Por Pedro Fuentes
Tegucigalpa, 1 de outubro de 2009
Ontem foi um dia marcado pela repressão policial. Começou na madrugada, com a desocupação das dependências do INA – Instituto Nacional Agrário, que haviam sido ocupadas, desde o primeiro dia do golpe, por campesinos e trabalhadores desse órgão estatal. Os campesinos o haviam feito para cuidar que seus títulos de propriedade não fossem falsificados. Hipocritamente, seu novo chefe, um ruralista latifundiário, disse que os chama para o diálogo para efetivar as entregas dos títulos. Essa é a política do governo, fala de diálogo, mas mete pau na resistência na tentativa de debilitá-la. Enquanto o governo fala em recuar com o Estado de sítio, ao mesmo tempo o utiliza para manter veículos de comunicação fechados e reprimir.
A desocupação foi sem violência mas foram detidos 55 campesinos em Tegucigalpa. Esses presos se somam às centenas que estão no cárcere e que exigem uma campanha por sua liberdade.
O ato mais brutal foi a repressão à marcha da resistência, que havia se concentrado em frente à sede da rádio Globo. Desde as 8h da manhã, os militantes da resistência começaram a se reunir. Uma resistência que já passou de 90 dias. Gente do povo, campesinos e favelados, chegava a pé ou em veículos modestos. É incrível como se mantém essa resistência depois de tanto tempo. E nela, é muito destacável o papel das mulheres. São muito numerosas, talvez mais da metade da marcha, e incluem desde uma deputada grávida da União Democrática até campesinas, trabalhadoras e professoras. Com muita valentia e coragem, foram as primeiras a se colocar na linha de frente.
Outro papel importante é o dos jornalistas: há cerca de 20 repórteres, muitos deles independentes e dos canais 7, de Argentina, e Telesur. Pouco a pouco, o exército e a polícia nacional foram se posicionando. Se a mobilização chegava a 2 mil pessoas, a tropa tinha cerca de mil. Os jornalistas se colocaram em frente à tropa formada para que os manifestantes pudessem marchar. Mas quando a caminhada passou da tropa, a repressão foi selvagem. Nem nos piores períodos vimos caras de fúria como as desses soldados e suboficiais ao avançar sobre a manifestação, decididos a pará-la de todas as formas.
A repressão foi muito forte, bateram com paus por todos os lados e atiraram gases em grande quantidade. Um jornalista argentino foi golpeado, algo que já é muito comum por parte da repressão do governo golpista. Houve vários feridos, que foram levados para a clínica da resistência.
Apesar da repressão do Estado de sítio, a moral não foi atingida. Ela se mantém, e hoje os manifestantes se concentram no Canal 36, que também foi fechado. De toda forma, está se reavaliando como continuar a resistência.
Ao mesmo tempo, a crise continua. Ler os jornais hondurenhos é encontrar mil propostas de saídas e diálogos, sendo que até agora nenhuma delas parece viável. São as contradições de uma crise política que não se resolve; se a perpetuação de uma ditadura é inviável, não se sabe como fazer para que as eleições pareçam legítimas. Nesse sentido, há um plano para romper o isolamento internacional por parte do governo golpista e da grande burguesia. Hoje, a chanceler do México falou que “o importante são as instituições e não as pessoas”, referindo-se que não há por que defender especificamente a volta de Manuel Zelaya à presidência para que as eleições sejam legitimadas, como se tem exigido até agora. Em Honduras, o golpismo tem feito uma forte campanha, usando as declarações de José Sarney, presidente do Senado brasileiro, pondo-as no mesmo nível que a posição do presidente Lula. E se pretende fazer o mesmo com a delegação de deputados brasileiros, a qual querem apresentar como um novo diálogo, independente do presidente Lula, já que a delegação se reunirá com autoridades do parlamento que apoiaram o golpe.
O “Fora Sarney!” do PSOL e de outras organizações deve ser agora também vinculado ao apoio da posição internacional adotada pelo governo do Brasil em relação a Honduras. Nesse contexto, as manifestações desta sexta-feira, que serão realizadas em vários países da América Latina, têm que ser um ponto de apoio para uma ampla campanha internacional.
Pedro Fuentes é Secretário de Relações Internacionais do PSOL.