Entrevista com Ivan Valente na Agência Câmara
Reconduzido ao cargo de líder do Psol, o deputado Ivan Valente (SP) disse que a bancada pretende apresentar uma emenda ao projeto da Ficha Limpa (PLP 518/09) para evitar que integrantes de movimentos sociais condenados na Justiça se tornem inelegíveis. Para ele, uma pessoa que participa de greve ou de luta no campo não pode ser equiparada "a quem roubou milhões".
O Ficha Limpa e outros nove projetos que alteram a Lei de Inelegibilidade (Lei Complementar 64/90) serão analisados por uma comissão, criada após acordo de líderes. A previsão é que a proposta final seja enviada ao Plenário em março.
O parlamentar também aponta como prioridade do Psol, neste ano, a votação da PEC 349/01 (que acaba com as votações secretas no Legislativo), da Política Nacional de Assistência Farmacêutica e de projetos que considera benéficos para os trabalhadores – como a PEC 231/95, que reduz a jornada de trabalho de 44 para 40 horas semanais.
Aos 63 anos, Valente está em seu quarto mandato de deputado federal. Iniciou sua vida partidária no PT, em 1980, e filiou-se ao Psol em 2005. Paulistano, é formado em Matemática e em Engenharia Mecânica.
Agência Câmara – Quais são as prioridades do partido em 2010?
Ivan Valente – Lideramos a Frente Parlamentar pelo fim do voto secreto nas votações e essa proposta de emenda constitucional já está para ser votada em segundo turno há quatro anos (a PEC 349/01 foi aprovada em primeiro turno por unanimidade em 2006). Ontem (3), colocamos novamente para os líderes e para o presidente que isso deve ser votado imediatamente. No campo da saúde, temos insistido na votação da Política Nacional de Assistência Farmacêutica, um substitutivo nosso que está há dez anos na Mesa para ser votado, com o apoio de todos os setores da saúde pública do Brasil. Além disso, entendemos que, neste ano eleitoral, temos que dar respostas aos trabalhadores em primeiro lugar, porque a crise econômica deu respostas aos empresários, dando isenções de impostos, emitindo títulos públicos para socorrer agronegócio, bancos, empreiteiras. Estão para ser votados o reajuste dos aposentados vinculado ao aumento do salário mínimo, o fim do fator previdenciário, a jornada de trabalho de 40 horas. Entendemos, ainda, que o principal problema a ser discutido no Brasil continua sendo o pagamento dos juros da dívida pública.
Agência Câmara – A oposição tem um papel especial neste ano eleitoral, na Câmara?
Ivan Valente – Existem duas oposições aqui. Uma de direita, conservadora, que já governou o Brasil e defende as privatizações, as terceirizações, o Estado mínimo. E tem uma outra oposição, da qual fazemos parte, que é de esquerda e quer retomar um projeto transformador para o País. Então o que existe é uma disputa de projetos. O nosso papel, como oposição de esquerda, é retomar um projeto nacional de desenvolvimento, garantir que o povo brasileiro possa ter protagonismo e defender que os movimentos sociais tenham legitimidade, e não sejam criminalizados.
Agência Câmara – A bancada vai defender uma reforma eleitoral mais ampla ou a discussão será focada no projeto da Ficha Limpa?
Ivan Valente – Defendemos há muito tempo não só o projeto da Ficha Limpa, como também o financiamento público exclusivo de campanha. O problema é que não conseguimos, na Câmara, fazer uma reforma política de verdade. Toda vez que há eleições, fazemos uma maquiagem eleitoral. O Ficha Limpa é um avanço. A única preocupação nossa é não fazer injustiça com aqueles que lutam com o povo e às vezes são processados. Mas a grande maioria é processada por corrupção, peculato, lavagem de dinheiro, e isso precisa ser brecado mesmo. Então nós defendemos a aprovação do projeto.
Agência Câmara – Do projeto como está ou o partido pretende propor mudanças no texto?
Ivan Valente – O partido defende o projeto, mas fará apenas uma ou outra emenda para não criminalizar os movimentos sociais. Porque, se alguém participa de uma greve, de um processo de luta no campo e a Justiça brasileira conservadora condena essa pessoa – pela luta legítima pela terra, pela vida, pelo direito ao salário -, ela também não poderia concorrer às eleições. Essas pessoas estão sendo equiparadas a quem roubou milhões, a quem pratica crimes diariamente contra o patrimônio público, contra a ética na política. Faremos apenas uma emenda que exclua os lutadores sociais dessa lei.
Agência Câmara – Com relação aos projetos do pré-sal, qual será a posição da bancada na questão da distribuição dos royalties?
Ivan Valente – Na verdade, a questão principal do pré-sal não era a distribuição dos royalties. Era a questão de aproveitar o dinheiro dessa riqueza para o desenvolvimento econômico, para liquidar com as desigualdades regionais, para um processo de larga distribuição de renda. O que está acontecendo é uma deformação: a principal questão virou a distribuição de royalties porque tem muitos interesses políticos. O Psol vai defender a proposta que seja a mais igualitária dentro de uma lógica de acabar com as disparidades regionais e distribuir a renda, mas também de garantir que o Estado tenha condições de fazer investimentos de profundidade para resolver gargalos de infra-estrutura e para garantir um salto de qualidade na educação e na saúde pública.