Em pronunciamento realizado nesta terça-feira (07/02) na Câmara dos Deputados, Ivan Valente criticou a entrega de um setor público estratégico para o desenvolvimento do país ao capital estrangeiro. Contrariando o discurso de campanha de Dilma Rousseff, o governo federal privatizou nesta segunda os três maiores e mais rentáveis aeroportos do país: Cumbica, Viracopos e Brasília, que respondem, juntos por 30% dos passageiros, 57% do volume de cargas e 19% das aeronaves que passam pelos terminais brasileiros. Juntos os três aeroportos também são responsáveis por 70% do faturamento da Infraero, sustentando a rede de aeroportos regionais em operação em todo o país.
A justificativa do governo é a de que não havia caixa no orçamento público para garantir os investimentos nos três aeroportos na velocidade necessária para a Copa de 2014. “O que não se diz é que foi o dinheiro público, através do BNDES, que financiou a privatização, emprestando aos compradores internacionais para que estes participassem do leilão. Oras, se o BNDES estava disposto a fazer empréstimos para financiar investimentos nos aeroportos, por que não fazer isso através da Infraero, uma empresa pública, estatal, que administra 66 aeroportos no país? O papel de um banco como este é ajudar o desenvolvimento do país e a iniciativa privada e estrangeira?”, questionou Ivan Valente.
Com a privatização, não está claro como a Infraero subsidiará investimentos nos demais aeroportos do país, a maioria deficitária. Hoje, apenas cerca de 20 aeroportos do país são rentáveis e mantém os demais com repasse de verba, no esquema de subsídios cruzados, diminuindo as desigualdades regionais e sociais do país. Até agora, a lucratividade crescente de Cumbica, Viracopos e Brasília era fundamental para manter todo o sistema aéreo em bom funcionamento.
Segundo o Palácio do Planalto, além do valor arrecadado com o leilão, os consórcios recolherão anualmente uma contribuição ao sistema, que varia de 2% a 10% da receita bruta de cada aeroporto. Mas essa arrecadação vai para o Fundo Nacional de Aviação Civil (FNAC), que deve destinar recursos a projetos de desenvolvimento e fomento da aviação civil. Até agora o funcionamento do FNAC não foi definido; será regulamentado posteriormente por decreto presidencial. Tudo indica que esse dinheiro não vai para a Infraero, e os demais aeroportos seguirão sem o aporte que recebiam anteriormente.
Risco para os trabalhadores e passageiros
O Sindicato Nacional dos Aeroportuários (SINA) tentou barrar o pregão de privatização dos 3 aeroportos na Justiça, afirmando que o edital do leilão descumpria o acordo firmado com a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) durante a última greve, que garantia a estabilidade dos trabalhadores da Infraero nos terminais privatizados. O contrato de concessão diz apenas que “a concessionária deverá desenvolver um plano de transferência operacional a fim de assegurar uma transição eficaz das operações aeroportuárias”.
“Ou seja, não há qualquer garantia para os trabalhadores, que precisarão recorrer à Justiça – a mesma que manteve o leilão – caso seus direitos trabalhistas não sejam garantidos, o que há grandes chances de ocorrer. As precarizações e demissões são iminentes. Por isso, já estamos requerendo audiência com o Ministério Público do Trabalho da 10ª Região em Brasília”, relatou Ivan Valente.
No final de janeiro, o mandato participou de uma audiência do Comitê Contra as Privatizações de Aeroportos com o Procurador Paulo Gomes, do Ministério Público Federal em Campinas. O MPF está estudando os impactos urbanísticos das privatizações e intervenções motivadas pelos grandes eventos e já levantou uma série de problemas em relação ao aspecto ambiental das obras previstas para estes aeroportos. Em Viracopos, por exemplo, das cerca de 70 medidas previstas para amenizar os impactos ambientais, apenas 2 foram cumpridas até agora. O restante virou “exigência” do processo.
Para Ivan Valente, sequer os passageiros sairão ganhando com a entrega da Cumbica, Viracopos e Brasília às empresas estrangeiras. Está prevista no contrato de concessões a cobrança de taxas de conexão nesses aeroportos, o que não era feito anteriormente pela Infraero.
“Alguém duvida que essa taxa será imediatamente repassada pelas companhias aéreas para o preço das passagens, ou seja, para o bolso do consumidor, afetando sobretudo as classes menos favorecidas, que recentemente passaram a utilizar o transporte aéreo?”, questionou o parlamentar. “Há ainda um risco para a qualidade e segurança das operações, já que o transporte aéreo passará a ser orientado pelo lucro dessas empresas. Lucros estes que serão remetidos para o exterior, em vez de ficarem no mercado brasileiro e gerarem emprego e renda para a nossa população”, acrescentou.
Soberania nacional ameaçada
Para o PSOL, a entrega dos aeroportos também coloca em risco a própria soberania nacional. O artigo 170 da nossa Constituição Federal, por exemplo, trata da vulnerabilidade de zonas fronteiriças aéreas.
“Mas o governo Dilma parece ignorar essa questão, ao passar para as mãos de empresas estrangeiras o controle da entrada de bens e pessoas no país, com o agravante da proximidade da Copa do Mundo e das Olimpíadas, quando o fluxo de cargas e passageiros aumentará significativamente. Diante de tamanhos problemas, não é possível achar que o país fez um bom negócio”, concluiu Ivan Valente.