Por Kate Queiroz
A Síndrome do Pequeno Poder é um problema social (contrariando o que muitos pensam ser um problema individual de desvio de caráter). Existem pessoas que a chamam de “Síndrome do Porteiro”, já refletindo a crise social onde se menospreza uma função. Mas essa síndrome bem que poderia chamar-se “Síndrome do Poder Imaginário” ou “Síndrome do Falso Poder”, pois o tal poder não existe.
Ela pode parecer inofensiva, quando esse fenômeno é presenciado em posturas arrogantes de seguranças particulares, atendentes públicos ou até mesmo de porteiros que dificultam a entrada das pessoas no estabelecimento onde se trabalha. Mas, ao olhar com mais cuidado é possível perceber que quem é acometido dessa síndrome, faz vítimas de seu comportamento. Leis como as estabelecidas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) ou a Lei Maria da Penha e a mais antiga lei do Código Penal Brasileiro (art. 129 §§ 9, 10 e 11) inibem um pouco a ação opressora da Síndrome, pois é no seio da família que é possível perceber o “pequeno poder” em ação. Pais violentos com seus filhos, simplesmente por serem pais e mais fortes (fisicamente e psicologicamente) que seus filhos, maridos por se considerarem em uma posição superior à sua parceira de “chefe” da família, patrões e patroas de funcionários domésticos ou de pequenas e grandes empresas que se sentem no direito de humilhar por pagarem um salário, policiais que por usarem fardas e serem titulados como autoridade se comportam como se estivessem acima da lei fazendo valer apenas a sua vontade, motoristas desrespeitam a lei de trânsito por se sentirem protegidos dentro do seu escudo móvel e a lista é bem grande.
Então, nota-se a presença de patologia pela existência do patriarcalismo, “adultocentrismo” e pela submissão das relações de gênero. Mas isso vai além. A Síndrome do pequeno poder também existe devido ao “brancocentrismo”, “heterocentrismo”, aqui no Brasil o “paulistocentrismo” (sensação de superioridade de paulistas em relação aos nordestinos) e o “cristocentrismo” (relação de autoritarismos sobre a liberdade religiosa das doutrinas cristãs em detrimento às de origens pagãs ou não cristã). Por isso, considerada um problema social.
Isso pode ser categorizado como uma doença de difícil cura. Ela surge desde a mais tenra idade quando a criança não é ensinada a aceitar frustrações e mais que isso, não é ensinada a respeitar o espaço do outro. Além disso, também são crianças que por algum motivo sofreram violências e na idade adulta querem descontar tudo que sofreram em quem consideram mais fracos, em quem considerem não ter poder. Como barrar o surgimento dessa mazela? Como mencionado, não é facil. Mas uma coisa que é preciso entender é que o poder humano não é ruim, pois é através dele que se constroem grandes conquistas. É através do empoderamento humano que se chega à evolução.
O problema é quando a função do poder é distorcida, quando ela é usada para destruir e não construir. Detectar esse evento logo no início seria uma forma de evitar a sua ascensão. Crianças que não lidam bem com derrotas em jogos, as que desejam sempre organizar e decidir as brincadeiras, as que deixam de brincar quando sua vontade não é satisfeita mostram um indício do mal que está por vir e trabalhar nesse momento em suas vidas terá um grande efeito positivo.
A educação não só nas escolas mas com a família é o grande remédio para a formação de adultos livres de mais esse acometimento social.
Pensando nisso, é preciso estudar políticas públicas que auxiliem nessa educação, já que se trata de um problema social, deve-se exigir do Estado providências para que a opressão se encerre em todos os setores ocupados pela população. Por que será que o porteiro é acometido dessa Síndrome? Porque por trás dele há um patrão que incentiva e reforça esse comportamento. É preciso conscientização para se conquistar a cura das vítimas desse mal.
Mais uma vez é importante ressaltar que a culpa nunca é da vítima.
*Kate Queiroz, psicóloga e militante do PSOL.