No dia 28 de janeiro de 2004, quatro funcionários do MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) foram brutalmente executados enquanto realizavam uma diligência de rotina para apurar sérias denúncias de abuso e exploração contra trabalhadores em fazendas no município de Unaí (MG) localizada a apenas 160 quilômetros de Brasília.
Dentre os mandantes da execução, estão empresários e fazendeiros, como o ex-prefeito de Unaí, Antério Mânica (PSDB), o crime que chocou o país ficou conhecido como a “Chacina de Unaí” e, segue impune até hoje. A data atualmente marca o “Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo”.
A escravidão deixou marcas indeléveis em nosso povo e história, infelizmente o trabalho escravo não é um fenômeno do passado, mas persiste em ritmo crescente no presente. De acordo com dados da CPT (Comissão Pastoral da Terra), nos últimos 20 anos, cerca de 52 mil pessoas que se encontravam em situação de trabalho análogas à escravidão no Brasil, foram libertas por fiscais do trabalho.
Quando se fala em trabalho escravo, um dos casos mais conhecidos, é o que envolve o Deputado Federal Beto Mansur (PRB), dono de uma fazenda em Bonópolis (GO). Em 2005, a revista Época noticiou que fiscais do MTE flagraram 46 pessoas, inclusive sete menores de idade, submetidos às condições análogas à escravidão nesta fazenda. Mansur foi condenado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) ao pagamento de indenização no valor de R$ 200 mil por dano moral coletivo.
Mas, por possuir foro privilegiado, seu processo foi parar no STF (Supremo Tribunal Federal), e a denúncia feita pelo Ministério Público de Goiás foi então anulada pelo ministro Celso de Mello, em 2016, argumentando que cabe ao Ministério Público Federal e a Justiça Federal investigar e julgar casos de trabalho escravo.
Trabalho escravo é crime, e traz revolta e indignação para nós trabalhadoras e trabalhadores, mas infelizmente ele não é fenômeno raro ou pontual no mundo capitalista. Dados de 2016 do “Índice Global da Escravidão” produzido pela organização Walk Free Foundation, revela que, atualmente, ao menos 46 milhões de pessoas estão em situação de “escravidão moderna”. Estima-se que no Brasil sejam 160 mil, mas sabemos que o número é maior, pois há um sucateamento dos serviços de fiscalização do MTE e muita articulação para esconder esta terrível realidade, o que torna o problema ainda mais grave.
Mulheres e meninas são as principais vítimas da chamada escravidão moderna, sendo exploradas principalmente no comércio sexual e no trabalho doméstico. Segundo a OIT o lucro com a escravidão moderna gera em torno de R$300 bilhões, 2/3 desse valor vindos da exploração sexual.
Em calculo realizado pela ONU, o comércio sexual só perde em rentabilidade para a indústria de armamento e do narcotráfico.
Outra dura realidade é o fato de que o Brasil segue em primeiro lugar na América Latina, em índices de exploração sexual, esses números crescem principalmente em grandes eventos, a exemplo do Carnaval e, lembramos da Copa no Brasil, onde as propagandas de turismo sexual foram escancaradas e divulgadas por celebridades e grandes marcas do mundo empresarial.
Além do trabalho escravo, temos um exército de desempregados e subempregados, pessoas que vivem em condições de subemprego, vidas que seguem submetidas há condições precárias, marcadas pela opressão e exploração, que certamente são a maior parte da população mundial.
No Brasil, a contra-reforma trabalhista defendida pelo governo Temer, se aprovada acarretará em perdas significativas de direitos trabalhistas e um aumento do trabalho terceirizado, precário e temporário, soma-se a isso a reforma da previdência e as PEC’s que cortam gastos em áreas sociais, tendo isto em vista, podemos vislumbrar o aprofundamento da tragédia social brasileira.
O capitalismo em tempos de profunda crise, tem dentre suas saídas, o aumento da superexploração do trabalho, aprofundando a precarização, retirando direitos e ampliando o desemprego estrutural. O Brasil vem se tornando cada vez mais um país desindustrializado, uma feitoria moderna, ao ponto de setores do empresariado abrirem uma luta política para formalizar relações trabalhistas que beiram a servidão.
Bom exemplo da ofensiva empresarial e ruralista, é o projeto de Lei nº 432/2013, que tramita no Senado, visando deturpar o conceito de trabalho escravo, retirando as modalidades de “jornada exaustiva” e “condições degradantes de trabalho” da tipificação do crime. Este projeto visa “regulamentar”a Emenda Constitucional nº 81, onde se prevê a expropriação do imóvel onde for constada trabalho escravo. No projeto o senador Romero Jucá (PMDB-RR) deixa claro o intuito de atenuar o conceito de trabalho escravo e impedir expropriações.
Outro exemplo da articulação dos fazendeiros e empresários contra o direito dos trabalhadores, e o papel central que cumpre o governo Temer para articular estes interesses, é a suspensão da divulgação da lista do trabalho escravo no Brasil, o governo descumpre ordem judicial que determina a divulgação.
Lutamos para que o combate a escravidão moderna se aprofunde, e seja erradicado. Nos conscientizemos, que para acabar com as condições precárias de vida e trabalho da grande maioria da população brasileira e mundial, precisamos de uma revolução social. Não podemos permitir que uma minoria que concentra riqueza e poder, siga submetendo toda uma sociedade a atrasos político sociais e culturais, nenhum de nós está a parte destas consequências, intensifiquemos a luta pela igualdade e justiça.
*Carla Clemente é professora de Filosofia, militante do PSOL e do “Coletivo Feminista Rosa Lilás”