As organizações ambientalistas subiram o tom e aproveitaram o Fórum Social Temático, que aconteceu de 24 a 29 de janeiro em Porto Alegre, para ampliar a mobilização da sociedade civil contra as mudanças no Código Florestal. O foco das ações, que devem tomar o país até 6 de março, data prevista para a votação do novo texto na Câmara dos Deputados, será o veto da Presidenta Dilma a todos os artigos que representam anistia aos desmatadores e novas derrubadas de florestas.
Na avaliação das organizações que integram o Comitê Brasil em Defesa das Florestas, as mudanças no projeto de novo Código Florestal feitas pelo Senado no texto aprovado na Câmara foram periféricas e pontuais. Na essência, o texto reduz a proteção da biodiversidade, continua anistiando aqueles que derrubaram árvores ilegalmente até julho de 2008 e autoriza novos desmatamentos. Elas apostam nas pesquisas de opinião pública, que mostram que 80% da sociedade são contra as mudanças propostas, para criar uma conjuntura política favorável aos vetos de Dilma. O tempo é curto, sabem, mas barrar o novo Código Florestal é uma questão estratégica.
“Não concordamos com a perspectiva de ter uma discussão sobre o possível, uma discussão que sequer aconteceu de fato. Este Código foi construído às escuras dentro do Congresso. Apesar de alguma manifestação ter sido permitida, nada do que foi manifestado se incorporou. Vários setores da sociedade e da comunidade científica mostraram que o Código Florestal de 1965 em vigor não só é atual como deveria ser melhorado para garantir maior conservação. O atual Código é bom para o Brasil, para a produção brasileira e para o mundo. Só que nunca foi implementado porque sempre houve oposição a essa legislação por parte dos proprietários rurais”, afirmou Maria Cecília Wey, do WWF.
Marina Silva, que representa o Fórum de ex-ministros de meio ambiente, também criticou a tramitação do projeto no Congresso e a urgência de se garantir os vetos da Presidenta Dilma. “Nós fizemos de tudo para resolver o problema na Câmara e no Senado. Mas as audiências públicas foram só para se falar, porque as propostas não foram incorporadas no relatório final. Não houve debate. As mais de 200 emendas apresentadas no Senado, por exemplo, foram apreciadas de um dia para o outro. Agora, sem nenhuma resistência de governo, o texto está sendo tratado como se fosse um avanço. Mas não. É melhor dizer que estamos derrotados do que servirmos de paspatur verde para enquadrar este retrocesso”, criticou Marina. “Dilma assinou de próprio punho um compromisso de campanha. Precisamos cobrá-la”, disse.
Modelo de desenvolvimento O que estará nãos mãos de Dilma muito em breve é a necessidade de definir se se compromete com a bancada ruralista ou com a possibilidade de construção de outro modelo de desenvolvimento no país. Em diversos debates sobre o Código Florestal feitos no Fórum Social Temático, o movimento ambientalista alertou para o que virá na sequência, caso este texto seja aprovado em definitivo na Câmara e sancionado em sua integralidade.
“O Código Florestal é o primeiro pilar de um grande plano, representado por apenas 2 milhões de votos – esta foi a votação da bancada ruralista –, que pretende acabar com todos os avanços constitucionais de 1988, e com a legislação ambiental que foi construída a partir disso, como a lei que regulamenta a criação de Unidades de Conservação e as terras indígenas”, explicou Nilo D´Ávila, do Greenpeace. “Os povos indígenas, os quilombolas, as reservas extrativistas e o Código Florestal: tudo é alvo do grande capital. Os povos guaranis no Mato Grosso do Sul, por exemplo, estão sendo massacrados”, criticou João Pedro Stedile, do MST.
Outro passo seria mexer na lei das águas. Na tramitação do próprio Código Florestal, os proprietários rurais já conseguiram a inclusão de uma emenda no Senado que reduz as competências do Ibama para fiscalizar desmatamentos. A lógica, afirmam os movimentos, é remover as barrerias ambientais para permitir a expansão do capital do agronegócio.
“Nessa proposta não tem nada de novo. É a síntese do sonho da elite rural do Brasil, que é: onde há uma porteira, o dono faz o que quer lá dentro, e o Estado fica de fora. Neste código está a velha proposta do ruralismo, da propriedade sem florestas, sem função social, onde as leis e obrigações sociais e ambientais não atuem”, disse Nilo D’Ávila.
Para o deputado federal Ivan Valente, membro da Frente Parlamentar Ambientalista, aquilo que os ruralistas querem transformar em uma questão da terra é, na verdade, um debate sobre o projeto de desenvolvimento do país, que passa pelo combate às políticas de reforma agrária, pela defesa da grande propriedade e de um modelo econômico baseado na agricultura extensiva para exportação.
“O que está em jogo é um modelo que quer reprimarizar o nosso país. Eles são uma minoria que quer exportar soja, biocombustível e carne e fazer divisas para o país pagar juros da dívida pública – e não para produzir alimentos para o povo. São os mesmos que, no Congresso, não permitem a aprovação da PEC do trabalho escravo, que protegem a grilagem de terra, que colaboram com assassinatos no campo. O governo federal, em nome da governabilidade, não pode compactuar com crimes desta natureza. E a lógica da governabilidade, num ano eleitoral, tende a prevalecer. Por isso a mobilização precisa aumentar”, avalia Ivan Valente.
Agenda internacional Além das mobilizações de rua, outra estratégia em curso é tentar adiar ao máximo a votação do PL na Câmara, para aproximá-la da Rio+20, a reunião dos Chefes de Estado que acontece em junho, focada na pauta da sustentabilidade. Além de ganhar tempo para aumentar o debate público e a pressão sobre a Presidência, as organizações do Comitê em Defesa das Florestas acreditam que pode haver um constrangimento dos parlamentares e do governo federal em aprovar este novo Código com milhões de pessoas em todo o mundo olhando para o Brasil.
Na semana passada, as entidades publicaram um anúncio no Finantial Times, que sairá em breve também na revista The Economist, afirmando que a credibilidade do governo Dilma estará em risco caso as mudanças propostas sejam aprovadas.
“É uma pauta internacional, porque, nesta crise global, o Brasil e a África estão sendo vítimas de um movimento que o capital financeiro faz para se apropriar dos bens e recursos naturais. Esses bens são os únicos que, ao serem transformados em mercadoria, adquirem valor muito maior que o trabalho e geram um lucro fantástico às empresas que os exploram. Não é à toa que Katia Abreu fez um recorrido a Washington para aprovar as mudanças no Código, prometendo aos americanos que eles poderiam então se apropriar de mais de 80 milhões de hectares da biodiversidade brasileira. Ou seja, não têm prurido nenhum em revelar seus interesses”, apontou Stedile.
A pergunta colocada e que precisa ser respondida pelo país é se o Brasil quer passar no teste da sustentabilidade durante a Rio+20 ou quer mudar este teste. Se em 1992 o movimento se organizava para construir uma agenda pró-ativa, agora a meta é evitar os retrocessos.
“Estamos andando para trás. Mas temos uma chance de fazer com que a discussão
na Rio+20 não seja a “Rio-20”. O Brasil é o país que reúne as melhores condições de pautar a rediscussão do modelo de desenvolvimento. Precisamos nos comportar como quem quer a competição pelo caminho de cima, com produção com ciência e tecnologia, sustentável do ponto de vista econômico e ambiental”, explicou Marina Silva.
Cerca de 30 eventos estão planejados até o início de março, envolvendo datas como o Dia Internacional de Luta das Mulheres e até as homenagens a Iemanjá, em 2 de fevereiro. No dia 28 de fevereiro, um seminário científico acontecerá na Câmara dos Deputados. No dia 06 de março, os protestos serão descentralizados nos estados, culminando num ato em Brasília, no dia 7. A mobilização de pressão sobre Dilma Rousseff começou nesta quinta-feira (26) em Porto Alegre. Enquanto a presidenta discursava dentro do Gigantinho, um protesto contra o novo Código Florestal acontecia na porta do ginásio, reunindo os mais diferentes setores dos movimentos sociais que querem barrar o novo Código. O deputado Ivan Valente participou da manifestação e segue na luta contra este retrocesso em nossa legislação ambiental.
Do site do deputado Ivan Valente