O deputado federal Ivan Valente apresentou nesta quarta-feira (14/04) requerimento à Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara para a realização de uma audiência pública sobre a contaminhação de alimentos no país. Pesquisas mostram que mais de 80% da produção nacional de alimentos apresentam resíduos de agrotóxicos. Segundo a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), 20% das amostras em nível nacional apresentam índices de contaminação acima do permitido para a preservação da saúde da população.
Sob protesto dos ruralistas, a Anvisa está reavaliando a comercialização de 14 tipos de agrotóxicos no país. Tratam-se de produtos já proibidos em muitos países, como os Estados Unidos, Argentina e na União Européia, por terem sido responsáveis pela contaminação de alimentos, de trabalhadores rurais e do meio ambiente, causando o envenenamento dos consumidores, a morte de trabalhadores e a destruição da vida animal e vegetal. O uso de alguns desses produtos pode afetar os sistemas nervoso, gastrointestinal, circulatório, imunológico e endócrino. Pode ainda irritar os olhos, a pele e até provocar câncer.
A medida tem enfrentado a resistência da indústria de agrotóxicos, do agronegócio e também da bancada ruralista. O Brasil é o maior mercado de agrotóxicos do mundo e representa 16% da sua venda mundial. Em 2009, foram vendidas aqui 780 mil toneladas, com um faturamento estimado da ordem de oito bilhões de dólares. Ao longo dos últimos 10 anos, na esteira do crescimento do agronegócio, esse mercado cresceu 176%, quase quatro vezes mais que a média mundial, e as importações brasileiras desses produtos aumentaram 236% entre 2000 e 2007. As 10 maiores empresas do setor de agrotóxicos do mundo concentram mais de 80% das vendas no país.
Ou seja, a medida da Anvisa enfrenta interesses poderosos, que contam com o apoio do governo federal através do Ministério da Agricultura. Para Ivan Valente, não bastassem todos os problemas de concentração de terra e destruição do meio ambiente, constata-se agora, de forma científica, que o modelo brasileiro de produção agrícola também vem sendo responsável por um dos maiores crimes contra a nossa população.
“O Sindicato das Indústrias de Defensivos Agrícolas recorreu até ao Judiciário para impedir que os resultados da reavaliação da Anvisa sejam publicados. Já o Ministério da Agricultura quer retirar da Anvisa sua prerrogativa de fiscalizadora do setor, entregando para os representantes dos ruralistas que ali estão instalados a tarefa de avaliar e registrar agrotóxicos no país. Será a raposa cuidando do galinheiro”, disse Ivan Valente.
“Na verdade, como afirma uma série de pesquisadores brasileiros, com as proibições dos EUA e União Européia, as transnacionais começaram a despejar seu lixo tóxico aqui no Brasil. Os agrotóxicos que as empresas não conseguem vender lá fora, que têm indicativo de problemas, agora são empurrados pra nós, resultando não apenas na potencialização de ameaças de contaminação, mas em mortes confirmadas pelo uso desses produtos”, acrescentou.
Em 2005, a OIT (Organização Internacional do Trabalhado) e a OMS (Organização Mundial da Saúde) estimaram em 7 milhões o número de casos agudos e de longo prazo de contaminação, e em 70 mil o número de mortes provocadas por agrotóxicos a cada ano em todo o planeta, sobretudo nos países mais pobres. Numa petição ao Ministério Público, o deputado federal Adão Preto já havia denunciado a morte de 5 mil trabalhadores rurais por ano no Brasil em função da contaminação com os agrotóxicos.
Caso o requerimento seja aprovado na Comissão de Defesa do Consumidor, serão convidados para a audiência pública representantes do IDEC (Instituto de Defesa do Consumido), do SINDAG (Sindicato das Indústrias de Defensivos Agrícolas), da ABRANDH (Ação Brasileira pela Nutrição e Direitos Humanos); Agenor Álvares, Diretor da Agência Nacional de Vigilância Sanitária; e Rosany Bochner, especialista em toxicologia da FIOCRUZ (Fundação Instituto Osvaldo Cruz).