Pronunciamento do deputado Ivan Valente – PSOL/SP
Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, no final de junho, o Governo Federal assinou um acordo com as empresas de telefonia que permitiu a renovação dos contratos de concessão com as prestadoras de serviço de telefonia fixa, mas que, na prática, entregou mais uma vez para o mercado aquilo que seria dever do Estado: garantir o acesso da população brasileira à Internet com qualidade e a preços acessíveis. A grande mídia, obviamente, celebrou o acordo. Alardeou que “todo o Brasil agora terá acesso a banda larga a um custo de 35 reais por mês”.
O que a imprensa não noticiou – e o Governo fez questão de esconder – foram as inúmeras limitações no serviço que será oferecido à população. Os usuários desse tipo de plano terão franquias reduzidas de download, que somente em 2014 chegarão a 1 gigabyte, o equivalente a baixar 1 filme por mês. Após o uso dessa franquia, a operadora poderá reduzir temporariamente a velocidade do serviço ofertado, condicionando completamente o uso da Internet. Já para fazer upload, ou seja, para publicar conteúdo na rede, a velocidade será de apenas 128 kilobytes, ou seja, somente duas vezes a velocidade de uma conexão discada. Portanto, muito longe do que se entende por banda larga.
As operadoras também poderão garantir esse preço para a Internet em pacotes de venda casada, com telefonia fixa e/ou TV por assinatura em conjunto. Assim, o cidadão pagará 35 reais pela Internet apenas se levar um pacote mais caro, incluindo outros serviços. Vale lembrar que a venda casada é uma prática proibida pelo Código de Defesa de Consumidor.
Para fazer valer a “propaganda”, quase enganosa, o Ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, comparou o preço do plano resultante do acordo com as teles com os valores oferecidos atualmente pelas empresas, sem mencionar que hoje não há esse tipo de limitação imposta.
Não bastassem as péssimas condições a serem oferecidas aos cidadãos, o acordo com a teles prevê ainda que, caso não cumpram as metas estabelecidas, as sanções às empresas podem ser transformadas em investimentos em áreas economicamente não atrativas. Na prática, as empresas podem trocar o não cumprimento de metas pela expansão de sua própria rede. É um descalabro, Sr. Presidente!
Além de inaceitável, o acordão com as teles representa, na prática, a negação do próprio Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), como pensado originalmente, e das diretrizes aprovadas na 1ª Conferência Nacional de Comunicação, realizada em 2009, que apontavam para um maior protagonismo do Estado e para o fortalecimento da TELEBRÁS, essenciais para fazer da Internet um direito de todos, e não privilégio de alguns. A TELEBRÁS, que poderia ter um papel de forçar as empresas de telecomunicações a se mexer, investir em infraestrutura e baixar seus preços, está cada vez mais se transformando em estrutura de apoio para as próprias teles. Assim, confirma-se a opção do Governo em deixar para a exploração das empresas a infraestrutura construída com recursos públicos vindos das concessões. É privatização em sua fase mais aguda.
Se a banda larga fosse um serviço prestado sob regime público, seriam estabelecidas metas de universalização, de qualidade, de modicidade (preços acessíveis) e a continuidade do serviço seria garantida, independentemente do lugar onde vive o cidadão ou de sua condição socioeconômica. Haveria ainda instrumentos regulares de acompanhamento e cobrança. No regime privado, onde não há qualquer obrigação de universalização do serviço, e diante da pouca disposição do Governo Federal para negociar seriamente com as teles, quem saiu perdendo mais uma vez foram os cidadãos e cidadãs brasileiras, sobretudo aqueles das classes menos favorecidas, a quem será ofertada uma Internet de segunda classe.
Enquanto isso, a ANATEL, que deveria ter o papel de defender o interesse dos usuários, está completamente capturada pelos interesses das empresas. Em maio, a Agência admitiu, por exemplo, que não tem qualquer controle sobre a venda de bens reversíveis pelas teles. Os bens reversíveis são aqueles considerados essenciais à prestação de serviços e que devem retornar ao Estado após o término das concessões. Portanto, não podem ser negociados pelas teles. Em audiência pública realizada nesta Casa, a ANATEL reconheceu não ter uma lista própria dos bens que as teles estão impedidas de negociar, nem uma relação do patrimônio adquirido por elas da TELEBRÁS em 1998.
Para protestar contra tamanho absurdo e exigir banda larga barata e de qualidade para todos os brasileiros, a Coordenação dos Movimentos Sociais, em parceria com a Campanha Banda Larga é Direito Seu!, vai realizar um grande ato em São Paulo, na próxima segunda-feira, dia 15 de agosto, no Sindicato dos Engenheiros. Nós estaremos lá. Entre as bandeiras do ato estão a exigência de que o Governo Federal defina a banda larga como serviço a ser prestado em regime público, volte a investir na TELEBRÁS como instrumento de políticas públicas e retome o diálogo com as entidades do campo popular para pensar um projeto para o setor.
O Fórum Brasil Conectado, criado pelo Governo no âmbito do PNBL para ouvir setores envolvidos e interessados no tema, não foi convocado uma única vez este ano. E, como lembram as entidades da sociedade civil, a expansão da banda larga, que hoje já apresenta problemas gravíssimos, com as teles no topo das reclamações dos serviços de atendimento ao consumidor, continua sem um plano estratégico de longo prazo que garanta a expansão constante das redes e a universalização progressiva do serviço. É mais do que urgente, portanto, reverter esta lógica privatista e colocar os direitos dos cidadãos à frente dos interesses do mercado.
Por fim, Sras. e Srs. Deputados, manifesto nossa indignação com o tratamento desrespeitoso dado pelo Ministério das Comunicações e pela Secretaria Geral da Presidência da República, que, incomodados com a convocação do manifestação da próxima segunda-feira, desmarcaram, com menos de um dia de antecedência, uma reunião agendada há tempos com organizações da sociedade civil. Cerca de 30 organizações já estavam a caminho de Brasília, usando seus próprios recursos para o deslocamento, quando ficaram sabendo que o Governo Federal tinha resolvido condicionar o diálogo com a sociedade civil à não manifestação pública dos movimentos sociais em torno dessa pauta. É uma postura lamentável, inaceitável em governos se que dizem democráticos e populares, mas que revelam – e, por isso, nos alertam e nos chamam a reagir – o quanto os interesses privados estão ditando as regras na gestão Dilma.
A banda larga é um direito do cidadão. Vamos juntos lutar por uma Internet barata e de qualidade para todos e todas!
Muito obrigado.
Ivan Valente – deputado federal PSOL-SP.