Pronunciamento do deputado federal Chico Alencar, dia 17 de dezembro de 2009 na Câmara dos Deputados.
Chega ao fim, em Copenhague, a 15ª Conferência da Convenção sobre a Mudança do Clima, COP-15, que as Nações Unidas instituíram na Cúpula da Terra, no Rio, há 16 anos. Os pífios resultados revelam a irresponsabilidade dos que se julgam donos do mundo, gerentes do sistema da ganância. O clima, bem comum ainda gratuito, não merece deles os cuidados que os bancos, por exemplo, sempre têm…
Está em jogo a própria sobrevivência dos seres humanos na Terra. As emissões de dióxido de carbono são hoje 30% mais altas do que na época em que a Convenção sobre a Mudança do Clima foi firmada. Chegamos a 430 partes por milhão de CO2 na atmosfera, ultrapassando em muito o limite de 350 partes por milhão que os cientistas dizem ser o limite para evitar alterações climáticas. No ritmo atual de crescimento, elas poderiam mais do que triplicar até o fim do século, o que significa 50% de risco de que a temperatura global suba 5°C. Com o aquecimento global teremos impactos nos biomas, comprometendo a forma de vida das populações que os habitam. Espera-se maior incidência de secas, enchentes e furacões.
Na contramão dessas preocupações, a Câmara dos Deputados aprovou, na noite de 16/12, um projeto que facilita licenças ambientais, pode ampliar áreas de desmate e enfraquece o Ibama e o Conama. Os ruralistas, os empreiteiros, com o surpreendente apoio do PC do B e do PT – quem te viu, quem te vê… – foram vitoriosos. Um absurdo contra o qual só nós, do PSOL e do PV, nos insurgimos!
No Brasil, segundo estudiosos da UFRJ, USP, Unicamp e Embrapa, mantidas as condições do atual modelo econômico, até o fim deste século a Amazônia sofrerá perda de 40% da cobertura florestal da área sul-sudeste-leste, que se transformará em savana. O rio Amazonas terá redução da sua vazão em até 30%, o rio Paraná em 53% e o rio São Francisco minguará 70%. No Nordeste, cuja temperatura aumentará até 8ºC, é prevista uma diminuição das chuvas entre 2 e 2,5 milímetros por dia até 2100! Isso afetará todo o país – lar de um quinto das espécies do planeta, espaço da maior biodiversidade da Terra.
Os habitantes dos países ricos são os que mais emitem gases de efeito estufa – um australiano emite 5 vezes mais que um brasileiro. Enquanto 1,6 bilhão de pessoas no mundo estão excluídas do acesso à eletricidade – vale dizer, à saúde e à educação – os norteamericanos consomem 1/4 da energia mundial. Os 50 países mais pobres do mundo são responsáveis por apenas 1% das emissões de gases, no entanto são os mais afetados. Mary Robinson, que foi alta-comissionária de Direitos Humanos da ONU, estima em 300 mil as mortes relacionadas às mudanças climáticas em 2008, entre eles os atingidos pela desertificação na Etiópia e no Quênia.
Ela defende a criação de um fundo para o financiamento de ações de mitigação e adaptação para os países pobres e os ditos “emergentes”, que serão equipados para fazer a transição para uma economia de pouco carbono.
A Conferência de Compenhague tem dificuldade de dar uma resposta contundente ao risco de aquecimento, pois os representantes dos países presentes reafirmam o sistema atual de produção e de consumo, que implica sacrificação da natureza e criação de desigualdades sociais.
Não aceitam questionar uma forma de produzir e distribuir riquezas baseada no lucro, mesmo que esse sistema coloque nossa existência em riscos. O que vale é um PIB positivo! Creem que com algumas regulações e controles a máquina pode continuar produzindo crescimento material e ganhos, como ocorria antes da crise.
Leonardo Boff, em seu artigo “Confrontos em Cophenhague”, conclama a que “voltemos à ética do cuidado, buscando o trabalho sem exploração, a produção sem contaminação, a competência sem arrogância e a solidariedade a partir dos mais fracos”.
Que forças sociais e indivíduos querem, de fato, buscar novos rumos para a Humanidade? Sem esse forte movimento da cidadania ativa, todas as resoluções de Copenhague, mesmo que tímidas, serão letra morta. Ecocídio.
Agradeço a atenção,
Sala das Sessões, 17 de dezembro de 2009.
Chico Alencar
Deputado Federal, PSOL/RJ