Frei Sergio Gorgen
A cada 10 anos o IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – faz um levantamento, uma pesquisa, indo de casa em casa, para saber como está a vida e a produção no meio rural brasileiro.
O último Censo Agropecuário foi feito em 2006 e publicado em 2009. Esta pesquisa permite fazer um retrato, uma fotografia de como está a vida e a produção na roça e dá para fazer algumas comparações importantes sobre as diferenças entres os grandes e pequenos agricultores, entre o agronegócio e a agricultura camponesa.
Vamos ver alguns números desta pesquisa:
1 – Propriedade e Posse da Terra
Os pequenos agricultores tem 24% de todas as terras privatizadas do Brasil.
Quer dizer, de cada 100 hectares de terras, 24 é de camponês.
Os médios e grandes tem 76% de todas as terras.
De cada 100 hectares , 76 é do agronegócio.
2 – Número de Estabelecimentos – Propriedades, Posses, Lotes.
Os camponeses são mais de 4 milhões e 360 mil estabelecimentos.
Os médios e grandes são apenas 807 mil estabelecimentos.
Os grandes proprietarios acima de mil hecatres são apenas 46.000. E os latifundiários acima de 2 mil ha, são apenas 15 mil fazendeiros que detem 98 milhões de hectares.
3 – O que Produzem:
Os camponeses produzem 40% da produção agropecuária do Brasil (medida peloValor Bruto da Produção Agropecuária Total), apesar de terem apenas 24% das terras, e ainda, nas piores condiçoes de topografia e fertilidade. Alem disso, sabe-se que grande parte da produçao do campones é para auto-sustento, e por tanto não é vendida.
Os médios e grandes produzem 60% da produção agropecuária do país, tendo 76% de todas as terras do país, entre elas as mais planas e ferteis e melhor localizadas para o mercado.
4 – Valor da Produção Por Hectare
1 hectare da agricultura camponesa teve, em média, uma renda de R$ 677,00.
1 hectare do agronegócio teve, em média, uma renda de apenas R$ 368,00.
5 – Quem produz o que o povo Povo Brasileiro Come:
Daquilo que vai para a mesa dos brasileiros, 70% é produzido pelos pequenos agricultores, pelos camponeses.
Só 30% do que vai na mesa dos brasileiros vem das grandes propriedades, que priorizam apenas as exportações, ou seja nao produzem comida, querem produzir apenas “commodities”!
6 – Trabalho para o Povo:
As pequenas propriedades, dão trabalho para 74% de toda mão de obra no campo brasileiro.
As médias e grandes, o agronegócio, mesmo com muito mais terra, só empregam para 26% das pessoas que trabalham no campo. Pois preferem utilizar mecanização intensiva e muito agrotoxicos. Por isso, o Brasil se transformou na safra de 2008/2009 no maior consumidor mundial de agrotoxicos. São aplicados 700 milhões de litros de veneno por ano!
7 – Quantas pessoas trabalham por Hectare:
Na agricultura camponesa, em cada 100 hectares , trabalham 15 pessoas.
No agronegócio, em cada 100 hectares , dão emprego para apenas 2 pessoas (média real de 1,7 pessoas/ha).
8 – Os recursos do Crédito Agrícola :
Os valores do crédito não estão no Censo Agropecuário, mas no Plano Safra. No Plano Safra 2009/2010 foram destinados R$ 93 milhões para o agronegócio. E 15 milhões para a agricultura camponesa. Mesmo assim, sabe-se que apesar da crescente oferta de recursos para a agricultura camponesa, apenas 1,2 milhoes de estabelecimentos familiares tem acesso ao credito, e na ultima safra utilizaram apenas 80% do que esta disponivel.
Isto significa que os camponeses utilizam apenas 14% do crédito agrícola total ofertado pelos bancos, atraves das normas e determinações da politica do governo federal.
Resumo comparativo entre os dois modelos de agricultura vigentes no Brasil
Os Camponeses O agronegócio
– 14% do Crédito – 86% do crédito rural
– 24% das terras – 76% das terras
– 40% do valor total da produçao vendido – 60% do valor total da produçao vendida
– 70% da produção total de comida do país – 30% da produção total de comida do país.
– 74% da mão de obra da agricultura brasileira – 26% da mão de obra na agricultura brasileira.
PERSPECTIVAS SE HOUVESSE UMA REFORMA AGRÁRIA MASSIVA
Usando os dados do Censo 2006 podemos fazer uma projeção de como poderia ser o Brasil se houvesse uma Reforma Agrária, massiva, que democratizasse a propriedade e posse da terra e reorganizasse a produçao agricola para o mercado interno.
Tomando como base só os Estabelecimentos acima de 1.000 hectares .
Com mais de 1.000 hectares são apenas 46.911 estabelecimentos.
Ocupam uma área de 146.553.218 hectares , isto é, mais de 146 milhões de hectares. Dá uma média de 3.125 hectares por propriedade.
Agora vejamos como ficaria esta terra que agora pertence a apenas 47 mil grandes proprietários, se fosse distribuída em lotes com tamanho médio de 50 hectares por família?
– Seriam criados 2 milhões e 920 mil novos estabelecimentos agrícolas, ou seja, quase 3 milhões de novas familias de camponeses.
– Contando que a agricultura camponesa ocupa 15 pessoas a cada 100 hectares , esta reforma agrária criaria trabalho para mais 21 milhões de pessoas, ao contrário de 2 milhões e 400 mil criados hoje através do agronegócio. Que alem do mais, trabalham como assalariados pro agronegocio, recebendo salarios ridiculos, muitas vezes apenas temporarios, e sem direitos trabalhistas ou previdenciarios.
– Tomando em conta que na agricultura camponesa, cada hectare gera uma renda média anual de R$ 677,00, a renda gerada nas áreas distribuídas produziria uma nova riqueza no valor aproximado de R$ 99 bilhões por ano.
É só comparar. O latifúndio e o agronegócio não trazem beneficios para a sociedade brasileira, nem social, nem economicamente, e muito menos é sustentavel ambientalmente. Pois o sua matriz tecnologica é altamente destruitiva pelo uso intensivo de agrotóxicos.
Uma Reforma Agrária que atingesse apenas os estabelecimentos acima de 1.000 hectares , preservando os médios proprietários, geraria muito mais trabalho, produção, renda e desenvolvimento para todos os Brasileiros.
Frei Sergio Gorgen, membro do MPA e da via campesina Brasil,
Assentamento de Hulha Negra-RS, dezembro de 2009.