Em artigo intitulado “É a vez do Brasil!”, o deputado Jean Wyllys defende a PEC do casamento civil.
Como deputado federal pelo estado do Rio de Janeiro, mas também como cidadão homossexual e ativista de direitos humanos, estou propondo, ao Congresso Nacional, a aprovação de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para garantir o direito ao casamento civil a todas as pessoas, sejam gays, lésbicas, bissexuais, travestis, transexuais ou heterossexuais. Quer dizer, os mesmos direitos com os mesmos nomes, porque a nossa Constituição Federal diz que todas as pessoas são iguais perante a lei e não devem sofrer discriminação (arts. 3 e 5).
Esses princípios, além de fazerem parte do nosso texto constitucional, são lei para todos os países que assinaram a Declaração Universal dos Direitos Humanos, estabelecida nos artigos 1º e 7º. O princípio da igualdade e o direito a não sofrer discriminação são reconhecidos também na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (art. II), no Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (arts. 2 e 26), na Convenção Americana sobre direitos humanos (art. 1) e no Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (art. 2), entre outros instrumentos de direito internacional.
Deveria bastar com isso para que a discussão sobre o casamento igualitário terminasse aqui, mas como disse Gorge Orwell em A revolução dos bichos: “Todos os animais são iguais, mas alguns são mais iguais do que outros”. Na vida real, é isso mesmo que acontece com as pessoas.
A história registra muitos exemplos de debates sociais semelhantes. “Mulher votando? Mulher, quem sabe, Chefe da Nação?”, perguntava-se Drummond na década de 1920, em poesia dedicada a Mietta Santiago. A primeira pergunta do poeta foi respondida com a promulgação do Código Eleitoral de 1932, que deu às mulheres o voto. A segunda demoraria quase cem anos: a eleição, em 2010, da primeira mulher Presidenta da República.
Estamos falando de uma forma de discriminação do mesmo tipo que a exclusão das mulheres do direito ao voto, a proibição do casamento inter-racial, a segregação de brancos e negros e a perseguição contra os judeus. Da mesma maneira que hoje não há mais “voto feminino”, nem há mais “casamento inter-racial”, chegará o dia em que não haja mais “casamento homossexual”, porque a distinção resulte tão irrelevante como resultam hoje as anteriores e o preconceito que explicava a oposição semântica tenha sido superado. De fato, nos países em que o casamento homossexual chegou mais cedo, a lembrança das épocas em que era proibido resulta cada dia mais estranha e incompreensível para as novas gerações. A lei também serve para educar.
Acredito que a minha PEC seja a resposta mais adequada do poder legislativo à sentença do nosso STF, que recentemente decidiu que os casais formados por pessoas do mesmo sexo devem ter reconhecidos todos os direitos que a Constituição Federal garante às uniões estáveis. Sabemos que um desses direitos, conforme o art. 226 § 2, é o casamento civil.
O legislativo não pode continuar se omitindo! É a vez do Brasil!
Jean Wyllys é jornalista e escritor, mestre em Letras e Linguística e professor universitário. É o primeiro político gay assumido e comprometido com a causa LGBT que chega ao Congresso brasileiro. Eleito deputado federal pelo estado do Rio de Janeiro em 2010, pertence à bancada do PSOL (Partido Socialismo e Liberdade) e coordena a Frente Parlamentaria Mista pela Cidadania LGBT junto com a senadora Marta Suplicy.
Artigo publicado no jornal Folha de São Paulo, em 31 de agosto de 2011.