Segue o documento aprovado no Encontro Nacional de Comunicação do PSOL realizado no Rio de Janeiro, nos dias 27, 28 e 29 de novembro de 2009
27, 28 e 29 de novembro de 2009
Sindisprev, Rio de Janeiro/RJ
A comunicação tem hoje um caráter estratégico na agenda da luta anticapitalista no Brasil e no mundo. Setor de intensa exploração pelo capital, de grande concentração da propriedade e dos meios de produção, a mídia serve ainda como aparelho ideológico das classes dominantes no país. Para tal, veiculam o pensamento único, criminalizam os movimentos contra hegemônicos e reforçam modelos históricos de opressão. A luta pela democratização da comunicação e pelo controle popular dos meios é, portanto, fundamental para o PSOL no bojo de seu projeto transformador.
Neste ano, as pautas e reivindicações acumuladas na luta pela democratização da comunicação ganharam destaque ante o contraditório processo para a I Conferência Nacional de Comunicação (Confecom). Por um lado, a realização da conferência atende a uma reivindicação dos movimentos sociais de constituição de instrumentos de controle social para a área, abre uma arena formal de debate sobre a temática e possibilita a reflexão em torno do sistema de comunicação vigente em nosso país a partir dos projetos distintos para o setor que se enfrentam cotidianamente. Com isso, tem potencial para gerar um saldo organizativo e de unificação de bandeiras no movimento – um ganho para as lutas que extrapola os limites da conferência.
Por outro lado, a dinâmica imposta pelo oligopólio de comunicação e aceita sem qualquer resistência pelo governo desfaz o sentido de uma conferência que deveria se voltar a participação e ao protagonismo popular. O processo, posto dessa forma, limita as possibilidades de avanços reais de políticas públicas no sentido da democratização e corre o risco de se tornar apenas um grande fórum que repita o que já é negociado diária e diretamente nos gabinetes entre oligopólio e governo. Deste modo, a Confecom se insere ainda numa política de conferêncismo que opera a capitulação de setores sociais implementada pelo Governo Lula em uma dinâmica que substitui o necessário pelo “possível”. O que antes era reivindicado como necessário pelos movimentos sociais passa a ser apresentado como possível do ponto de vista de uma governabilidade submetida. Nesta lógica, áreas como a comunicação e cultura são divididas, impondo processos institucionais distintos via conferências que dividem a militância e atropelam as reivindicações.
Neste complexo cenário, o PSOL, enquanto um partido socialista, deve defender os interesses da classe trabalhadora, sem se abster de fazer o debate necessário e sem aceitar falsas vitórias – sejam pequenas ‘migalhas’ pinçadas do conjunto das reivindicações que não alteram a estrutura de monopólio dos meios de comunicação no Brasil, seja colocando avanços empresariais, devidamente inseridos na lógica do capital, travestidos de avanços também para a classe.
Neste sentido, o partido defende medidas que tenham coerência com a luta da classe trabalhadora e que tragam avanços reais para a democratização das comunicações no Brasil, apesar de compreender as limitações que um processo dentro da ordem burguesa como este, desenhado para a manutenção e não para a mudança da estrutura do sistema, traz.
Alguns princípios devem nortear as políticas públicas nesta área. O PSOL entende que a universalização gratuita do acesso à internet banda larga é essencial e deve ser feita com a retomada do sistema Telebrás e a estatização das empresas de telecomunicações. É preciso entender que o espectro de radiofrequência deve ser da população e, portanto, com concessões 100% públicas ou dividido entre público e estatal (80% público e 20% estatal).
Precisamos compreender que certas demandas são falaciosas no que diz respeito à construção de uma nova ordem societária. A disputa pela verba publicitária estatal, por exemplo, pode comprometer a unidade e a autonomia dos movimentos, ainda mais em um momento de ampla cooptação dos setores que historicamente construíram a luta dos trabalhadores no país. A cooptação dos meios através da injeção de recursos não se dá apenas na esfera do grande capital.
Nesse sentido, é necessário definir critérios legais para publicidade oficial, a fim de promover a pluralidade e diversidade de veículos e impedir seu uso político tanto por governos quanto por meios de comunicação. Para tal a publicidade deve ser permitida somente para campanhas estatais e de interesse público, sendo proibido o uso de verba pública para a propaganda governamental.
Entretanto, o partido entende que, apesar do seu papel de defender um programa anticapitalista também nas comunicações, esta luta não será esgotada dentro do processo conferencista, ainda mais nos marcos colocados. Na Confecom, o PSOL entende a importância da unidade com os atores que compartilham um projeto pela democratização da comunicação e, para tal, se soma na defesa de medidas comuns que avançam na construção de uma comunicação democrática e que podem gerar um saldo positivo para a luta no próximo período.
Algumas propostas encampadas pelo PSOL para a primeira Confecom:
- Criação de um Plano Nacional de Comunicação que garanta a democratização da comunicação no país e a apropriação desta pela população. Este plano deve abarcar medidas como o apoio às alternativas de comunicação popular, universalização do acesso gratuito à internet, estímulo à produção de conteúdo livre e independente e à leitura crítica da mídia.
- Tornar o Conselho Nacional de Comunicação deliberativo, desvinculá-lo do Congresso Nacional para torná-lo um instrumento de controle social com participação por meio de processo eletivo de representantes da sociedade civil e do poder executivo federal, com funcionamento autônomo, deliberativo, nos moldes do Conselho Nacional de Saúde. Este órgão seria responsável pela regulamentação específica, regulação, processamento das outorgas relativas aos diversos serviços, fiscalização e pelas ações de fomento referentes ao setor, contemplando os serviços, a infra-estrutura e o conteúdo, para isso requer financiamento adequado. Sua estrutura contaria, por exemplo, com escritórios regionais em todo o país.
- Criação de um Fundo Nacional composto por recursos públicos previstos no orçamento da União e com recursos advindos da tributação da publicidade privada e da venda de televisores para financiamento do sistema público de emissoras comunitárias de rádio e televisão, veículos alternativos impressos e online e demais projetos de comunicação comunitária, livre, popular e alternativa.
- Buscar a divisão do espectro eletromagnético (canais de rádio e TV) entre emissoras públicas, privadas e estatal. O PSOL entende que é preciso estar ao lado dos atores que defendem a divisão igualitária (1/3) para cada um dos setores e que defendem a divisão de 40% para emissoras privadas, 40% para emissoras públicas e 20% para emissoras estatais e que apenas a conjuntura poderá definir qual a melhor estratégia na Confecom, na perspectiva de caminhar para uma comunicação majoritariamente pública.
- A comunicação pública e estatal – como as TVs comunitárias, universitárias, legislativas e do judiciário – devem funcionar, no mínimo, nas mesmas condições de visibilidade que a privada. Isso significa, por exemplo, funcionar em sinal aberto e em todo território nacional.
- Fomento a iniciativas que instrumentalizem a população a fazer uma análise crítica dos meios de comunicação. Para isso, incluir matéria de estudo crítico da mídia nas Diretrizes Curriculares Nacio
nais da Educação Básica e criação de cursos de comunicação comunitária nas universidades públicas. - Criar mecanismos de denúncia e punição, via Conselho Nacional de Comunicação Social, da criminalização da pobreza, dos movimentos sociais e de grupos historicamente marginalizados e/ou oprimidos nos meios de comunicação.
- Efetivar um plano nacional de universalização da banda larga em regime público criado via Decreto presidencial.
- Transformar espaços públicos como escolas municipais, bibliotecas e casas de cultura em pontos de mídia, equipando esses espaços com estúdios de TV, rádio e internet, para produções digitais e audiovisuais que estimulem a produção e difusão de conteúdos não discriminatórios e não estereotipados.
- Destinar uma cota dos recursos do Fundo Nacional de Comunicação para estimular a formação de comunicadores populares e a criação de veículos de comunicação nos bairros e comunidades a fim de promover a autonomia e o direito da população neste campo. O fundo será alimentado por taxação do lucro das empresas de comunicação e da venda de televisores maiores que XX polegadas.
- Revisão geral das concessões atuais de radiodifusão analisando o processo de outorga e as concessões realizadas em processo de auditoria. Neste processo, rever também as concessões de rádios e TV`s comunitárias desvirtuadas em muitos casos. Devem ser criados critérios e obrigações a serem observados pelas rádios comunitárias para a renovação das autorizações já concedidas de forma a impedir que defensores de interesses privados se encaixem na regulação.
- Defender o fim de qualquer processo de criminalização dos radiodifusores comunitários, inclusive com a entrega dos equipamentos que foram apreendidos em ações da Anatel articuladas com a Polícia Federal e anistia de todas as pessoas que são processadas por esse motivo.
- Regulamentar a proibição a monopólios e oligopólios, prevista no Artigo 220 da Constituição Federal, constituindo mecanismos para evitar a concentração horizontal (um grupo deter várias operadoras da mesma plataforma), vertical (um grupo controlar várias etapas da cadeia – produção, programação, empacotamento, distribuição) ou cruzada. No primeiro caso, considerar, de forma isolada ou combinada, os critérios de propriedade e controle (mantendo os limites nacionais de até 5 emissoras na faixa VHF e estaduais de até 2 estações), cobertura, participação na audiência e participação no mercado publicitário. No segundo caso, proibir que um mesmo grupo privado tenha participação em mais de uma destas atividades: produção de programas, programação e distribuição/provimento. No terceiro caso, proibir que um mesmo grupo explore dois serviços diferenciados.
- Fim da publicidade estatal, com garantia da gratuidade do informe de utilidade pública.
- Financiamento público da transição para a transmissão digital dos meios de comunicação pública/alternativa.
- Regular para que a multiprogramação não seja mais um instrumento de oligopolização da comunicação no país, levando a cabo a Ação de Inconstitucionalidade do decreto que regulamenta a TV digital no Brasil.
- Garantir a distribuição pública de mídias impressas dando fim à dependência em relação às grandes empresas que monopolizam o setor de distribuição de comunicação impressa.
- Regulamentar e defender os direitos dos trabalhadores da comunicação, independentemente do local de trabalho e da atividade específica. A regulamentação deve ser construída em processo de consulta e diálogo com a classe trabalhadora das diferentes categorias profissionais da comunicação.
- Garantir a acessibilidade nos veículos de comunicação, sendo que as organizações das pessoas com deficiência devem traçar a estratégia para isso.
Comunicação interna e externa do PSOL
Apesar do capítulo que trata sobre a comunicação no estatuto do PSOL ser bom, muito pouco é realmente implementado. Há consenso no setorial de que a comunicação do PSOL, tanto a interna quanto a externa, é muita falha. De maneira geral, não há uma política de comunicação estratégica do partido e no partido. Não há publicação consistente de nenhum tipo e as ferramentas eletrônicas, como o site, não passam de um “diário oficial” muito limitado.
Obviamente, há um momento político no partido – talvez desde sua origem – que dificulta a instituição de uma política de comunicação institucional e a divisão em correntes foi apontada como um dos fatores que emperram o processo e impõe uma lógica competitiva e divergente. Um exemplo foi o programa do partido na TV, fracionado, sem uma linha discursiva construída de maneira tática para defender nossas bandeiras.
Cada corrente, diretório, liderança, mandatos tem sua comunicação própria e elas não se somam para criar uma comunicação de conjunto. Cabe às correntes pensar em avançar num instrumento comum e ter este compromisso com o conjunto do partido. Por outro lado, dado o caráter estratégico da comunicação na luta de classes, a política do PSOL nesta área precisa ser melhor formulada e a direção deve se apropriar deste tema, bem como criar ferramentas garantidoras para tal.
Em relação à comunicação interna, avaliou-se que esta é falha, para não dizer inexistente. É praticamente impossível que um militante se mantenha informado se não estiver ligado a alguma corrente.
Como se não bastasse, o PSOL não se apoderou de instrumentos importantes proporcionados pela convergência e inovação tecnológica. Tampouco utiliza veículos de comunicação para apoiar a política de formação de militantes.
Na tentativa de superar estes problemas, tendo em vista que a autocrítica é importante, o setorial de comunicação levantou algumas propostas. São elas:
- Buscar uma lógica de comunicação contra-hegemônica e produzida pelo conjunto da militância em sistema de colaboração em rede e construção coletiva. Para isso, é importante mapear os profissionais da comunicação que militam no partido (jornalistas, publicitários, radialistas, chargistas etc) e que podem contribuir.
- Buscar manter contato e trabalhar de forma conjunta, o secretário nacional de comunicação, os demais secretários estaduais e o setorial.
- Debater o objetivo do jornal para readequá-lo à necessidade do partido e redefinir sua produção e distribuição.
- Criar um boletim oficial eletrônico da direção do partido e da executiva nacional e estaduais.
- Criar política de formação dos militantes utilizando as mídias como suporte.
- Elaborar uma cartilha com as políticas do PSOL na área da comunicação e buscar a viabilização de sua impressão e distribuição por meio da Fundação Lauro Campos. Também divulgá-la nos meios eletrônicos.
- Em toda comunicação partidária considerar que o conhecimento e a informação não são mercadorias, logo não devem ter direitos reservados e sua distribuição deve ser a mais ampla possível, no sentido de socializar nossas formulações. Neste sentido, o partido deve defender e encampar uma política de padrões abertos de comunicação.
- Traçar uma estratégia para os programas de televisão e rádio do partido consensuada entre as correntes. Para isso, o programa eleitoral deve ser usado como referência.
- Os setoriais precisam ter espaço no site do partido. O setorial propõe também a criação de blogs.
- Planejar a comunicação e identidade do PSOL para traçar a estratégia de atuação junto a grande mídia e com a população em geral.
- Refle
tir sobre a linguagem utilizada nas mídias internas e externas do partido para dialogar sobretudo com a população em geral. - Estabelecer pautas que sejam consenso entre as correntes para discutir com a população por meio de campanhas de comunicação. Exemplo: criminalização da pobreza, CPI da dívida, ecossocialismo, etc.
- Oferecer oficinas de produção de comunicação independente no interior do partido.
- Criar ferramentas de comunicação, como um portal de notícias, não diretamente vinculadas ao partido.
- Explorar as diferentes formas de comunicação, extrapolando os limites do texto. Exemplo: melhor utilização de arte gráfica e charges.
- Buscar manifestações culturais como forma de comunicação. Exemplos: exposições fotográficas, mostras e produções audiovisuais, grafite, música, poesia, teatro e outras artes.
- Valorizar a regionalização da cultura e das informações, fugindo da reprodução de maior importância dada tradicionalmente ao eixo sul-sudeste.
- Criar um manual de identidade visual do PSOL e colocar no site, para haver padronização.
- Preocupar-se com a forma/estética dos materiais de comunicação produzidos tanto quanto com seus conteúdos.
- Fazer campanhas de propaganda que agendem publicamente a pauta política do partido.
- Formular uma política para criação de memória dos movimentos sociais e dos trabalhadores que têm intersecção com a política do partido.
Compreendendo que para a construção da política de comunicação, é preciso ampliar a interlocução do setorial junto às direções estaduais e nacional do partido. Para avançar em sua organização, o setorial de comunicação propõe:
- Realização de uma reunião mensal do setorial via internet toda primeira quarta do mês às 22 horas.
- Organização de uma coordenação executiva nacional (Rafael D´Oliveira (RJ), Álvaro Neiva (RJ), Pedro Ekman (SP), Marina Pita (SP), Max Correa (PA) e Bruno Marinoni (CE)). Esta coordenação tem caráter executivo, e não político, e buscará encaminhar as atuações do setorial.
- A partir de conversas com a direção do PSOL, serão criados grupos de trabalho de temas específicos para colocar em práticas as propostas apresentadas pelo setorial ou demandas colocadas pela militância.
- O setorial se reunirá durante a Confecom, com indicativo do dia 14. Álvaro é responsável por garantir a reunião.
- Elaborar uma cartilha sobre democratização da comunicação, com perspectiva de criação de um grupo de trabalho.
- Nos Estados, fazer reunião do setorial para repercutir os debates do encontro, fazer diagnóstico regional da militância em comunicação.
- Utilizar melhor a lista, mandar informes das ações de luta.
- Preparar material político para Confecom, se apresentar como partido. Produzir faixa e folder impresso (sob responsabilidade da coordenação).
Relação entre partido e movimentos sociais da comunicação
Em relação à atuação do setorial, e do partido como um todo, na luta pela democratização da comunicação, é importante avaliar a conjuntura do movimento hoje e mapear quais os espaços existentes de intervenção e como agir em relação a eles. Nesse sentido, debateu-se a inserção de nossos militantes no movimento estudantil, sindical e popular. Também a relação de nossos militantes com os outros atores que estão se organizando em torno da Conferência Nacional de Comunicação. Propostas:
- Na Confecom o elemento norteador para alianças deve ser a afinidade em torno do projeto e propostas apresentadas, principalmente em relação aos pontos prioritários estabelecidos pelo PSOL para a conferência, elencados neste encontro.
- A avaliação é que o momento posterior a Confecom é ainda mais importante no sentido de fortalecer um grupo orgânico da esquerda na luta pela democratização da comunicação. Para tal, é preciso envolver setores que apresentaram uma intervenção à esquerda na Confecom e também aqueles que ficaram de fora deste processo, como o MST, MTST, entre outros. Para manter a articulação entre estes atores, propõe-se manter as comissões pré-conferências nos Estados onde for possível, chamando novos atores da esquerda para o processo, na perspectiva de construir uma ferramenta alternativa ao FNDC e verdadeiramente de luta.
- Em relação à FENAJ, o espaço de intervenção do PSOL é na oposição, o movimento Luta FENAJ, dada a cooptação da federação e de seus dirigentes pelo Governo Federal e empresários.
- Fortalecer a interação entre entidades nas quais o PSOL milita na área da democratização da comunicação, como Intervozes, Enecos e Luta FENAJ.
- Na ENECOS, os militantes do PSOL devem buscar se apresentar com unidade.
- O PSOL precisa ainda ampliar sua atuação nas lutas que extrapolam os espaços institucionais, construindo uma estratégia de intervenção política na comunicação popular.