Leia abaixo o documento distribuído pela delegação do PSOL na Conferência Nacional de Comunicação (Confecom). Além de apresentar um conjunto de propostas discutidas no interior do partido, o documento alerta para os riscos da Confecom não tocar em questões centrais da democratização dos meios de comunicação em função das concessões feitas pelo governo Lula aos empresários do setor no processo de preparação da Conferência. Leia a íntegra da nota do PSOL.
Conferência para empresário ver
Após anos e anos de pressão dos movim entos sociais envolvidos com a luta pela democratização da comunicação, o governo federal finalmente convocou a Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), para dezembro de 2009, em Brasília. Porém, ao longo deste ano, pouco a pouco todas as expectativas dos movimentos sociais em relação à Conferência foram frustradas.
Desde o início do processo, o governo Lula mostrou seu compromisso em não enfrentar os interesses do capital. Na Comissão Organizadora Nacional, após muita chantagem, seis entidades representativas do empresariado se retiraram. Ainda que tenham permanecido apenas duas entidades empresariais, seus interesses seguiram sobrepondo-se aos dos movimentos sociais.
De todas as derrotas dos movimentos sociais, ao longo do processo de construção da Conferência, podemos citar aqui as regras mais nocivas. Primeiro, o setor empresarial garantiu, de antemão, uma representação de 40% dos delegados (ante 40% da “sociedade civil não empresarial” e 20% do poder público). Além dessa sobre-representação, os empresários conseguiram garantir uma proteção extra na votação dos chamados “temas sensíveis”: a regra determina uma maioria qualificada de 60%+1 voto. Isso significa que o segmento empresarial, sozinho, tem poder de veto sobre estes temas.
Depois disso, outra decisão negativa, também atendendo a chantagens dos empresários, foi a Resolução nº8 da Comissão Organizadora Nacional, que logo ficou conhecida como AI-8, em referência ao AI-5 (Ato Institucional nº5), da ditadura militar. Aquela medida impedia que as Conferências Estaduais deliberassem sobre as propostas. Desta forma, esvaziou-se o processo de debate nas bases, desqualificando o debate político e o processo de mobilização.
Em relação às propostas da sociedade civil, gostaríamos de destacar o estranhamento com que recebemos as propostas divulgadas pelo Partido dos Trabalhadores (PT). Afinal, o Partido governa o País há sete anos e, neste período, não implementou nenhuma das políticas que agora diz defender, com o claro intuito de confundir o conjunto dos movimentos sociais.
Por tudo isso, nós, do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), acreditamos que esta I Conferência Nacional de Comunicação, infelizmente, não atenderá aos anseios do movimento social pela democratização da comunicação. Ainda assim, achamos importante seguir apresentando nossa plataforma e buscando uma unidade de ação para que, ao menos, a sociedade civil saia mais forte deste processo, com condições de aumentar sua organização e conquistar vitórias no futuro.
Veja a seguir algumas de nossas propostas:
· Criação de um Plano Nacional de Comunicação que garanta a democratização da comunicação no País e a apropriação desta pela população. Este plano deve abarcar medidas como o apoio às alternativas de comunicação popular, universalização do acesso gratuito à internet, estímulo à produção de conteúdo livre e independente e à leitura crítica da mídia.
· Tornar o Conselho Nacional de Comunicação deliberativo, desvinculá-lo do Congresso Nacional para torná-lo um instrumento de controle social com participação por meio de processo eletivo de representantes da sociedade civil e do poder executivo federal, com funcionamento autônomo, deliberativo, nos moldes do Conselho Nacional de Saúde.
· Criação de um Fundo Nacional com recursos públicos previstos no orçamento da União para financiar emissoras comunitárias de rádio e televisão, veículos alternativos impressos e online e demais projetos de comunicação comunitária, livre e alternativa.
· Buscar a divisão do espectro eletromagnético (canais de rádio e TV) entre emissoras públicas, privadas e estatal. O PSOL entende que é preciso estar ao lado dos atores que defendem a divisão igualitária (1/3) para cada um dos setores e que defendem a divisão de 40% para emissoras privadas, 40% para emissoras públicas e 20% para emissoras estatais e que apenas a conjuntura poderá definir qual a melhor estratégia na Confecom, na perspectiva de caminhar para uma comunicação majoritariamente pública.
· A comunicação pública e estatal – como as TVs comunitárias, universitárias, legislativas e do judiciário – devem funcionar, no mínimo, nas mesmas condições de visibilidade que a privada. Isso significa, por exemplo, funcionar em sinal aberto e em todo território nacional.
· Fomento a iniciativas que instrumentalize a população a fazer uma análise crítica dos meios de comunicação. Para isso, incluir matéria de estudo crítico da mídia nas Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica e criação de cursos de comunicação comunitária nas universidades públicas.
· Criar mecanismos de denúncia e punição, via Conselho Nacional de Comunicação Social, da criminalização da pobreza, dos movimentos sociais e de grupos historicamente marginalizados e/ou oprimidos nos meios de comunicação.
· Efetivar um plano nacional de universalização da banda larga gratuita para todas as moradias de todos os municípios do país, em regime público e exclusivamente provido pelo estado, garantindo as condições objetivas para tal, criado via Decreto presidencial.
· Transformar espaços públicos como escolas municipais, bibliotecas e casas de cultura em pontos de mídia, equipando esses espaços com estúdios de TV, rádio e internet, para produções digitais e audiovisuais que estimulem a produção e difusão de conteúdos não discriminatórios e não estereotipados.
· Destinar uma cota dos recursos do Fundo Nacional de Comunicação para estimular a formação de comunicadores populares e a criação de veículos de comunicação nos bairros e comunidades a fim de promover a autonomia e o direito da população neste campo. O fundo será alimentado por taxação do lucro das empresas de comunicação e da venda de televisores maiores que XX polegadas.
· Revisão geral das concessões atuais da radiodifusão analisando o processo de outorga e as concessões realizadas, em processo de auditoria. Neste processo, rever também as concessões de rádios e tvs comunitárias desvirtuadas em muitos casos. Devem ser criados critérios e obrigações a serem observados pelas rádios comunitárias para a renovação das autorizações já concedidas de forma a impedir que defensores de interesses privados se encaixem na regulação.
· Defender o fim de qualquer processo de criminalização dos radiodifusores comunitários, inclusive com a entrega dos equipamentos que foram apreendidos em ações da Anatel articuladas com a Polícia Federal e anistia de todas as pessoas que são processadas por esse motivo.
· Regulamentar a proibição a monopólios e oligopólios, prevista no Artigo 220 da Constituição Federal, constituindo mecanismos para evitar a concentração horizontal (um grupo deter várias operadoras da mesma plataforma), vertical (um
grupo controlar várias etapas da cadeia – produção, programação, empacotamento, distribuição) ou cruzada. No primeiro caso, considerar, de forma isolada ou combinada, os critérios de propriedade e controle (mantendo os limites nacionais de até 5 emissoras na faixa VHF e estaduais de até 2 estações), cobertura, participação na audiência e participação no mercado publicitário. No segundo caso, proibir que um mesmo grupo privado tenha participação em mais de uma destas atividades: produção de programas, programação e distribuição/provimento. No terceiro caso, proibir que um mesmo grupo explore dois serviços diferenciados.
· Fim da publicidade estatal, com garantia da gratuidade do informe de utilidade pública.
· Financiamento público da transição para a transmissão digital dos meios de comunicação pública/alternativa.
· Regular para que a multiprogramação não seja mais um instrumento de oligopolização da comunicação no Brasil, levando a cabo a Ação de Inconstitucionalidade do decreto que regulamenta a tv digital no Brasil.
· Garantir a distribuição pública de mídias impressas dando fim à dependência em relação às empresas que monopolizam o setor de distribuição de comunicação impressa.
· Regulamentar e defender os direitos dos trabalhadores da comunicação, independentemente do local de trabalho e da atividade específica. Ela deve ser construída em processo de consulta e diálogo com a classe trabalhadora das diferentes categorias profissionais da comunicação.
· Garantir a acessibilidade nos veículos de comunicação, sendo que as organizações das pessoas com deficiência devem traçar a estratégia para isso.