IHU – Unisinos *
Três pré-candidatos despontam como os principais na corrida eleitoral para a presidência: José Serra, Dilma Roussef e Marina Silva. Coligações e projetos são alvo de críticas e análises dos três, assim como possíveis apoios e outros candidatos que podem se inserir na eleição e fazer a diferença ideológica. "Não há grandes distâncias entre os três projetos do ponto de vista ideológico", disse Chico Alencar em entrevista à IHU On-Line, realizada por e-mail.
O deputado federal refletiu sobre o projeto e a posição ideológica dos três pré-candidatos e falou sobre as ideias e possibilidades que o PSOL pode trazer para o pleito que ocorrerá neste ano. "Como anunciei publicamente, dou meu apoio programático e entusiasmado à pré-candidatura de Plínio de Arruda Sampaio, que é nossa figura pública de maior expressão depois de Heloísa Helena", apontou.
Chico Alencar é graduado em História pela Universidade Federal Fluminense. Realizou mestrado em educação na Fundação Getúlio Vargas. É professor licenciado de História da UFRJ. Foi eleito deputado federal em 2002. Atualmente, é membro do Conselho de Ética da Câmara dos Deputados.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Serra, Dilma e Marina. Como o senhor vê essas três candidaturas à presidência?
Chico Alencar – Existe hoje a construção de uma falsa polarização entre as duas pré-candidaturas consideradas principais: a de Serra e a de Dilma. Com a conivência da mídia grande, constrói-se, no imaginário coletivo, a percepção de que são quase as únicas candidaturas. No debate social, a peleja se restringe a discussões sobre se os oitos anos de Lula foram melhores ou piores do que os de FHC. São manobras discursivas que diminuem a política. Não podemos cair na armadilha do plebiscito. Embora haja distinções pontuais, não existem diferenças estruturais entre os dois projetos (PSDB/DEM e PT/PMDB).
Marina começou bem, anunciando a refundação do PV e a proposição de um outro projeto. Mas, com o tempo, perdeu vigor crítico e sucumbiu à armadilha da estratégia plebiscitária. Tem "reconhecido os avanços dos dois governos", o que significa não perceber os atrasos que, sistematicamente, continuam a marcar governos que se sucedem. A sociedade brasileira é muito mais diversa e plural do que esses esquemas políticos do poder e do dinheiro fazem crer.
IHU On-Line – Como o senhor posiciona ideologicamente esses candidatos?
Chico Alencar – Não há grandes distâncias entre os três projetos do ponto de vista ideológico. Embora alguns analistas caracterizem Serra como "desenvolvimentista", seu grupo político é o mais fiel, dentre eles, aos preceitos neoliberais que vêm destruindo esse planeta.
Dilma, outra que é considerada "desenvolvimentista", tende a gerir um governo semelhante ao de Lula, onde há predomínio do social-liberalismo, mitigado pelos poucos setores do governo que conseguem apresentar um caráter mais progressista e popular.
Marina, pelas forças políticas que bancam sua campanha, assumiria, também, um projeto muito semelhante a esses, com um nível um pouco maior de preocupação com a questão ambiental.
IHU On-Line – Nas prévias internas do PSOL, todos afirmam que Plínio de Arruda Sampaio será vitorioso. Ele é seu candidato?
Chico Alencar – O processo de escolha do candidato do partido à presidência tem sido marcado por muita disputa e equilíbrio, natural nos processos democráticos que o PSOL se propõe a manter, ao contrário de outros partidos que abandonaram os fóruns democráticos, entregues de corpo e alma às decisões de suas cúpulas. Espera-se que a transparência e o rigor ético nos encontros de base não sejam manchados pela disputa de se eleger delegados a qualquer preço.
Como anunciei publicamente, dou meu apoio programático e entusiasmado à pré-candidatura de Plínio de Arruda Sampaio, que é nossa figura pública de maior expressão, depois de Heloísa Helena. Entretanto, qualquer que seja o candidato do PSOL, representará o projeto alternativo de que, de fato, esse país precisa.
IHU On-Line – Como ficou a tese de apoio à Marina Silva?
Chico Alencar – Num primeiro momento, tínhamos esperança de que a senadora poderia refundar o Partido Verde, e assumir um projeto de sustância que uma candidatura que se pretende alternativa precisaria ter. Chegamos a dialogar com o PV sobre nossa possível adesão à candidatura. No entanto, aos poucos, o partido de Marina se mostrou pouco entusiasmado com o diálogo, aproximou-se dos partidos mais conservadores do país, e construiu um discurso pragmático e omisso. No RJ, Gabeira é candidato ao governo coligado com PSDB e DEM: o que é isso, companheiro? Ficou inviável qualquer adesão à candidatura nacional do PV, que, aliás, faz parte do governo Lula (PT), do governo Serra (PSDB) e do governo Kassab (DEM), na capital paulista.
IHU On-Line – Qual é a expectativa do desempenho do PSOL para a Câmara dos Deputados?
Chico Alencar – A partir da atuação sólida e dedicada de nossos deputados nos poucos mandatos que possuímos, tendo consolidado acúmulo através das lutas sociais, esperamos ampliar nossa presença nos parlamentos. Entretanto, admitimos que não é tão fácil, uma vez que as eleições se tornam, cada vez mais, reflexo do poder econômico, onde ganha quem tem mais dinheiro para fazer campanha. Nós do PSOL nos negamos a entrar nesse jogo. Resistiremos, faremos contraponto e, com nossa militância, vamos tentar convencer a população de que o PSOL faz diferença.
IHU On-Line – Em sua opinião, por que o PSOL não conseguiu arrebatar a militância de parte considerável do PT que se afastou do mundo da política?
Chico Alencar – Em primeiro lugar, ao se frustrar com escândalos de corrupção envolvendo o PT e sua guinada à direita, parte da militância perdeu a crença na política. Foi para casa. Ao perceber que um projeto tão bonito quanto foi o PT havia afundado completamente, perderam a fé de que alguma outra coisa pudesse dar certo. Além disso, o governo federal tem uma postura de tentar cooptar, através de "auxílio econômico", e bom papo político, qualquer movimento social que apresente maior flexibilidade moral. Soma-se a isso um momento histórico muito negativo, caracterizado por apatia na participação política.
IHU On-Line – Como o senhor responde às críticas de que o PSOL é o PT de 25 anos atrás?
Chico Alencar – Não considero isso uma crítica, mas um elogio. O PT tem uma história linda, única na esquerda mundial. Nasceu de baixo para cima, através da força dos trabalhadores e dos setores acadêmico e católico. Lamentavelmente, degradou-se aos poucos até se tornar um partido semelhante aos outros. Se somos considerados o que o PT foi, ótimo. Aliás, a história não se repete, e reconheço que ainda não temos as virtudes e o engajamento social daquele PT.
IHU On-Line – Qual será o legado de Lula para o país e para a política brasileira?
Chico Alencar – Lula deu uma feição popular a um projeto conservador. Fez o velho continuar velho, e parecer novo. Através da manutenção de privilégios, continuou atendendo aos ricos, e agradando aos pobres com uma política social ligeiramente mais robusta do que a de seus antecessores. Bolsa-família e bolsa-banqueiro. Lula deixa sim algum avanço social, mas extremamente tímido se comparado aos desafios desse país, que ele tinha tantas condições de enfrentar se o medo não tivesse vencido a esperança. Lamento. Sua figura, por sua extraordinária capacidade de comunicação, é popular. Mas se você indaga o povo como vão às políticas públicas de saúde, educação, transporte, segurança e habitação, ouvirá muita reclamação.
IHU On-Line – Qual é a posição do PSOL relac
ionada à divisão dos royalties do pré-sal?
Chico Alencar – A bancada do nosso partido se posicionou, num primeiro momento, favoravelmente à emenda dos deputados Ibsen Pinheiro (PMDB/RS), Humberto Souto (PPS/MG) e Marcelo Castro (PMDB/PI). Entretanto, cordialmente, votei contra a indicação de nosso líder Ivan Valente. Desde o início, minha posição é contrária à emenda, que considero desastrosa. É um falso distributivismo que, num primeiro momento, pode seduzir, mas não resiste a qualquer análise mais criteriosa.
Outro texto, mais equilibrado, havia sido aprovado anteriormente. Os estados produtores ficavam com 26,5% dos royalties, e os municípios confrontantes, com 18%. As cidades afetadas por operações de embarque e desembarque levariam 5%. A União ficaria com 20%, os estados não produtores, com 22%, e todos os outros municípios brasileiros, com 8,75%. Entretanto, o próprio relator, Henrique Eduardo Alves (PMDB/RN), afirmou que seu projeto não deveria prevalecer.
A "Emenda Ibsen" lançou tudo isso fora. Ameaça dividir todo o recurso oriundo dos royalties, inclusive os já explorados do pós-sal. Embora sincera por parte de alguns, a posição é demagógica por parte de outros. A ideia de compensação para os Estados produtores foi ignorada. Seria como determinar a divisão dos lucros com a exploração dos minérios de Minas Gerais. E os impactos sociais e ambientais provocados pela exploração do petróleo? Como lidar com eles sem os recursos? Vamos lutar até o fim para que a trágica aprovação desse projeto não aconteça.
* Instituto Humanitas Unisinos