Documento foi aprovado no 1º Seminário Nacional do Setorial de Direitos Humanos do PSOL, realizado em agosto. Partido repudia criminalização dos movimentos sociais e da classe trabalhadora
Do site do PSOL Nacional, Leonor Costa
Num momento em o país assiste pela TV e lê nos jornais os abusos praticados pela Polícia Militar nas manifestações realizadas no último 7 de setembro, em várias capitais, a resolução aprovada no 1º Seminário do Setorial de Direitos Humanos do PSOL, promovido nos dias 16, 17 e 18 de agosto, em São Paulo, está mais do que atual. A resolução pede a desmilitarização da segurança pública e o fim das polícias militares. O texto, sem dúvida alguma, ajudará nos debates sobre as manifestações dessa semana e a forma como o Estado reagiu, o que provaram a importância do tema e a urgência dessas mudanças.
No último sábado foi grande o número de manifestantes e de profissionais da imprensa, entre repórteres fotográficos, cinematográficos e de texto, vítimas da truculência da PM. Spray de pimenta, gás lacrimogêneo, bombas de efeito moral e até cães foram as armas utilizadas pelos militares para dispersar as manifestações e impedir o trabalho daqueles que estavam lá para mostrar ao país os protestos no dia da “Independência”.
Pelas ações vistas nos telejornais, nas fotos e nos vídeos que circulam nas redes sociais, ficou nítido o real papel da polícia como braço armado do Estado para conter a liberdade de expressão e o direito de se manifestar dos que não estão de acordo com os rumos das políticas implementadas no país.
A resolução do Setorial de Direitos Humanos do PSOL coloca o dedo nessa ferida e dá rumo ao urgente debate, ao afirmar que o militarismo na segurança pública impõe violações cada vez maiores ao povo, em especial à juventude pobre e negra das periferias do Brasil, exterminando, torturando e encarcerando a população mais oprimida. “Os movimentos sociais estão na mira da criminalização, que agora se objetiva regulamentar através da lei antiterrorismo que se quer aprovar no Congresso Nacional, buscando uma justificativa mais geral para classificar como inimigos do Estado aqueles que lutam, inclusive tratando a autodefesa como vandalismo”, afirma o Setorial de Direitos Humanos.
O PSOL propõe, na resolução, a desmilitarização da polícia e o controle popular da política de segurança pública. “A desmilitarização da segurança pública implica necessariamente na desvinculação constitucional das polícias como instituições auxiliares das forças armadas, no fim das polícias militares e dos estatutos militares que organizam as polícias de forma extremamente hierárquica e autoritária”, pontua.
Confira abaixo a íntegra da resolução aprovada no Setorial de Direitos Humanos do PSOL.
Resolução pela desmilitarização da segurança pública e o fim das polícias militares
O modelo militar de segurança pública foi constituído e programado na afirmação primeiramente de uma estrutura social que escravizou e reprimiu negros e indígenas; na ditadura Vargas, criminalizou movimentos de trabalhadores organizados sob uma ótica anticapitalista e aqueles que não se enquadravam em uma suposta “ética institucional do trabalho”; e dramaticamente na ditadura civil-militar de 1964.
O golpe militar, sob a orientação dos EUA e da Doutrina de Segurança Nacional, resultou em um dos piores períodos da história do Brasil, redundando na perseguição, tortura e morte de trabalhadores da cidade e do campo, indígenas e militantes que se insurgiram contra a ordem violenta e ilegal imposta.
Nesse período, consolidou-se uma doutrina de guerra, que se impôs na prática cotidiana, elegendo o dissidente como inimigo do Estado. Em um regime criado para proteger os interesses do capital, o inimigo óbvio é o povo, a classe trabalhadora e todos aqueles grupos que em sua forma de vida e organização social se contrapõem à burguesia. Por isso, um processo de desmilitarização cultural e político dependerá do resgate da memória, verdade e justiça desse período estruturante da repressão policial no país.
Nos dias de hoje, o militarismo na segurança pública impõe violações cada vez maiores ao povo, em especial à juventude pobre e negra das periferias do Brasil, exterminando, torturando e encarcerando a população mais oprimida.
Na última década, foi desenvolvida uma política de segurança pública baseada no combate às drogas, de tolerância zero às pequena ilicitudes e “desordens urbanas”, ampliando o encarceramento em três vezes em comparação com a década anterior. O Brasil ocupa o 4º lugar em encarceramento no mundo.
Nesse momento, em decorrência dos interesses do capital em relação à terra e à reestruturação da cidade, que se efetiva através do agronegócio, megaeventos, megaempreendimentos, incluindo a economia do pré-sal, a estrutura punitiva se sofistica ainda mais, se utilizando de alta tecnologia e criando precedentes “legais” e inconstitucionais para a sua atuação.
Os movimentos sociais estão na mira da criminalização, que agora se objetiva regulamentar através da lei antiterrorismo que se quer aprovar no Congresso Nacional, buscando uma justificativa mais geral para classificar como inimigos do Estado aqueles que lutam, inclusive tratando a autodefesa como vandalismo. O exemplo da repressão policial à jornada de lutas de junho ilustra o interesse das elites políticas e econômicas em manter inquestionável o modelo dos megaeventos e megaprojetos.
Nesse contexto, é que as ruas clamam pela desmilitarização da polícia. Coerente a este grito pela liberdade, o PSOL propõe a desmilitarização da polícia e da política, bem como propõe o controle popular da política de segurança pública. O PSOL repudia qualquer forma de criminalização da classe trabalhadora, por meio de institutos como a Lei Geral da Copa e seus tribunais de exceção e a lei antiterrorismo.
Entendemos que a desmilitarização da segurança pública e do próprio Estado brasileiro passa irrefutavelmente pelo fim da guerra às drogas, que na prática se traduz em um processo de criminalização da pobreza, no megaencarceramento de uma população considerada descartável e em um verdadeiro genocídio das juventudes das periferias, sem qualquer êxito na redução do tráfico e comércio varejista de drogas. Processo este que é garantido a partir da montagem de aparatos com armas e treinamento bélicos. Sem dúvida, não ocorrerá a redução da violência institucional sem a legalização e regulamentação da produção, comércio e uso das drogas.
A desmilitarização da segurança pública implica necessariamente na desvinculação constitucional das polícias como instituições auxiliares das forças armadas, no fim das polícias militares e dos estatutos militares que organizam as polícias de forma extremamente hierárquica e autoritária. É fundamental instituir o direito à sindicalização e greve dos profissionais da PM, assim como extinguir a Justiça Militar.
É crucial também desvendar o falso controle exercido pelas atuais Corregedorias. Somente haverá fiscalização e apuração dos crimes cometidos pelas corporações policiais se garantido o controle popular e independente sobre as polícias. Sem controle externo, não haverá avanço nas investigações contra agentes de segurança. Ressalta-se também a importância do Ministério Público cumprir sua prerrogativa de fiscalização das polícias, o que nem de longe é feito.
Imprescindível é reformular a estrutura e conteúdo da formação dos agentes de segurança pública, que devem estar centradas nos direitos humanos, na
mediação, na redução de danos, sob uma perspectiva de preservação da integridade e liberdade das pessoas.
O Estado brasileiro precisa ser desmilitarizado. A segurança pública tem que ser desmilitarizada. A Polícia Militar deve ser extinta. Os presídios não podem mais funcionar como estruturas voltadas para pessoas consideradas desprovidas de direitos, como se fossem prisioneiras de guerra. As armas de guerra são inadequadas para a segurança interna. As armas menos letais devem ser abandonadas como instrumentos de repressão ao legítimo direito de manifestação. Chega de Amarildos e manifestações sitiadas! Chega de guerra aos pobres!
Publicado no site nacional do PSOL