Em pronunciamento, o Deputado Federal Ivan Valente fala sobre o recuo do governo quanto ao FIES. Veja o vídeo ao final do texto.
FIES: GOVERNO CEDE À PRESSÃO DA REDE PRIVADA E CONTINUA NA LÓGICA DA EDUCAÇÃO COMO MERCADORIA
Durante essa semana muito se falou na grande mídia sobre o FIES, em especial sobre a dificuldade de acesso ao sistema para solicitar o financiamento. Porém, gostaria de chamar a atenção para outro aspecto do programa e de suas recentes oscilações, que é o da mercantilização do ensino superior, com aval e financiamento do governo federal. A dupla concessão feita pelo MEC recentemente ao setor privado apenas atestam de qual lado está o atual governo.
O número de matrículas na rede privada no ensino superior só aumentou nos últimos 25 anos. Desde a década de 1990, ainda com Fernando Henrique Cardoso presidente, adotou-se uma política de incentivo e expansão desenfreada das instituições privadas. O que se assistiu foi uma inversão na responsabilidade pelo atendimento: chegamos ao início dessa década com as instituições públicas assumindo cerca de 25% do atendimento, enquanto as instituições privadas respondem por 75% das matrículas. No estado de São Paulo, a situação é ainda mais gritante: das cerca de 1,5 milhões de matrículas no ensino superior, apenas pouco mais de 246 mil são na rede pública.
A responsabilidade dessa situação é dos sucessivos governos, desde FHC, que incentivaram sobremaneira o “negócio” do ensino superior. Modelo que se agravou com a entrada das instituições no mercado financeiro, por meio da abertura de capital na bolsa de valores e a formação de grandes conglomerados que dominam os cursos superiores do país. É preciso destacar que o FIES hoje é um dos grandes responsáveis pela sobrevivência das faculdades privadas, uma vez que, segundo a própria Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior, o dinheiro do FIES pode representar de 30% a 70% do orçamento de uma instituição. Portanto, qualquer mudança realizada nesse programa afeta brutalmente as “empresas” do setor.
Desde o início do ano denunciamos que o país da “Pátria Educadora” nenhum esforço fez para mudar a lógica de mercado da política educacional que impera em nosso território há anos. Ao contrário, o corte de recursos anunciado pela Presidenta, adotando uma política de ajuste fiscal e que retirou cerca de 7 bilhões do Ministério de Educação foi uma demonstração de que os caminhos pretendidos para a área se distanciam em muito do que acreditamos ser necessário: mais investimentos na educação pública, gratuita e estatal.
Contudo, ficou claro também que os cortes de recursos não atingirão aqueles que têm ditado as regras para a política nacional: as grandes empresas. Em cerca de dois meses, o Ministério da Educação fez dois recuos em medidas que alteravam as regras do FIES, justamente por pressão do setor privado. O primeiro dizia respeito a não renovação de contratos com instituições que tivessem realizado reajustes acima da inflação. O segundo alterava a forma de repasse de cotas às instituições, proposta que ficará inócua para grandes instituições, ou seja, aquelas que atendem mais de 20 mil alunos com FIES, a
partir do ano que vem. O sobe-desce das ações desses grupos na bolsa de valores, de acordo com a pressão ou recuo do MEC, demonstram claramente que se trata de um jogo financeiro, da financeirização da educação. Enquanto a educação pública amarga condições precárias e ainda deve sofrer cortes significativos, o dinheiro que socorre as grandes empresas só aumenta: no último mandato do governo federal os recursos destinados ao FIES subiram de R$ 1,1 bilhão, em 2011, para R$13,7 bilhões em 2014 – em valores corrigidos!
Há claramente uma demanda reprimida para o acesso ao ensino superior no país, e a necessidade de altos investimentos na área pública difere absolutamente do que tem sido realizado, que é o incentivo a uma formação de baixa qualidade em uma instituição que, enquanto empresa, está absolutamente voltada para o lucro e não para o desenvolvimento comprometido com um projeto de país. Defendemos o compromisso do Estado com a universidade pública, gratuita, estatal, baseada no tripé ensino-pesquisa-extensão e que se reconheça enquanto instituição de destaque para os avanços tecnológicos, culturais, sociais e intelectuais de nosso país.
Ivan Valente
Dep. Federal – PSOL/SP