O deputado federal Ivan Valente (foto), líder da bancada do PSOL na Câmara dos Deputados e segundo vice-presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito da Dívida Pública foi entrevistado pelo movimento de apoio à pré-candidatura de Plínio Arruda Sampaio.
Confira as opiniões de Ivan Valente sobre o trabalho da CPI da Dívida Pública e seus desdobramentos.
Deputado, a dívida pública federal fechou o ano de 2009 em R$ 1,497 bilhão, com aumento de R$ 100 bilhões em relação a 2008. O aumento reflete exatamente as emissões de títulos promovidas pelo Estado brasileiro para capitalizar o BNDES e permitir o socorro a empresas em meio à crise econômica. Qual a sua opinião sobre esta evolução da dívida e seus impactos para a economia nacional?
Em primeiro lugar, é preciso ressaltar que a dívida pública é bem maior, pois o governo costuma divulgar as estatísticas excluindo importantes parcelas da dívida. Por exemplo: a dívida interna fechou o ano de 2009 em R$ 1,826 trilhão, incluindo as chamadas “Operações de Mercado Aberto”, ou seja, a dívida do Banco Central com o mercado, que também paga juros altíssimos, às custas do Tesouro. Estas operações foram as maiores responsáveis pelo crescimento da dívida, tendo aumentado nada menos que R$ 127 bilhões no ano passado, principalmente para financiar a compra de reservas em dólares.
Qual o resultado disso? O país acumula cada vez mais dólares, para comprar a confiança do mercado, às custas de uma dívida interna crescente e cara, para aplicar estes dólares em finalidades questionáveis, como o “empréstimo ao FMI”, que fortalece uma instituição falida, cujo receituário se mostrou mais uma vez fracassado, com a crise mundial.
Outro importante fator de crescimento da dívida no ano passado foi a grande emissão de dívida (R$ 100 bilhões) para a capitalização do BNDES, o que significa um grande subsídio público às grandes empresas privadas, visto que o governo paga juros iguais ou até maiores que a Selic e receberá das empresas a TJLP, taxa bem mais baixa. Na realidade, isto significa livrar o setor financeiro privado de sua responsabilidade de financiar o setor produtivo a juros baixos. Significa mais uma vez garantir aos bancos privados o rendimento alto e certo dos títulos públicos, enquanto o governo assume todo o risco de bancar a produção, inclusive sem a devida transparência sobre quais foram os empréstimos feitos pelo BNDES com tais R$ 100 bilhões.
Os trabalhos da CPI da dívida pública – da qual o senhor é o 2º vice-presidente – foram prorrogados até o final do mês de março deste ano. Será possível neste período concluir as investigações necessárias? Em que patamar estão os trabalhos atualmente?
Neste momento, estamos analisando a documentação encaminhada pelos órgãos competentes, e os depoimentos das Audiências Públicas da CPI, que já nos fizeram constatar graves irregularidades na gestão do endividamento.
Porém, dada a dimensão gigantesca da dívida pública, não será possível se fazer todas as investigações necessárias, até porque os órgãos responsáveis pelo endividamento têm demorado a responder a muitos de nossos requerimentos de informação. O que, de qualquer forma, demonstra que a criação da CPI foi uma grande conquista da sociedade, dado o caráter obscuro da dívida pública, que atualmente representa o centro dos problemas nacionais.
Em 2009, o governo federal gastou nada menos que R$ 380 bilhões com juros e amortizações das dívidas externa e interna, mesmo sem computarmos o chamado “refinanciamento”, ou seja, o pagamento de amortizações por meio da emissão de novos títulos.
Estes R$ 380 bilhões representam nada menos que 8 vezes os gastos federais com saúde no ano passado, ou 12 vezes os gastos com educação, ou mesmo 152 vezes os gastos com Reforma Agrária.
A dívida do Estado de São Paulo, que foi negociada com a União em 1997 e saltou de R$ 50,3 bilhões naquele para mais de R$ 145 bilhões em 2009, chegou a ser analisada na CPI da Câmara?
Um item importante da CPI é a análise das dívidas dos estados e municípios que, antes mesmo de serem assumidas pela União, já cresciam principalmente devido às altas taxas de juros estabelecidos pela própria esfera federal. Além do mais, após tal assunção pelo governo federal, estas dívidas continuaram a explodir, devido ao índice escolhido para a atualização monetária (IGP-DI).
Baseado em informações encaminhadas à CPI pelo Tesouro Nacional, verificamos que, caso o índice tivesse sido o IPCA, os estados não precisariam ter pago um centavo sequer à União desde 2002, que o estoque da dívida seria o mesmo de hoje.
Diante deste quadro, como o senhor avalia a necessidade de instalação de uma CPI para investigação da dívida paulista na Alesp, conforme proposto pelo deputado Raul Marcelo?
A criação de uma CPI para a investigação da dívida do Estado de São Paulo é bastante necessária, para se apurar não somente as altas taxas de juros e índices que a inflaram, mas também para se apurar a origem obscura de tais débitos que posteriormente foram simplesmente assumidos pelo governo federal, sem nenhuma auditoria.
O resultado é que, em 2009, o Estado de São Paulo pagou nada menos que R$ 8,7 bilhões de juros e amortizações da dívida interna.
Nesta próxima quarta feira, dia 10/2, a CPI da Dívida na Câmara dos Deputados retoma seus trabalhos, e fará uma Audiência Pública exatamente sobre o tema da dívida dos estados.
Chamamos todos os movimentos sociais brasileiros a estarem presentes nesta e nas demais sessões da CPI, de modo a participarmos deste importante momento, onde finalmente o tema “tabu” da dívida pública tem sido amplamente discutido.
Entrevista publicada no site do deputado estadual Raul Marcelo – PSOL/SP