Pronunciamento do deputado Ivan Valente – PSOL/SP no Plenário da Câmara em 14/12/2010
“Senhor Presidente, senhoras e senhores Deputados,
No último dia 29 de novembro, a empresa de cosméticos Natura, localizada em Cajamar, São Paulo, demitiu 30 trabalhadores sob a alegação de falta de “orgulho” e “comprometimento” com o trabalho. Esses funcionários sofriam de lesão por esforço repetitivo (LER), uma doença ocupacional que pode chegar a um grau irreversível, com dores intensas e perda significativa da força e da capacidade de movimento dos membros.
Esses trabalhadores demitidos estavam em reabilitação, grande parte deles com cirurgia programada, e trabalhavam em linhas de produção específicas para funcionários em recuperação. Uma dessas linhas, inclusive, foi desativada. A esmagadora maioria dos funcionários dispensados é de mulheres, com idade entre 35 e 44 anos, que adoeceram ao exercer suas funções nas linhas de produção da Natura.
Este fato é reconhecido pela própria empresa, conforme abertura de um Comunicado de Acidente de Trabalho (CAT). Segundo o médico do Sindicato dos Químicos Unificados, entidade que representa a categoria, eram casos crônicos, que necessitam de atenção médica e saúde especializada, em caráter prolongado.
É importante destacar, senhor Presidente, que as doenças do trabalho são regulamentadas pela Lei 8.213 de julho de 1991, como resultado direto da mobilização dos trabalhadores e do conjunto da sociedade por condições dignas de trabalho e relações profissionais. Ao demitir trabalhadores nessas condições, a Natura parece ignorar a legislação trabalhista.
Vale lembrar que a Natura é uma das maiores empresas brasileiras, que não apenas conquistou mercado na América Latina e na Europa mas também iniciou produção terceirizada na Argentina. No acumulado até setembro deste ano, sua receita líquida consolidada foi de mais de R$ 3,5 bilhões, uma ampliação de 22,5% frente o mesmo período de 2009.
Um de seus sócios, Guilherme Leal, durante a campanha eleitoral como candidato a vice-Presidente na chapa de Marina Silva, falou muito da responsabilidade social em seus discursos. No site da empresa é ostentado o slogan “ Bem estar bem”, e são pedidos depoimentos de consultoras (vendedoras) que “ajudam os outros”. “Você ajuda quem está a sua volta?”, questiona o site.
No entanto, os relatos que nos chegam pela diretoria do Sindicato dos Químicos Unificados atestam o flagrante desrespeito às leis trabalhistas pela Natura. Há casos como a demissão de uma funcionária que ficou afastada 8 anos pelo INSS e já fez uma cirurgia no ombro e tem outra programada. A de uma funcionária que teve 4 anos de afastamento pelo INSS e fez duas cirurgias: uma no cotovelo e outra no punho. E ainda outra, 6 anos afastada pelo INSS, 4 cirurgias, 3 na mão direita e uma no cotovelo. Todas estão entre os 30 demitidos da Natura, quase todos na mesma situação precária de saúde.
Fica clara, portanto, a verdadeira política escondida sob o marketing da empresa, que utiliza ao máximo a força de trabalho de seus funcionários, estimulando-os a trabalhar acima de suas possibilidades, vitima-os com doenças ocupacionais, como a LER, e então os demite, alegando falta de comprometimento com o trabalho.
A Natura se nega a reavaliar as demissões, mesmo diante da ilegalidade de sua atitude. E as perspectivas são piores, pois ao todo mais de 60 trabalhadores já foram dispensados sob esta mesma justificativa, e há a ameaça de novos cortes, já que são muitos os funcionários que a empresa fez adoecer e que, por isso, “baixaram seu rendimento”.
É neste sentido, senhoras e senhores Deputados, que denunciamos tamanha agressão aos trabalhadores e repudiamos tal organização do trabalho que adoece e mata pessoas. A atitude da Natura não pode ser aceita como “normal” no mercado de trabalho. É urgente que a legislação trabalhista seja respeitada e que esses trabalhadores e trabalhadoras sejam readmitidos.
Casos como estes precisam ser acompanhados com máxima atenção pela sociedade brasileira, sobretudo quando se trata de uma empresa que arroga em suas campanhas publicitárias milionárias deter a marca da ética e da responsabilidade ambiental e social.
Muito obrigado.”
Ivan Valente
Deputado Federal PSOL/SP