOL/SP
Plano Nacional de Banda Larga: importante, mas não suficiente
A proposta do Plano Nacional de Banda Larga anunciada no dia 5 de maio marca o reconhecimento do Estado em relação à necessidade urgente de ações do poder público para enfrentar a grave desigualdade existente hoje no que diz respeito às condições de acesso à banda larga no país.
As organizações da sociedade civil abaixo-assinadas saúdam a iniciativa e reconhecem as medidas ali contidas como um passo importante – ainda que não suficiente – para a democratização do acesso. Entendemos que qualquer política pública para banda larga deve estar baseada na garantia da universalização, da qualidade e da continuidade do serviço, promovendo a acessibilidade econômica a partir do reconhecimento das desigualdades sociais, de gênero e étnico-raciais do país. garantindo a acessibilidade econibiidade importante – ainda e[a pode selecionar iconografiaanda larga no Brasil. MixMIX mmmssadjoifejioadsfkljsc
Mais do que um simples serviço, a internet é uma rede que integra diferentes modalidades de serviços e funciona como um espaço de convergência de distintas perspectivas sociais, culturais, políticas e econômicas. O acesso à internet em alta velocidade é hoje essencial para a efetivação dos direitos humanos e da democracia e para a realização plena da diversidade cultural brasileira, ao possibilitar a afirmação das identidades locais e regionais e o intercâmbio entre as diferentes culturas.
A despeito de sua importância estratégica, o acesso à banda larga no Brasil é hoje limitado a 20% das residências. O serviço é caro e ruim, como indica o alto número de reclamações a entidades de defesa do consumidor. Dados da União Internacional de Telecomunicações mostram que, em 2009, os custos com acesso à banda larga representaram em média 4,58% da renda per capita do brasileiro, valor altíssimo em comparação a países de realidade similar. Os dados demonstram que o modelo atual, baseado unicamente nas regras de mercado, não dá conta de responder às necessidades do país.
Reconhecemos como positiva a implementação de um processo permanente e salientamos a necessidade da participação ativa da sociedade civil no acompanhamento e fiscalização da execução do Plano. Neste processo, é fundamental que sejam reconhecidas as articulações em curso, como o desenvolvimento do marco civil da Internet e a reforma da Lei de Direitos Autorais e o acúmulo de debates prévios em espaços participativos, especialmente nas Conferências Nacionais de Comunicação e Cultura e no Fórum de Cultura Digital. Com referência neste acúmulo, entendemos que o Plano deve se basear nas seguintes diretrizes:
Considerar o acesso à internet banda larga como um direito fundamental e um serviço público, a ser garantido pelo Estado e prestado em regime público, por empresas públicas e privadas;
Garantir a universalização do acesso residencial à banda larga, na perspectiva de efetivar o direito à comunicação, com a oferta do serviço em condições acessíveis para o conjunto da população;
Estabelecer controle sobre as tarifas de modo a tornar viável o acesso a toda população, garantindo a gratuidade do serviço sempre que necessário e a não discriminação de tarifas entre os usuários;
Promover a concorrência efetiva entre operadoras na prestação de serviços, inclusive por meio do provimento direto por empresas públicas e do acesso não discriminatório e competitivo à infraestrutura das operadoras;
Definir políticas integradas entre União, estados e municípios de modo a otimizar o uso da infraestrutura física e lógica e viabilizar a ampliação da oferta pública de banda larga com o uso de diferentes tecnologias, inclusive por meio da reserva de espaço eletromagnético livre de licenças para aplicações comunitárias;
Proporcionar espaços de acesso público e comunitário gratuito e sem restrições quanto ao tipo de uso, inclusive por meio do fomento a redes abertas;
Determinar parâmetros obrigatórios de continuidade e qualidade do serviço, em especial em relação à velocidade de acesso e ao dever de informação ao consumidor;
Proteger o direito à liberdade de expressão, à privacidade, à proteção de dados pessoais, à neutralidade de rede de todos os usuários e usuárias e à acessibilidade de pessoas com deficiência;
Estimular o uso da rede para produção, compartilhamento e distribuição de conteúdo informativo e cultural, visando à democratização da comunicação e da cultura;
Implementar políticas públicas de promoção da cultura digital e estímulo ao uso da rede para fins educacionais, científicos e culturais;
Fortalecer instrumentos de regulação e fiscalização por parte do poder público, com ampliação da participação social, garantia de independência em relação aos agentes de mercado e capacidade de atuação rápida e eficaz;
Promover a inovação com base em uma política de fomento à pesquisa e ao desenvolvimento de tecnologia nacional para hardwares e softwares livres.
Acreditamos que a observação desses princípios e diretrizes pode garantir uma política de banda larga efetivamente inclusiva e sustentada no interesse público.
Brasília, 7 de maio de 2010