Do jornal Valor Econômico
Sergio Zacchi/Valor
Paulo Ferreira, do PT: “Vai criar dificuldade na relação que estava sendo saudável entre empresas e partidos”
PT, PSDB e DEM uniram-se ontem contra resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que tenta inibir a chamada “doação oculta” de campanha a partir das eleições deste ano. O tema foi um dos pontos mais criticados na minirreforma eleitoral, aprovada no ano passado no Congresso.
Os três partidos entraram com petição no tribunal pedindo alteração no texto do TSE, de autoria do ministro Arnaldo Versiani, responsável pelas resoluções que vão orientar as eleições neste ano.
A resolução, em fase de audiência pública, acaba com a triangulação na qual o doador somente identifica como beneficiário o comitê financeiro do partido, sem identificar o candidato beneficiado. Atualmente, os partidos atuam como “doadores” das campanhas ao arrecadarem doações e repassarem aos comitês.
Os financiadores que doam diretamente aos comitês são identificados com os respectivos valores um mês depois das eleições. Ao fazerem a doação aos partidos, que a repassam aos comitês, os financiadores se resguardam de terem seus nomes e valores identificados a candidatos. Uma vez por ano, os partidos fazem sua prestação de contas à justiça eleitoral mas, nesta ocasião, os doadores são relacionados sem especificação de candidaturas caso tenham feito doação a comitês.
Será obrigatório a candidatos, comitês financeiros e também a partidos políticos a abertura de conta bancária específica para registrar toda a movimentação financeira da campanha, inclusive dos recursos próprios dos candidatos e do dinheiro arrecadado com venda de produtos ou realização de eventos. A atual Lei Eleitoral atribui apenas ao comitê financeiro e ao candidato o controle dos recursos de campanha.
A resolução do TSE ainda estabelece a identificação de todos os doadores com a entrega de recibo pelos partidos ou candidatos. O tribunal propõe limites de valores das doações, em tentativa de evitar distorções, como os “doadores laranjas”. Empresas só poderiam doar o correspondente a 2% do seu faturamento bruto anual, enquanto pessoas físicas doariam até 10% da renda bruta. O TSE prevê multa caso tais limites sejam ultrapassados no valor de cinco a dez vezes a quantia em excesso. Empresas que doarem além do limite previsto ficarão proibidas de participar de licitações públicas e de fechar contratos com o poder público durante cinco anos.
O secretário de Finanças do PT, Paulo Ferreira, diz que as empresas que costumam fazer doações de campanha preferem ter “relações institucionais com o partido” e a resolução é “inexequível” devido à obrigatoriedade da prestação de contas individual, seja de empresas ou de pessoas físicas. “Os partidos não conseguirão fazer essa contabilidade e a consequência vai ser o incentivo à prática do caixa 2. Vai criar dificuldade na relação que estava sendo saudável entre empresas e partidos”, afirma. O secretário de Finanças do PT diz que a exigência do TSE vai duplicar a estrutura de prestação de contas se o novo prazo eleitoral proposto for aprovado, que passa a ser de apenas 30 dias após as eleições para os partidos.
O procurador regional eleitoral de São Paulo Luis Carlos Gonçalves criticou a iniciativa das três legendas. “Os partidos estão buscando brechas na resolução, que é positiva. Quando o doador é identificado, é possível rastrear eventuais interesses que, nos moldes da lei, podem ficar ocultos”, afirma o procurador.
Para Gustavo Kanffer, advogado do PSDB, o resultado seria uma maior burocratização do processo de prestação de contas, pois os comitês financeiros já são de responsabilidade do partido. “Em vez de transparência, a medida gera mais trabalho. Sobrecarregará sistemas contábeis e pessoal, tanto para os partidos quanto para o próprio TSE”, afirma Kanffer, para quem o ideal seria o tribunal regulamentar a publicação de balancetes mensais. “Estamos apelando para a sensibilidade dos ministros do TSE tendo em vista as dificuldades práticas da resolução”, explica o advogado do DEM, Fabrício Medeiros. Além do prazo mais curto para a apresentação das contas dos partidos, Medeiros reclama da regra que obriga a identificação de todos os doadores, especialmente de pessoas físicas. “O problema maior será identificar de onde o doador está vindo”, diz.
Segundo a resolução do TSE, os partidos que já arrecadaram recursos a partir de 1º de janeiro deste ano terão um prazo, após a publicação da instrução, para transferirem tais recursos para as contas que serão abertas.
Matéria publicada n jornal Valor Econômico do dia 05/2/2010