Após governo e comando da câmara terem derrubado a data de votação dos dias 6 e 7 de março (fruto da campanha do veto, que gerou crise na base governista e apavorou o próprio núcleo do governo devido a ameaça à imagem de Dilma) e a votação ter ficado sem data durante quase todo o mês de março, o que atendia interesse e disposição do governo em não votar antes da Rio+20, foi fechado acordo de líderes que permitiu a aprovação do projeto da Copa ontem a noite do jeito que o governo pretendia, sem susto, em troca da marcação da data indicativa de votação do CF para final de abril (provavelmente dias 17 e 18 ou dias 24 e 25).
Kenzo Jucá Ferreira
Por um lado, esse acordo representa uma ameaça para a consolidação do cenário de não votar antes da Rio+20, pois, apesar de ser difícil, existe a possibilidade real da votação ocorrer mesmo no final de abril, caso a campanha do Veto esfrie e a mobilização social sofra um refluxo. Acreditamos que essa nova data é uma espécie de “teste” que o governo esta submetendo a sociedade (nacional e internacional) para comprovarmos ou não nosso poder de pressão e de gerar desgaste na presidente Dilma. Entendemos essa nova data como uma “tentativa” do governo e dos ruralistas: se ocorrer tudo tranqüilo até lá e parte dos ambientalistas se comprometerem a apoiar vetos parciais laterais após a votação para diminuir estrago na imagem do governo, a votação pode realmente ocorrer. Para isso eles teriam que quebrar parte da unidade do comitê, o que tentamos evitar a todo custo, até aqui com sucesso. Se nesse “teste” o governo sentir que a pressão está mesmo muito grande e que uma votação em abril traria imenso desgaste e poderia até mesmo comprometer a atuação oficial do Brasil na Rio+20 (algo além do desgaste a imagem de Dilma), a data seria renegociada para os padrões regulares (pós-Rio+20). Em outras palavras, a partir de agora só depende de nós (sociedade) adiar a votação, o que antes também dependia de acordo entre a base governista. Isso nos faz ter que redobrar nossa campanha e nosso estado de alerta no curto prazo (o que já havíamos dito que teríamos que continuar fazendo, antes e independente dessa nova data de abril). Para atender essa nova realidade, temos atividades já marcadas e outras a marcar do Comitê, como o Workshop e coletiva de imprensa do comitê 12 e 13 de abril (pra fechar o PAC Florestal) e planejando um Dia Nacional de Luta da Campanha “Veta, Dilma” em todas as 24 capitais do Brasil no dia 24 de abril. Podíamos pensar o dia 24 abril como “Dia Mundial do Veta Dilma”: todas as capitais do Brasil e o que pudermos em Europa, África, Américas e todos.
Por outro lado, o acordo confirma uma coisa positiva que gostaríamos que tivesse acontecido para ajudar na consolidação do adiamento para após a Rio+20 e reforça a necessidade da mobilização descrita no ponto anterior: a desvinculação entre a copa e o CF na pauta, que é um passo importante e necessário para liberar o adiamento do código nesse momento, apesar do risco e do trabalho extra que esse acordo de hoje vai nos proporcionar, conforme descrito acima. É um processo contraditório, mas lógico. Mesmo com o risco dessa data marcada para “final de abril” (sem dia marcado, mas possivelmente na terceira ou quarta semana de abril), contraditoriamente, a votação da Copa foi a melhor coisa que podia ter ocorrido para consolidar o adiamento da votação para após a Rio+20, apesar da contradição da nova data e do trabalho extra que isso nos dará, que não é um trabalho novo, mas um trabalho extra não programado, pois, sempre alertamos que precisávamos ampliar a mobilização independente do cenário e que um refluxo da sociedade geraria fim da crise na base do governo.
Três conclusões/cenários preliminares da nova conjuntura:
1. Com o governo não tendo mais nenhum projeto de seu extremo interesse para votação em 2012 que permita aos ruralistas barganhar chantagem na câmara (apenas o Orçamento Geral da União em dezembro) após a votação da copa ontem a noite, caso a pressão popular e internacional pelo veto não reduza os patamares atuais (o que pode ocorrer devido ação de um setor dos parceiros), caso o CF entre em pauta final de abril, haveria uma batalha regimental em torno da relatoria e a votação seria derrubada por inadequações ao regimento interno da câmara (o Supremo derrubou esse mês uma inadequação desse tipo cometida pela câmara no projeto que criou o ICMBio, o que é um precedente inédito e uma sinalização clara que pode ocorrer o mesmo com o CF, o que gera cuidados adicionais tanto do governo como de ruralistas com receio de perder no judiciário), conforme adiantamos em outras ocasiões. Para essa via da derrubada por regimento ocorrer é necessário, também, aumentar a pressão nacional (o que estamos tentando fazer) e internacional (que deve ser mantida e ampliada) pelo Veto e criar formas de ampliar o constrangimento através da vinculação direta entre os organismos institucionais da Rio+20/Cúpula dos Povos e o CF para respaldar socialmente um adiamento regimental caso o projeto entre mesmo em pauta.
2. Pode estar existindo alguma conversa de bastidores entre governo e parte dos ambientalistas sem nós sabermos. Para combater isso, temos que reforçar as ações do comitê (wokshop pra fechar proposta anti-votação do projeto, dia nacional (ver possibilidade de ser internacional) de campanha nas capitais, audiência com líderes e ministros, ampliar colagem dos cartazes do veto etc) e mostrar que nós não aceitamos votar em abril e que se isso ocorrer o Brasil poderia perder sua credencial de liderar a Rio+20. A pressão internacional também é fundamental para descredenciar e evitar essa tentativa de costurar uma saída negociada para a votação e possíveis vetos parciais de Dilma.
3. Essa nova data (fim de abril) é muito estranha e de difícil concretização, devido sua grande inviabilidade política, visto que, no final de abril e início de maio, muitos setores que virão para Rio+20 já estarão no Brasil nas pré-atividades e a pressão para vinculação entre o CF e a Rio+20 será potencialmente muito mais forte e prejudicial para a imagem de Dilma e do governo do que poderia ser hoje. A data de abril pode ser uma ficção (mesmo para o comando ruralista) para não ficar “muito feio” para os ruralistas liberarem a Copa sem marcar uma data qualquer para o CF, que foi a pauta que os fez parar a câmara semana passada (queriam uma data), ou seja, seria uma data (final de abril) apenas para dar satisfação para a própria base ruralista e liberá-los para votar a copa e, com isso, possibilitar a costura de um acordo verdadeiro para votar o CF após a Rio+20, sem que isso (adiamento pós Rio+20) pareça que foi uma derrota dos ruralistas e vitória dos ambientalistas, mas sim que foi um adiamento “negociado e com aval” dos ruralistas para o “bem do Brasil”.
Em resumo, o acordo e a nova data representam um susto concreto e uma ameaça real, deve fazer nós ampliarmos nossas ações de pressão e planejarmos novas atividades curtas e rápidas, mas contundentes e com impacto e repercussão forte, nesse horizonte de 1 mês até fim de abril, que garantirá o adiamento para pós-Rio+20. Isso deve ocorrer tanto no Brasil como ampliar ações da rede WWF, se possível envolvendo a rede Greenpeace na medida do possível. Todavia, a votação da Copa nos da mais tranquilidade quanto a possíveis chantagens ruralistas com o governo e desenha um cenário onde as barganhas políticas entre os partidos da base perde força (apesar do acordo firmado, mas que pode ser renegociado com o decreto de 11 de abril) e ganha novamente destaque e força a pressão da sociedade. Esse novo cenário, sem Copa e sem nenhuma matéria muito grave que prenda o governo no congresso, amplia o papel do comitê brasil e da pressão internacional. Sem a Copa, o elemento preponderante que pode definir a votação ou não da matéria, mais uma vez, volta a ser a pressão popular. O governo conseguiu segurar durante 3 semanas o ímpeto ruralista, atrasou o calendário ruralista, praticamente inviabilizou a votação antes da Rio+20 com esse atraso de dois meses de março e abril (apesar do acordo) e marcou a data para final de abril, diante disso, o papel de principal protagonista da conjuntura volta a ser da sociedade e não dos líderes do governo segurando os ruralistas. Nós (comitê e sociedade) estamos segurando o ímpeto ruralista há três anos. O governo segurou apenas três semanas e atrasou dois meses esse ano. Agora é hora de voltarmos a segurar sozinhos a barra toda e evitar esse desastre, que volta a depender exclusivamente da sociedade.
Vamos acompanhando e ampliando as atividades e a pressão.
Kenzo Jucá Ferreira é especialista em Políticas Públicas/ WWF-Brasil