Escrito por Waldemar Rossi
28-Nov-2009 – Correio Cidadania
É raro o dia em que, abrindo os jornais do país (sejam eles da mídia conservadora, sejam dos poucos jornais de esquerda), não encontramos notícias sobre a atuação das máfias, que, se já existiam antes, prosperaram muito mais a partir da ditadura militar, e que continuam a prosperar nesses novos tempos em alta velocidade.
Há aquelas que são desmascaradas, como as do "sanguessuga", do "cuecão", do "mensalão", dos "aspones" nomeados pelos seus padrinhos, ganhando altos salários sem trabalhar. Esses casos reaparecem constantemente na imprensa porque não mexem com os gordos interesses das grandes empreiteiras, por exemplo, mas servem de aquecimento para a venda de jornais e revistas. Ainda hoje, 27/11/09, deparo com mais uma: a máfia da merenda escolar do estado de São Paulo. Esta última informação revela como empresas, mancomunadas com políticos municipais e possivelmente com gente do governo do estado, se organizam para roubar o dinheiro e com ele enriquecerem seus proprietários e políticos – políticos que foram eleitos para defender os interesses populares.
Mas há muitas outras, porém, que não são catalogadas pela mídia como máfias. Muitas delas são mantidas em sigilo porque são patrocinadoras dos órgãos de comunicação. Compram o silêncio da mídia com caras publicidades diárias. Peguemos o caso do acidente que atingiu um trecho do rodoanel, em construção em torno da cidade de São Paulo. Os fatos mostram que as empresas responsáveis pela obra terceirizaram seus trabalhos e concordaram com a redução de material a ser empregado a fim de baratear a obra e, assim, aumentar seus já fabulosos lucros. Se analisarmos bem o fato e buscarmos casos semelhantes em obras do estado, confrontar-mos-emos com outro grave acidente: o desmoronamento de uma estação do metrô na região de Pinheiros.
Constatado o mesmo procedimento: reduzir o emprego de material para baratear a obra, a fim de aumentar os lucros. No primeiro caso, pessoas ficaram feridas e, por "milagre", não houve mortes. No caso da estação do metrô, infelizmente para os operários não se repetiu o "milagre": gente morta.
Nos dois casos, já de cara a perícia mostrou que houve adulteração do projeto e apontou os responsáveis. Mas em nenhum momento a mídia fez questão de ligar os fatos revelando o mesmo procedimento em ambos os casos e, inclusive, que algumas empresas envolvidas estão presentes nas duas obras.
Obras que foram contratadas pelo governo paulista e que, apesar da gravidade do fato – já que os usuários das duas obras correrão riscos com possíveis futuros acidentes -, no caso do metrô ninguém verdadeiramente responsável foi punido, as empresas não tiveram os contratos suspensos, como deveria ocorrer se justiça fosse feita e a ética respeitada, malgrado o grau do crime contra a vida do povo. Alguém acredita que no caso do rodoanel haverá punição? Onde está a responsabilidade do senhor governador e seus secretários? Como vai se comportar a justiça diante desse atentado contra os interesses e a vida dos futuros usuários?
A máfia, no caso, envolve empresas, governo e, ainda que indiretamente, a própria mídia que, embora caminhe na revelação dos acidentes, não faz a relação mafiosa como o faz no caso dos escândalos do Congresso Nacional. Divulga detalhes muitas vezes com versões diferentes sobre as causas dos acidentes lançando confusão na cabeça do povo – isto enquanto o fato lhe der manchete, venda de jornais ou "Ibope". Depois se cala. Alguém pode dizer que o caso do metrô foi levado adiante? O fato já morreu.
Operários também e todos estão enterrados. Esse, aliás, o destino das falcatruas que estão presentes em todos os contratos de obras entre governos estaduais, municipais, entre o governo federal e a máfia das empreiteiras que, ao lado da máfia do latifúndio, manda e desmanda nas políticas públicas brasileiras. Matar e enterrar o fato para que o povo dele se esqueça. E, para garantir que seus interesses não serão afetados, as empresas compram o silêncio também dos políticos com gordas propinas que custeiam suas campanhas eleitorais.
Enquanto isto, alguns movimentos sociais que se dizem representantes dos interesses populares, tendo alguns dos seus representantes pendurados nos cabides oficiais e bem remunerados, permanecem em silêncio comprometedor porque não pretendem "ser empecilhos" aos governantes, seus patrões. Com isto garantem suas mamatas!
Felizmente vamos percebendo reações populares que vêm ocorrendo com maior freqüência a partir das bases sociais: greves vêm ocorrendo com maior intensidade em várias áreas da atividade assalariada, movimentos pela punição de políticos envolvidos em crimes das mais variadas naturezas estão ocupando espaços na vida da nação, debates se fazem em torno dessas e de outras questões em universidades e escolas secundárias. Enfim, nem tudo está definitivamente morto neste país.
Mas é preciso intensificar o processo de esclarecimento do povo, utilizando para isto todos os meios disponíveis e buscando criar outros. Debates em comunidades e escolas, multiplicação de grupos culturais de protesto, organização de pequenos, mas atuantes grupos locais para defesa das suas reivindicações, criação de pequenos jornais comunitários, reprodução de notícias em panfletos… São passos possíveis e que poderão alavancar um movimento de protestos ainda maior, capaz de abalar a confiança dos exploradores do povo e fazer renovar as esperanças, a organização e a ação coletiva das forças populares.
Waldemar Rossi é metalúrgico aposentado e coordenador da Pastoral Operária da Arquidiocese de São Paulo.