Por Roberto Robaina – Presidente do Diretório Estadual do PSOL/RS
Estive no debate dos pré-candidatos do PSOL no Rio de Janeiro. Entre as distintas análises que serão feitas deste momento de disputa dos rumos do PSOL e de escolha do seu representante para o pleito nacional, tenha certeza de que pelo menos uma questão todas terão em comum: foi impressionante, e tremendamente positivo – e para a maioria das pessoas surpreendente – a grande participação da militância.Foi uma demonstração da força do PSOL do Rio de Janeiro, expressa também no mandato do deputado Marcelo Freixo e nas recentes filiações do músico Marcelo Yuka e do ex BBB Jean Willis. O auditório do Sindicato dos Previdenciários, no belo bairro da Lapa, estava lotado. O ar condicionado não deu conta. Foram mais de 500 militantes que em plena véspera de feriado carnavalesco – e no Rio já de fato em carnaval – compareceram e escutaram atentamente os três pré-candidatos, Plínio, Babá e Martiniano pela ordem das exposições. Antes deles, o mediador Leo Lince convocou as forças de cada candidatura a destacar um integrante para apresentar e defender seu pré-candidato. Plínio foi apresentado por Milton Temer, Babá pelo sindicalista de São José dos Campos, o químico Cabral, e Martiniano por Heloísa Helena.
Heloísa usou a palavra e logo disse que não aceitou a oferta que lhe fizeram para que ela falasse na condição de presidente porque neste caso era especialmente importante que ela deixasse absolutamente claro que tem lado na disputa: a defesa do nome de Martiniano. Não queria, portanto, falar em nome de todos. Queria defender Martiniano Cavalcante. De minha parte creio que foi o ponto mais alto e mais significativo de toda a discussão. Afinal, e já começando uma análise política do que está em discussão, Heloísa Helena sabe que esta batalha interna expressa uma luta para dar continuidade e desenvolver o trabalho iniciado com a fundação do PSOL. Defender o caráter fundacional do partido foi o principal motivo de sua clara opção por Martiniano.
Vou pedir que você me acompanhe neste texto se estiver interessado nos rumos do PSOL. Afinal, é isso que está em discussão, embora este debate nem começou agora nem vai se encerrar na Conferência eleitoral nacional, independente de qual seja o seu resultado. Sobre o debate iniciado no RJ, de minha parte não tenho dúvidas de que Martiniano fez a melhor exposição. O mais contundente, o mais firme, o que se demonstrou com mais condições de representar o acúmulo programático e político do PSOL. Demonstrou ser quem melhor pode nos representar nos programas e, sobretudo, nos debates de TV, que será o momento mais alto da participação do partido no pleito nacional. Que fará uma campanha com condições de “peitar” Dilma e Serra e divulgar a legenda do PSOL.
Dito isso, acrescento o que é óbvio: todos os representantes das pré-candidaturas vão dizer que seu candidato ganhou o debate. Este roteiro também eu cumpro à risca. Afinal, todos que me conhecem sabem que estou entre aqueles que participam da vida do partido expressando e defendendo posições, não me escondendo ou dissimulando ideais. Por isso faço uma sugestão a todos e todas camaradas psolistas: assistam o vídeo, acessem no you tube (e creio que nestas horas já podem encontrá-lo também no site da camarada Luciana Genro, com que embarquei de Porto Alegre para juntos presenciarmos este primeiro debate de preparação da conferência eleitoral do PSOL). Então, assistam as exposições e tirem suas próprias conclusões.
Para sustentar a minha, me apoio não apenas no debate de ontem. Penso também que a carta aberta que Martiniano apresentou a todos e todas militantes do partido mostra que ele está melhor preparado. Trata-se de um documento político que ordena corretamente as tarefas da campanha nacional do PSOL. Peço que todos os militantes leiam com atenção este excelente documento e leiam também os documentos de lançamento dos outros dois pré-candidatos. Nestes textos mais do que em qualquer outra forma cada um terá ótimas condições de escolher o melhor caminho para o partido. De minha parte estou com Heloísa Helena.
Acreditando que todos acessaram o vídeo, não vou resumir nenhuma fala e me detenho apenas em considerações de algumas questões. Uma questão me chamou a atenção. Os dois candidatos que entraram na discussão, na polêmica, que na sua fala deixaram claro que propostas representam foi Babá e Martiniano. Babá passou o tempo todo atacando o PV e a direção do PSOL, acusando a direção do Rio de Janeiro de burocrática e responsabilizando a candidatura de Martiniano como responsável de todos os problemas do partido. Seu centro, como, já disse, foi atacar a possibilidade que havia se aberto de apoiar Marina casa ela aceitasse ser uma candidatura de enfrentamento à polarização conservadora do PT e do PSDB. Mas na fala de Babá não existiu nenhuma análise da correlação de forças, do peso do governo, da situação da economia real, das experiências dos governos latino americanos de Evo Morales e Chavez. Nenhuma palavra.
Mas o que me chamou atenção foi que Babá se dedicou a atacar a pré-candidatura de Martiniano. Parecia, sinceramente, uma candidatura encomendada para que Plínio falasse sobre o humano e o divino e não entrasse na polêmica real enquanto Babá mostrava, supostamente, as garras do combate. Digo supostamente porque a intervenção do Babá ficou nisso: ataque a Marina, como se esta questão já não estivesse resolvida. Mas quando me revelo surpreso é pelo fato de que Babá pessoalmente, dias antes do debate, havia me dito que não gostaria de polemizar com Martiniano. Me disse que respeitava muito Martiniano, que havia fundado o PSOL junto com ele e que a candidatura que ele considerava inaceitável era a candidatura de Plínio pelo fato de Plínio – com todo o respeito que merece – não representar este acúmulo da fundação. Estes eram os argumentos de Babá. Argumentos, inclusive, que segundo ele justificavam o lançamento do seu nome. Não foi isso o que ele disse no debate. Revelou-se, mais uma vez, como orgulhosamente reivindica, um homem de corrente. Neste caso a CST, que tem como centro atual de sua tática interna atacar o nome de Heloísa Helena e que tem como definição de que a direção do PSOL tem uma maioria reformista que deve ser derrotada.
Assim, com a fala de Babá, percebi que a primeira expressão pública da campanha de Babá pode ter sido o seu início e o seu final ao mesmo tempo. Se Babá sustentar sua campanha com base nos argumentos que ele dizia que o motivaram a lança-la, então seu nome sairá fortalecido independente do resultado numérico da votação. Se sua campanha seguir na linha da CST – que até agora fez de tudo para isolar o nome de Babá – tudo indica que seu nome será no final retirado da disputa e sua função pró-Plínio revelada neste primeiro debate se desdobrará na derrota política de Babá que aceitará se anular como líder público em nome de ideias marcadas pelo dogmatismo e do sectarismo. Estas nas mãos de Babá decidir esta questão.
Na sua intervenção Martiniano corretamente tentou sintetizar sua carta ao partido. Reivindicou que foi correta a tática de abrir negociações com Marina e disse que esta política foi a expressão da velha política das cartas abertas e de exigências preconizadas por Lenin. Disse que esta política é a que nos permitirá no debate de TV dizer claramente para Marina uma ideia que transcrevo livremente “ Marina, nós do PSOL queríamos nos unir com você para construir uma alternativa ao PT e ao PSDB/DEM, mas você se recusou a esta união e escolheu se aliar ao PSDB. Por isso os que querem um país melhor, que não concordam nem com Dilma e nem com Serra devem vir juntos com o PSOL, votar no 50 de Heloísa Helena” Não há dúvida de qu
e esta abordagem nos dá força para enfrentá-la. Martiniano também defendeu a unidade com o PSTU e a Frente de esquerda. Mas não vendeu a idéia fácil de que a aliança esta resolvida. E deixou claro que nossa prioridade é a legenda do PSOL. Aliás, todos os pré-candidatos que dizem querer a aliança com o PSTU precisam começar a dizer o que estão dispostos a ceder para concretizar esta aliança. A campanha de Plínio, por exemplo, precisa dizer se vai defender que a cabeça de chapa em SP será ou não do PSTU. O que não pode é propagar algo que está longe de ocorrer, a saber, que o nome escolhido pelo PSOL é o que facilita realizar a composição ou não com o PSTU. Aliás, se fosse para dar um nome não tenho dúvida de que Martiniano, pelo seu peso interno no PSOL, teria mais condições de conduzir as negociações capazes de realizar a coligação. Mas nem isso pode garantir de antemão ter o PSTU nem o PCB ao nosso lado.
Na exposição de Martiniano, o companheiro apresentou uma crítica às declarações de Plínio na revista Carta Capital. Plínio nesta entrevista diz que o governo de Lula foi muito melhor do que o de FHC e de que Lula é um homem autêntico, que sente de verdade os problemas do povo, destacando características humanas que fortalecem a imagem de um líder de massas respeitável. Quem assistir o vídeo talvez me acompanhe na posição de que Martiniano depois de ler a citação de Plínio não desenvolveu, por falta de tempo, a conclusão fundamental, isto é, de que o candidato do PSOL não pode ser um comentarista que diz se um governo foi melhor que o outro ou se ele é amigo do Serra ou da Dilma, mas destacar o caráter nefasto do PT e do PSDB, mostrar de modo claro que precisamos de uma alternativa, de que tanto PT quanto o PSDB são projetos vinculados com os bancos, com os grandes empresários e particularmente com megaesquemas de corrupção.
Mas Martiniano foi além. Teve a ousadia de abordar temas complexos: correlação de forças entre as classes, relação da insurreição com a revolução, modelo de produção e de consumo. Infelizmente, os outros candidatos estiveram longe disso, ou os abordaram apenas superficialmente. De minha parte, embora concorde com a análise que a correlação de forças é desfavorável, tal como disse Martiniano no debate, exigindo, portanto, mais do que nunca, a política como arte para transformar a realidade, a mediação como categoria fundamental na elaboração da tática, sustento também que existem inúmeras oportunidades que estão abertas para os revolucionários. Ademais, mesmo com a correlação de forças sendo desfavorável, por conta, sobretudo, da confusão na consciência das massas, pela falta de uma alternativa política socialista e pela própria descrença na possibilidade da existência de uma alternativa, temas tocados por Martiniano, estamos num momento muito mais favorável do que outros momentos da história.
A classe trabalhadora e a humanidade, por exemplo, derrotaram o nazismo. Depois disso, foi pela ação da classe trabalhadora que inúmeras reformas sociais foram conquistadas na Europa e aqui, na nossa América Latina, foram os trabalhadores os sujeitos sociais fundamentais da derrota das ditaduras militares genocidas. Agora, também em nossa América Latina, os trabalhadores e as classes médias empobrecidas conquistaram governos nacionalistas e democráticos na Venezuela e na Bolívia, mostrando que surgiu uma corrente nacionalista revolucionária que não se via no continente desde a revolução cubana. Estes governos não existiriam sem a combinação de conquistas democráticas e levantes de massas, inclusive insurreições populares. Baixado a terra para o Brasil, a própria possibilidade do PSOL, na esteira do acúmulo de três décadas da esquerda que a própria existência do PSOL não permitiu que se perdesse de todo, mostra que a correlação de forças, embora desfavorável, nos coloca brechas para atuar e crescer, fortalecendo um polo socialista. Heloísa Helena segue sendo a personificação e símbolo deste acúmulo, não o único, mas o principal. Martiniano, aliás, é o único pré-candidato que percebe a importância desta liderança que conecta o PSOL hoje com a possibilidade de realmente disputar as massas e, portanto, de se colocar como alternativa de luta pelo poder.
Finalmente, a crise econômica capitalista mostra que, apesar da continuidade da defensiva das ideias socialistas, o capital também está deslegitimado – ou se deslegitimando -como modo de produção capaz de reproduzir a sociedade em constante progresso material. Traz cada vez mais desigualdade e destruição. A crise iniciada em 2007 apenas está dando seus primeiros passos e abriu, provavelmente, todo um período histórico novo capaz de recolocar a ofensiva socialista na ordem do dia. É óbvio que isso não se desenvolverá sem partido e sem política concreta que parta da análise concreta da situação e concreta e da relação de forças entre as classes. Martiniano teve a ousadia de entrar nestes temas. Vamos todos seguir desenvolvendo-os. No que diz respeito à política, Martiniano reafirmou a importância da luta contra a corrupção. Plínio, mais uma vez, não disse nada sobre isso. Parece desconhecer a vida do PSOL gaúcho que se fortaleceu em 2009 por ser o campeão da luta contra o governo corrupto do PSDB. Parece desconhecer a importância do PSOL do Distrito Federal, que com a direção de Enrique Morales, Toninho e Maninha, esteve na linha de frente do combate contra Arruda, o que fortaleceu o PSOL no Distrito Federal e nos abriu novas oportunidades. Martiniano mostrou não desconhecer a importância destas políticas.
Para finalizar quero comentar uma metáfora feita por Plinio acerca da correlação de forças entre as classes, aliás a única abordagem que fez sobre o assunto. Plínio bem humorado fez a metáfora da experiência com ratos que correm atrás de um queijo colocado a frente deles e que, justo na hora em que o queijo vai ser agarrado, o pesquisador tira o queijo e o rato se frustra. O rato tenta uma vez, quando vai pegar o queijo , o queijo é tirado. Na segunda, idem. Na terceira, idem. Na quarta, o queijo é posto na frente para que o rato corra para pegá-lo, mas o rato já não se mexe mais, desiste de ir atrás do queijo. Na metáfora o povo seria o ratinho, depois das frustrações que viveu ao longo dos últimos anos, a maior delas com Lula. De fato ocorreram muitas frustrações. De fato o povo esta desmobilizado. Mas acho infeliz a comparação com os ratinhos porque despreza um fenômeno fundamental: a consciência das massas populares. Muitas vezes quando os pés não estão andando muito a cabeça está tirando conclusões. Mas a desconsideração de Plínio pela consciência revelada nesta metáfora ( que se expressa também na pouco importância que Plínio atribui à luta contra a corrupção como elemento de desenvolvimento da consciência de classe) tem uma expressão mais grave: sua falta de compreensão acerca da importância do partido, em particular do PSOL
Não é uma questão de honestidade deste militante de 79 anos que milita mais do que muitos jovens de 29, sendo neste sentido um exemplo. Respeito Plínio como militante. Por isso também respeito suas ideias. Mas respeitar não quer dizer concordar, necessariamente. Plinio entende a recomposição da esquerda como um processo horizontal onde o PSOL é uma parte, mas não necessariamente a parte dirigente. Nós pensamos que o PSOL tem a vocação para ser a parte dirigente e sem o protagonismo do partido como central não há como – pelo menos neste período histórico – uma recomposição que realmente se efetive e coloque a luta pelo poder como luta central, em torno do qual o rumo do país se decide. Por isso em muitos dos seus artigos recentes escritos na Folha de SP, Plínio sequer se apresentava como militante do PSOL, se apresentando apenas como ex-deputado federal do PT. Por isso creio que no fundo Plínio n
ão entende a importância da campanha chamando o voto na legenda do PSOL. E não é uma importância apenas eleitoral, que por si só já seria justificável. E para fortalecer a sigla do partido, para fortalecer o partido como carro chefe das lutas sociais, como condutor, como partido dirigente da classe trabalhadora e do povo pobre na defesa das suas demandas imediatas e em sua mobilização permanente até a conquista de um governo revolucionário dos trabalhadores e do povo.