Pronunciamento do deputado federal Ivan Valente (PSOL/SP) no plenário da Câmara dos Deputados em 12 de abril de 2012.
“Senhor Presidente, senhoras e senhores Deputados,
A luta por uma saúde pública e de qualidade para todos é travada cotidianamente em nosso país por aqueles que acreditam no dever do Estado de garantir este direito fundamental dos cidadãos e cidadãs brasileiras. Mas, nos últimos anos, o Dia Mundial da Saúde vem se transformando num momento estratégico para a defesa do SUS e de uma política pública universal de promoção da saúde pública, que tantos ataques vem sofrendo. É por isso que nosso mandato se soma nesta terça-feira (07/04) às centenas de movimentos populares e organizações da sociedade civil que vão às ruas, especialmente em nosso estado de São Paulo, erguer uma vez mais esta bandeira.
Os desafios não são poucos. No final de 2011, presenciamos aqui no Congresso Nacional a aprovação, por 364 votos a favor e 61 contra, da Proposta de Emenda Constitucional 61/2011, que prorrogou a Desvinculação de Receitas da União por mais quatro anos. Assim, até dezembro de 2015, o governo pode usar livremente 20% de todos os tributos federais vinculados por lei a fundos ou despesas. E já sabemos para onde vão esses recursos: para o superávit primário e o pagamento de juros da dívida pública, com enormes prejuízos para a saúde pública e a seguridade social no Brasil.
O PSOL foi o único partido a manter a coerência e votar contra a DRU. Até 2002, os parlamentares ligados ao PT eram contra o mecanismo, e a base do governo FHC era a favor. A partir do governo Lula, os papéis de inverteram: o PT passou a ser a favor e o PSDB, contra.
Vale lembrar que a Desvinculação de Receitas da União foi criada exatamente para favorecer ao ajuste fiscal, obedecendo a um receituário do Fundo Monetário Internacional. Enquanto o estoque da dívida pública federal caiu de 60% do PIB no governo FHC para 39% no governo Lula, a percentagem do PIB em gastos federais com a saúde também caiu: de 1,91% do PIB em 1992 para 1,83% do PIB agora.
E quando todos nós esperávamos que a regulamentação da Emenda 29, tão discutida nesta Casa, pudesse ampliar os recursos para a saúde, fomos surpreendidos com os vetos da Presidenta Dilma à regulamentação aprovada no Parlamento, que mostram, definitivamente, que este setor está longe das prioridades do governo. Os vetos de Dilma, na prática, pioraram a situação do setor em relação à legislação antes em vigor. Isso porque eles impedem a ampliação de recursos para a saúde ao longo do ano; diminuem a transparência na gestão do dinheiro; permitem computar despesas financeiras nos montantes mínimos devidos por cada ente federativo e autorizam até o pagamento da dívida pública com recursos da saúde.
Um dos argumentos do governo é que uma alteração constante nos valores a serem destinados à saúde pela União geraria instabilidade na gestão fiscal e orçamentária. O problema é que, assim, o governo se nega a garantir recursos adicionais à saúde no caso de revisão do valor do PIB. Aprovar a regulamentação da Emenda 29 sem prever nenhum aumento de gastos por parte da União fará com que o capital financeiro, que sempre encontra uma forma de abocanhar uma parcela dos recursos das áreas sociais para o pagamento de juros e amortizações da dívida pública, continue ganhando.
Como se não bastasse este quadro recente de ataques à saúde pública, em fevereiro o governo anunciou um corte de R$ 5,4 bilhões no orçamento do setor aprovado para 2012. Ou seja, o SUS continuará subfinanciado, com impactos seríssimos para o conjunto da população brasileira.
E quando analisamos de perto o serviço de saúde pública que vem sendo ofertado à população, senhor Presidente, confirmamos as consequências práticas das políticas de ajuste fiscal que vem sendo desenhadas em Brasília e acompanhadas por todos os estados da Federação. Em São Paulo, onde a lógica neoliberal privatista fez escola, homens, mulheres, idosos e crianças sofrem diariamente com a falta de estrutura para os atendimentos de emergência, o agendamento de consultas, a realização de exames e cirurgias, o acesso a medicamentos e até mesmo a uma política pública de saúde preventiva.
Os serviços foram entregues à iniciativa privada que, em busca do lucro, tem reforçado um modelo centrado no tratamento – mesmo que tardio – das doenças e não na prevenção e promoção da saúde. Àqueles que defendem que as técnicas da gestão privada são o melhor caminho para a administração pública, é importante ressalvar que 60% dos paulistanos elegeram a saúde como a pior área da gestão Kassab.
As críticas ao governo estadual do PSDB também se multiplicam, sendo a mais recente o combate à privatização do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, considerado hoje o segundo melhor hospital do mundo em doenças infecciosas e parasitárias. O governador Alckmin levou para o Emílio Ribas seu “projeto de melhoria na qualidade da gestão pública”, que visa ao aumento de receitas e à redução de despesas. Os trabalhadores do instituto, que já tem sofrido uma série de cortes em seus direitos, temem que o governo esteja enxugando os gastos do instituto para então privatizá-lo.
E o primeiro passo já foi dado neste sentido, com a aprovação, na Assembleia Legislativa de São Paulo, do projeto que autoriza que todo hospital público reserve até 25% dos seus leitos para os planos de saúde. A institucionalização da porta dupla — em que, em uma porta, o hospital atende gratuitamente ao público geral e, na outra, aos clientes pagos — é devastadora para o SUS e representa uma violação do direito à saúde, através do atendimento diferenciado. Sem falar no crescimento do número de contratos com as OSs (organizações sociais) e o estabelecimento das PPPs (parcerias público-privadas).
Como afirma a carta pública dos movimento populares divulgada à população de São Paulo neste Dia Mundial da Saúde, transformar este direito fundamental em mera mercadoria atinge os trabalhadores do setor, ataca o caráter público da política de saúde e submete o povo brasileiro a condições ainda mais degradantes no momento em que o cidadão mais precisa do apoio do Estado.
Por isso, senhoras e senhores Deputados, reafirmamos o compromisso do PSOL com a luta em defesa do SUS 100% público, de qualidade para todos. E com um serviço de saúde que coloque a dignidade da população brasileira em primeiro lugar. Esta é a nossa bandeira!
Muito obrigado.”
Ivan Valente
Deputado Federal PSOL/SP