Nascido da costela do PT, o pequeno Psol lembra hoje em muitos aspectos o partido de Lula e Dilma nos anos 80. Seu estatuto é tão radical que não aceita alianças com siglas de outros espectros além da chamada esquerda ideológica.
Brasil Econômico – Pedro Venceslau 26/07/12 09:56
Como doações de empresas são vetadas, as campanhas são financiadas com os parcos recursos das doações de militantes e da venda de camisetas.
No campo programático, o partido defende bandeiras como estatização da Vale e de outras empresas estratégicas. Mas apesar de insistir em um discurso que parece congelado no tempo, o Psol conseguiu ganhou notoriedade na opinião pública ao se transformar no mais barulhento partido do Congresso Nacional nos debates sobre ética.
Não por acaso, muitos de seus candidatos em 2012 aparecem bem colocados nas pesquisas. Ex-petista, o deputado paulista Ivan Valente é o terceiro entrevistado da série do Brasil Econômico com os presidentes dos principais partidos políticos brasileiros.
Se o Psol chegar ao poder um dia no Brasil, haverá uma onda de estatizações?
O Psol tem a posição que setores estratégicos da economia têm que ficar na mão do estado. Isso é uma alavanca do desenvolvimento e da distribuição de renda. A Vale é estratégica. O subsolo brasileiro está em jogo. Quando a Vale quase se fundiu com uma mega multinacional chamada Xtrata, ela teria desnacionalizado o centro de decisões. A Ambev, hoje, é desnacionalizada.
Acha que a Ambev deveria ser estatizada?
Não, pois não é um setor estratégico. Mas eu defendo a reestatização da Vale.
O que diferencia o PT do PSDB?
O PT ainda preserva uma ligação muito maior com os setores populares, algo que o PSDB nunca teve. O PSDB foi incompetente. É um partido da elite brasileira. Não foi capaz de fazer um “Bolsa Família” ou melhorar o salário mínimo.
Mas os dois partidos seguem a mesma política econômica. O governo Dilma usa o BNDES como instrumento de ativação da economia emitindo títulos públicos e aumentando a dívida pública. O governo Dilma continua gastando 47% do orçamento pagando juros, amortizações e rolagens da dívida.
O Psol hoje é o PT dos anos 80?
O partido resgata o programa democrático e popular da década de 80 e os princípios que nortearam a formação do PT: a participação popular, a igualdade social e os cuidados para não se contaminar com os vícios da política. Entre eles, o principal é o financiamento privado de campanha, por exemplo.
Nas grandes questões da política do país, o Psol se posiciona de maneira diferenciada. Veja o Código Florestal, por exemplo. E tem a Lei Geral da Copa. Querem transformar o Brasil em um protetorado da Fifa. Só o Psol votou contra. Fomos nós que propomos a CPI da Dívida Pública. Isso é um tabu da política econômica brasileira. Podemos dizer que o PT foi muito importante na década de 80, mas perdeu sua essência. A defesa na ética na política acabou ficando com o Psol.
Vi que o senhor comemorou muito nas redes sociais os resultados das primeiras pesquisas de opinião da eleição 2012…
Os resultados foram bons para o Psol, que é um partido novo, de apenas sete anos. Na eleição municipal de 2008, éramos um partido em constituição. Em Belém, estamos disparados em primeiro lugar com o Edmílson (Rodrigues). Ele foi prefeito por oito anos.
Em Macapá, o Clécio Luís, que é nosso vereador e tem apoio do nosso senador Randolfe Rodrigues, está em empate técnico com o prefeito. E no Rio de Janeiro, o Marcelo Freixo está em segundo lugar com dois dígitos.. Ele está ganhando amplos setores formadores de opinião e tem potencial de subir ainda mais.
Existem muitos dissidentes petistas aderindo ao Psol na campanha?
O Psol tem condições de arrastar uma parte grande do eleitorado petista que está insatisfeito. Um número grande de militantes petistas já aderiu à candidatura do Freixo no Rio. Assim como no PDT tem muita gente insatisfeita com o “blocão” que apoia o Eduardo Paes.
Em Fortaleza, o Psol também está muito bem. Estamos com candidatura na cabeça em 23 das 26 capitais. E disputamos em mais de 500 cidades. O partido ainda é pequeno e precisa aumentar sua capilaridade, mas tem imensa respeitabilidade na sociedade. No Rio, o Freixo está sendo apoiado amplamente por todos os artistas ligados a Globo e cantores: Chico Buarque, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Djavan…
Como está o processo do vereador do Psol de Goiânia que apareceu nas gravações da Polícia Federal no caso Cachoeira? Isso não maculou a imagem do partido?
O fato de o nosso vereador ter sido citado gerou uma reação imediata do partido. A Comissão de Ética está investigando essa situação. Já foram feitas duas reuniões e ele será ouvido pela CPI. O Psol vai se pronunciar.
Uma ex-militante do Psol acusou o partido de blindar esse vereador na CPI…
Essa ex-militante fez acusações infundadas e está sendo processada por isso.
Como o Psol faz para ser competitivo sem arrecadar recursos privados?
O partido tem muito trabalho voluntário, generoso e consciente, como o PT já teve. Nosso marqueteiro em Belém, o Luís Arnaldo, foi preso político comigo em 1977. Ele foi da direção do PT e do Psol. Mas pequenas empresas podem contribuir.
Qual é o critério?
Estatutariamente, não pode ser monopólios ou multinacionais. Eu particularmente fiz (em 2010) uma campanha com R$ 214 mil em São Paulo e tive 190 mil votos. Não há nenhuma pessoa jurídica na minha doação. Eu prefiro assim. O Psol é mais flexível do que eu. Também vamos arrecadar pela internet. Não podemos ficar reféns do poder econômico.
Se o Psol um dia chegar à Presidência da República, como ele vai governar sem fazer alianças com os partidos que não são de esquerda?
Essa questão deve ser vista no seu tempo. Quero lembrar das eleições de 1988, quando nós éramos todos do PT. O partido naquele ano ganhou prefeituras muito grandes, como Porto Alegre, São Paulo, Santos, Campinas e Ribeirão Preto.
O (Antonio) Palocci governou lá com um vereador só. A Telma de Souza tinha dois vereadores em Santos. A Luiza Erundina tinha cinco em São Paulo. No entanto, quando tentaram cassar o mandato dela, nós convocamos a população e reunimos 50 mil pessoas na porta da Câmara e os conservadores recuaram.
O maior pecado do PT foi desmobilizar a força social de mudança quando chegou ao poder. Tinha uma capacidade de pressão popular muito forte, mas abriu mão disso para se aliar com PTB, PP, PR e garantir a governabilidade apenas pela somatória numérica da maioria parlamentar. O que a CUT fez em oito anos? Nada. Hoje é uma entidade sem força, sem energia. Ela foi cooptada. Virou um grande aparelho sem capacidade de mobilização. Perdeu autonomia.
Acha que os movimentos sociais perderam a independência?
A UNE virou um movimento oficialista. Não ataca a política econômico do governo. O único que manteve algum grau de independência e pressão foi o MST. Eles sofreram muitas agruras. A reforma agrária não saiu no papel e o governo fez alianças com o agronegócio no Código Florestal.
O MST acabou de fechar acordo com o Pão de Açúcar e Extra. As duas redes venderão arroz dos sem – terra…
Uma coisa é a luta pela reforma agrária, pela pequena propriedade. O MST defende a agricultura familiar. O fato dele derivar a produção para os que vão fazer a comercialização, não tem muito jeito. Isso não rebaixa o programa deles.
Ficou frustrado com a posição do PCdoB no Código Florestal?
O PCdoB teve uma posição muito ruim, mas isso não aconteceu sem contradição interna. Eu sei que o secretário geral de meio ambiente divergiu radicalmente da posição do Aldo Rebelo, que cumpriu um papel muito nocivo no debate do Código. Ele fez o jogo do grande agronegócio e mesmo núcleo duro que não quer acabar com o trabalho escravo.
A Heloisa Helena disputa hoje uma vaga na Câmara dos Vereadores em Maceió. Ela é a favorita do Psol para disputar a presidência em 2014?
No segundo congresso do Psol, a Heloísa Helena era unanimidade para ser a candidata. Mas contra toda a vontade do partido, ela fez uma opção de disputar o Senado em Alagoas contra a oligarquia rural de lá. Tivemos que procurar uma nova candidatura, que foi a do Plínio de Arruda Sampaio.
Qual será o futuro da CPI do Cachoeira?
Ela demonstra claramente os interesses promíscuos entre políticos graduados e governadores com grandes empresas, como a Delta. Poucos partidos têm vontade de investigar. O Psol, que é um partido minúsculo, foi o único que entrou no Conselho de Ética contra o senador Demóstenes Torres.