“Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados,
A política do governo Dilma para a gestão dos recursos do pré-sal e do conjunto do petróleo brasileiro tem se demonstrado inteiramente entreguista e irresponsável com a defesa da soberania nacional.
Os leilões do petróleo conduzidos atualmente pela ANP (Agência Nacional do Petróleo) representam a continuidade e o aprofundamento da política neoliberal iniciada pelo governo de Fernando Henrique Cardoso, de desnacionalização e quebra do monopólio estatal na extração e comercialização de uma das maiores riquezas estratégicas do país.
A ação do governo Dilma através da ANP – que de agência reguladora foi transformada em uma agência de negócios a serviço da privatização do petróleo nacional – contraria as forças sociais e políticas que historicamente lutaram para que o petróleo fosse nosso.
Num ato de autoritarismo e desprezo, o governo ignora todos os apelos e protestos que vem sendo realizado por diversos setores da sociedade que tem se manifestado contra os leilões do petróleo e agora, em particular, contrário ao leilão do campo de Libra – uma das maiores reservas descobertas do pré-sal.
O campo de Libras, situado na Bacia de Santos, tem, segundo estudos, uma capacidade produtiva diária de pelo menos um milhão de barris, equivalente a metade do que o país extrai atualmente. Além disso, a previsão inicial de que a Petrobrás exploraria um potencial de 5 bilhões de barris no campo de Libra, foi redimensionando após as perfurações, quando se descobriu que as reservas eram na verdade de aproximadamente 24 bilhões de barris.
Segundo Paulo Metri, conselheiro do Clube de Engenharia do Rio de Janeiro, o volume de óleo recuperável em Libra pode chegar a 15 bilhões de barris. Atualmente, as reservas brasileiras somam 14 bilhões de barris. Trata-se de uma riqueza no valor de, no mínimo, US$ 1 trilhão que pode parar nas mãos de empresas estrangeiras.
Nesta perspectiva, o leilão do campo de Libra é um ato inédito na história do petróleo mundial, em que um país resolve leiloar o petróleo já descoberto! Com o agravante de ter na Petrobrás, empresa estatal de petróleo, toda a capacidade de lidar com a gestão deste recurso.
Frente às denúncias de espionagem praticadas pelas agências de inteligência norte americana (NSA e CIA) contra a Petrobrás, o que já era um absurdo (a entrega do campo de Libra), tornou-se escandaloso!
A disposição do governo em aprofundar o entreguismo é tamanha, que nem após os atos de espionagem – que podem ter resultado no acesso a informações comerciais e geológicas estratégicas sobre as reservas do pré-sal – há disposição da ANP ou da presidente Dilma em suspender o leilão de Libra.
Um conjunto de movimentos sociais e centrais sindicais – CUT, CGTB, CTB, Federação Única dos Petroleiros (FUP), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) – lançaram um manifesto nas redes sociais, intitulado “Não ao Leilão de Libra”.
Neste documento os movimentos alertam para o fato de que “não bastasse o conjunto de irregularidades que está contido nesse leilão – como, por exemplo, passar por cima dos fundamentos da lei de partilha (nº 12.351) aprovada pelo Congresso Nacional -, a espionagem da agência estadunidense NSA sobre a Petrobras transformou o leilão em jogo de carta marcada, favorável às transnacionais. Isso é um verdadeiro atentado contra a soberania nacional, o desenvolvimento do Brasil e o futuro de nosso país”.
A Federação Única dos Trabalhadores – FUP destaca que “ao permitir que as multinacionais se apropriem do petróleo brasileiro, o governo coloca em risco não só a soberania, como o desenvolvimento do Brasil. Essas empresas, além de exportar tudo o que produzem, não geram empregos aqui, nem movimentam a indústria nacional, como faz a Petrobras. Segundo o Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval), dos 62 navios feitos pela indústria de petróleo, 59 são da Petrobras e três da PDVSA (estatal venezuelana). Ou seja, nenhuma petrolífera privada encomendou navios no Brasil”.
Concordamos inteiramente com a análise da FUP, que do ponto de vista das relações de trabalho acrescenta que“a privatização do petróleo é quase um sinônimo para a terceirização do trabalho, já que empresas como Statoil, Shell, OGX, Chevron, entre tantas outras que abocanharam jazidas de petróleo ao longo dos 11 leilões realizados desde o governo FHC, quando foi quebrado o monopólio estatal da Petrobras, não contratam trabalhadores próprios e, ainda praticam absurdos, como a falta de treinamento necessário para que estes trabalhadores exerçam suas atividades nas plataformas e, em outras unidades operacionais, de forma digna e segura”.
Um dos casos concretos de precarização do trabalho citado pela FUP citados é o da OGX: “Os leilões de petróleo estão rebaixando as condições de trabalho no Brasil. Na OGX, por exemplo, dos 6.500 trabalhadores contratados, 6.200 são terceirizados. Os 300 que são próprios só atuam praticamente em áreas administrativas”.
A decisão do governo em adiar sua visita aos EUA em outubro em função das denuncias de espionagem contra a presidente Dilma, não encontram correspondência em relação ao leilão do campo de Libra, após denúncias de espionagem contra a Petrobrás.
O leilão de Libra está mantido pelo governo em razão de um cálculo econômico de curto prazo, e sem qualquer consequência estratégica. Diante do baixo dinamismo da economia brasileira e do menor fluxo de dólares no país, o governo pretende com o leilão de Libra atrair dólares no curto prazo com o objetivo de manter equilíbrio das contas externas.
Esta opção não apenas enfraquece a Petrobrás como também transfere, em nome do curto prazo, a riqueza da exploração de Libra no médio e longo prazo para o capital internacional. O argumento do governo é que não disporia dos recursos necessários para desenvolver o campo de Libra, estimados entre US$ 50 ou 60 bilhões.
Uma desculpa esfarrapada que pode ser facilmente contestada se olharmos para o tamanho da despesa do governo com o pagamento dos juros da dívida pública. Somente em 2013 o governo comprometerá 42% do orçamento da união o pagamento de juros e amortizações da dívida pública, num montante de 900 bilhões de reais. Mais do que suficiente para desenvolver o campo de Libra com exploração exclusiva da Petrobrás.
Na opinião de Ildo Sauer (professor titular e atual diretor do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP), um dos maiores especialista em petróleo no Brasil, o investimento inicial que o governo diz não ter poderia também ser resultado de parcerias com outros países, através de antecipação de investimentos.
Segundo o professor, “Havia uma alternativa mais inteligente para resolver o problema macroeconômico: contrata-se a Petrobras, que delimita o campo de Libra e produz. Ah, faltam US$ 50 ou 60 bilhões para desenvolver o campo. Faz parceira internacional negociada politicamente a partir do governo. Chama a China, eventualmente a Índia e outros parceiros, e investe, produz e controla o ritmo de produção. Em contrapartida, a China recebe o petróleo a 80 ou 90% do preço internacional e antecipa o dinheiro do investimento, coloca no Brasil o dinheiro necessário para equilibrar as contas externas”.
Nas estimativas do professor Ildo Sauer, “Libra vai produzir cerca de dois milhões de barris por dia, 700 milhões por ano. Se vender o petróleo a US$90 por barril e custar US$20 para produzir, sobram US$70 por barril. São US$50 bilhões por ano que estão em jogo, ao longo de 20 anos de produção, supondo que as reservas sejam de 15 bilhões de barris, como esperado. Com US$50 bilhões por ano você mantém as contas externas com afluxo de US$10 ou 15 bilhões em moeda, os outros US$35 ou 40 bilhões usa para investir em infraestrutura”.
O professor faz ainda outras sugestões interessantes no campo da infraestrutura, combatendo a ideologia vendida pelo governo de que sem as concessões e privatizações o país não teria condições de promover investimento nesta área.
Na proposta de Sauer, os recursos do pré-sal, se mantidos sobre controle nacional através da Petrobrás, “Criaria a Metrobras que seria a dona e operaria os metrôs de todas as cidades com mais de 500 mil habitantes no país. O Brasil poderia estabelecer uma parceria com a China que estabeleceria fábricas de trens no Brasil. Essa espécie de escambo não danificaria o equilíbrio da taxa de câmbio. E nessa escala, os recebíveis do próprio sistema de transporte garantiriam o financiamento. Eu estou dando um exemplo. O mesmo podia acontecer para trens de alta velocidade interestaduais, portos, vias navegáveis. Esse seria o modelo para o pré-sal em geral, não só Libra”.
Há, portanto um amplo debate que o governo Dilma se nega a fazer com a sociedade brasileira, sobre a importância de preservarmos a soberania do país no controle das riquezas do pré-sal e de que forma estes recursos devem ser utilizados, também pensando nas gerações futuras.
O povo brasileiro, se consultado, jamais abriria mão de seu próprio futuro, jamais concordaria com a entrega de suas principais riquezas estratégicas.
Não ao leilão do campo de Libra. O petróleo tem que ser nosso, do povo brasileiro!
Muito obrigado.
Ivan Valente
Deputado Federal PSOL/SP