Entrevista – Plínio de Arruda Sampaio ao Correio Brasiliense
Com 60 anos de militância, o pré-candidato à Presidência pelo PSol não abre mão de convicções nem perdoa omissões do PT
Josie Jeronimo
Ele foi companheiro de exílio do tucano José Serra e conta que saía para dançar com Lula, quando o presidente era um deputado constituinte, em Brasília, no fim da década de 1980. Com 60 anos de vida pública, o pré-candidato à Presidência pelo PSol, Plínio de Arruda Sampaio, conferiu de perto grandes cenas da história política brasileira, mas não conhece a pré-candidata petista Dilma Rousseff: “Do ponto de vista político, a candidatura dela é um poste”.
Plínio rejeita o rótulo de candidatura nanica e afirma que apenas PSol, PSTU e PCB apresentam nomes de esquerda na disputa deste ano. Com 44 segundos de tempo de televisão, Plínio tenta reunir as siglas, mas nega que o esforço tenha a intenção de aumentar a inserção. “Não quero tempo de televisão, quero o simbolismo da esquerda unida.”
Empolgado com o Twitter, o socialista de 79 anos se inspira na campanha do presidente americano, Barack Obama, para arrecadar dinheiro pela internet sem precisar recorrer a doações de empresas. A ferramenta é nova, mas o linguajar do pré-candidato remonta à moeda do início do século 20. “Vamos tentar fazer campanha com doação de dez mil réis, quinze mil réis. Obama fez isso e tinha mais dinheiro que todo mundo.”
O pré-candidato do PSOL deixou o PT em 2006, mas não esconde a frustração em ver o partido “sentando à direita do capital”. “Foi a primeira vez que o povo, em 500 anos de história, conseguiu fazer o seu partido. O PT não nasceu em sala acarpetada. A maioria dos petistas é gente muito correta.” Plínio também teve que vencer uma batalha interna no partido para sair candidato, mas afirma que o partido já está cicatrizando as feridas.
Como vai ser o programa de governo apresentado por Plínio de Arruda Sampaio?
Vou mexer nas soluções reais. Todo mundo fala: vou aumentar a verba da educação. Todo mundo sabe que isso é mentira. Eu vou falar em educação pública. Todo mundo fala em aumentar empregos. Não tem condições de aumentar empregos enquanto estiver pagando a dívida. Tem que suspender o pagamento da dívida. As águas estão tranquilas, mas a previsão da meteorologia política não é tão tranquila. Se muda o panorama, o saco de bondades será substituído pelo saco de maldades. É uma campanha anódina, vai discutir quem fez mais assentamentos, o Lula ou o Fernando Henrique, quem é mais bonito, o Lula ou o Fernando Henrique.
O PSol pode se unir ao PSTU e ao PCB para montar uma frente de esquerda?
Estamos fazendo toda a negociação possível para que isso aconteça. Não perdi a esperança de unificar. Acho que deveríamos ir juntos. É difícil abrir mão da minha candidatura, pois a candidatura mais forte é do PSol.
O partido vai aceitar doação de campanha?
De empresa, não. De um empresário individual, se não for comprometido, aceitaremos pouco. Eu já fiz umas 10 campanhas na vida, nunca recebi dinheiro que não possa devolver. Se me pedir um favor, eu devolvo o dinheiro. Vamos tentar fazer a campanha com doação de 10 mil réis, 15 mil réis. Com a internet, tem uma ferramenta forte. Pode fazer a doação pela internet e já tem o recibo e tudo. Igual ao Obama. Ele tinha mais dinheiro na campanha do que todo mundo. Pensa que eu estou no Twitter à toa? Eu sou ‘tuitador’ total.
O senhor foi um dos fundadores do PT. Acha que a escolha de Dilma foi acertada?
Eu não conheço essa senhora. Do ponto de vista político, a candidatura dela é um poste. Pessoalmente, eu a respeito. Mal eu não sei se escolheu. Não sei o que ele (Lula) quer, se quer ganhar ou quer perder. O Juscelino (Kubitschek) fez isso com o marechal (Henrique) Lott. Pôs um candidato para perder e voltar. É verdade que o primeiro time dele (Lula) é complicado, ainda mais com essa história de Ficha Limpa.
Qual a opinião do senhor sobre a decisão do presidente em vetar pontos polêmicos do Programa Nacional de Direitos Humanos?
Foi um espetáculo triste. O Lula voltou tudo para trás e ainda diz que é de esquerda. A vida inteira nós lutamos por todos aqueles pontos. O homem é presidente e abre mão por causa de umas pressõezinhas de uns e de outros, de militares que já estão de pijamas há muito tempo, não têm mais força nenhuma, nem poder de fogo.
Qual a avaliação que o senhor faz do governo Lula?
Eu coordenei o plano de reforma agrária. Eu ajudei no que pude, até o momento que vi que não tinha mais condições. É um governo rigorosamente de direita e que não tinha nenhum compromisso. Fui até o momento que ele abriu o Banco Central. Quando entregou a moeda brasileira para os banqueiros. Eles não são esquerda, eles querem essa tintura de esquerda, que dá um certo charme para o candidato.
A que o senhor atribui a popularidade do presidente?
A três motivos. Para uma boa parte da população, a situação melhorou. Hoje, tem uma quantidade enorme de pessoas com a Bolsa Família que não comem direito, mas fingem que comem. E é melhor fingir que come do que não comer nada. E isso tem efeito de demonstração. O outro efeito de demonstração é o grupo de pessoas que passou a ganhar melhor e entrou na linha de financiamento da linha branca. Esse cidadão está contentíssimo, mas essa mesma gente não vê que está levando a geladeira para casa, mas a escola do filho está um horror. Nem diga se ficar doente. Em São Paulo, é seis meses para conseguir a consulta. Outro motivo é resultado da crise econômica mundial. O capital dos países desenvolvidos não encontra oportunidade de investimento em economias paradas como a europeia. Esse capital precisa ser aplicado, onde ele se aplica? No país que oferece uma das maiores taxas de juros do mundo. O país pegou carona na crise.
O senhor é da esquerda católica. Qual sua opinião em relação ao aborto?
Tem que legalizar o aborto. A clínica tem que fazer o aborto, mas, antes, tem que fazer um procedimento de instrução para a mulher saber o que significa aquilo. A juíza é a mulher. Ninguém defende o filho mais do que a mãe. Ouvi uma série de moralistas da Igreja e de teólogos que disseram que o aborto é perfeitamente compatível com a fé cristã. Esse fundamentalismo abortista é uma excrescência, não tem fundamento real. Acho uma tristeza que tantos católicos estejam perdendo tempo com isso. Eu sou contra o aborto como religioso, como católico minha mulher nunca fez, teríamos problemas seríssimos se ela fizesse, porque sou contra. Mas como homem público, não posso estender a minha fé a quem não tem a minha fé.
O PSol já superou o racha criado durante a escolha do pré-candidato para disputar a Presidência?
O PSol está se unificando vagarosamente depois de uma campanha violentíssima, em que trocamos sopapos lá dentro à vontade, mas o partido está se reunificando. Não estamos discriminando ninguém que foi contra a candidatura. Alguns vêm antes, outros depois. Heloísa Helena ainda não veio, está lá brava, no estado dela.
O senhor sente saudades do PT que ajudou a fundar?
Foi a primeira vez que o povo, em 500 anos de história, conseguiu fazer o seu partido. O PT não nasceu em sala acarpetada. Nasceu do povo, das lutas. Eu falo para o (José) Genoino, não fui eu que saí. Foram vocês que saíram. Eu continuo no mesmo lugar. O PT que se deslocou à direita. Mas a maioria dos petistas é gente muito correta. Eu vou receber muito voto de petista no primeiro turno.