Pedro Fuentes
1- A crise de Honduras é o centro da situação Latino-americana. A luta contra o golpe produziu uma mudança qualitativa nesse país com repercussões em todo o continente com dois elementos fundamentais que o explicam:
Em primeiro lugar a emergência de uma resistência como um novo movimento de massas formado em altos e baixos nestes mais de cem dias;
O isolamento internacional que se explica pela existência de um sentimento democrático anti-golpista em toda América Latina que teve como vanguarda a Venezuela, os países da ALBA, Argentina e o Brasil principalmente o governo de Lula que jogou um papel importante contra o golpismo ao abrigar Zelaya no retorno ao seu país.
Se não se pode impor uma ditadura clássica como nos anos 70 – ainda que essa possibilidade não esteja fechada – é conseqüência dessa resistência e o isolamento internacional que teve o golpe.
2 – Nosso partido deu um salto ao relacionar-se de forma direta com essa resistência e uma parte fundamental de sua direção e isso nos coloca desafios e obrigações novas que antes não tínhamos. A presença direta em Honduras primeiro de minha pessoa, seguido depois do companheiro Rodolfo do PSOL-RS e agora o companheiro Neto, é muito importante, porque mostramos a presença concreta de nosso partido e a possibilidade de poder seguir o processo em seu dia a dia.
Das diferentes questões que esta situação coloca, queremos deter-nos em duas: como colaborar com o processo em curso em Honduras, partindo dessas tarefas concretas que estão colocadas aos revolucionários e para a resistência nesse país, e como fazemos isso vinculado a necessidade de dar um salto no processo de reagrupamento internacional o significa que o processo de confluência com outros partidos e organizações políticas que defendam nossos próprios o similares pontos de vista ante este rico processo e a situação continental.
3 – O que domina a atual conjuntura é uma situação de impasse em que se agrava a crise política já que fracassaram as negociações pela segunda vez com a retirada da OEA.
Com a chegada de Zelaya a Honduras situação se agudizou. De um lado a resistência se fortaleceu. Mas ao mesmo tempo o regime acentuou a repressão que foi brutal quando provocou a dispersão das manifestações ao redor da embaixada brasileira quando ali se encontravam três mil manifestantes. A instauração do estado de sítio e o fechamento da rádio Globo e o canal 36 provocou um desconcerto nas convocatórias da resistência e uma baixa na participação em suas mobilizações. Na verdade as manifestações posteriores não superaram os mil, mil e quinhentos manifestantes e sempre foram duramente reprimidas. É importante destacar que o ponto mais alto da mobilização foi o 15 de setembro, dia da independência, dia festivo em que dezenas de milhares de pessoas saíram às ruas em todo o país e posteriormente nas revoltas de bairros que se sucederam e logo se concentraram em Tegucigalpa com o número do qual falamos. A resistência conta com uma grande simpatia popular, isso não se perdeu, mas seu poder de mobilização caiu com a implantação do estado de sítio.
O regime teve que recuar com o estado de sítio já que produziu uma divisão da burguesia que em sua grande maioria aposta nas eleições como forma de canalizar a crise. Mas nem por isso deixou de reprimir. Apesar das diferenças internas, a direita burguesa não se desmontou, conta com um exército sólido e somou apoio internacional com o respaldo ativo dos republicanos dos EUA.. Tem o apoio de um importante setor da burguesia Latino americana entre a qual se contamos com uma parte considerável da burguesia brasileira, e o recuo do governo Obama das primeiras posições categóricas pela volta de Zelaya. O governo de Micheletti começou a usar com certa habilidade a bandeira de que o que se trata em Honduras é de “parar a extensão do chavismo” no continente.
O atual impasse existe porque de um lado a mobilização não pode, não teve a força para provocar uma insurreição geral e com isso o colapso e a derrota do regime. Porque a direita não pode tampouco ir a um regime ditatorial tipo os dos amos 70. E porque agora fracassou o diálogo. O fracasso deste diálogo é conseqüência de que Zelaya não dá acordo aos golpistas; contra a opinião dos setores ultras de que a negociação significava já uma traição de Zelaya, este deu passos corretos. Designou como negociadores a resistência, entre eles Juan Barahona, e manteve irredutível a posição de volta ao poder.
Neste contexto o plano da burguesia dominante e mesmo do Micheletti é prolongar as coisas apostando que as eleições logrem desviar a situação e legitimar o processo golpista. Uma política que não vai fechar nem menos reverter a ruptura de um setor de massas, mas que pode criar novas condições no terreno internacional para os golpistas sobretudo porque os EUA recuou de sua primeira postura. O ponto incontestável de que a política dos EUA não é contra o golpe é que não fez o bloqueio comercial a Honduras, país de quem depende economicamente já que 70% de sua produção é escoada para lá.
4 – Mesmo que a resistência não tenha tido força para desatar uma revolução ou um processo insurrecional, sua ação provocou uma ruptura de massas e um salto na consciência pela qual nada será igual em Honduras, como foi na Venezuela, na Bolívia e no Equador depois das grandes mobilizações que ocorreram nesses países. Não se pode explicar que as negociações hajam fracassado e que Zelaya não tenha capitulado, sem levar em conta o quadro Latino americano de fortalecimento das alternativas bolivarianas de regimes independentes e processos de ruptura com as classes dominantes hegemônicas.
5- Em relação ao processo interno nossa tarefa é apoiar essa direção de massas da resistência que surgiu sendo muito cuidadosos em nossos opiniões nas questões táticos, e apostando numa política que tome em conta a correlação de forças real que existe nesses momentos.
Ao mesmo tempo tarefa estratégica colocada é construir um partido que seja a expressão política desta resistência. Um partido de novo tipo que uma o movimento social e as organizações que estiveram na resistência com a grande vanguarda formada pelas rupturas do partido liberal, os novos agrupamentos e as organizações que como a TR e os Necios estão jogando um papel fundamental nesse processo.
6- Internacionalmente não há condições de grandes mobilizações de solidariedade a não ser que ocorra algum fato novo interno que repercuta internacionalmente como poderia ser um ataque direto a Zelaya. Nosso papel internacionalista é informar e difundir o processo que está ocorrendo, fazer conhecidas as posições dos novos dirigentes que surgiram, colaborar com eles e fazer nas organizações de massas uma campanha que signifique também alguma ajuda concreta a esses setores. Ou seja, uma tarefa que tem como destinatários concretos os principais animadores da resistência.
7 – A partir do seminário, o PSOL, através da Secretaria de Relações Internacionais, construiu-se uma relação nova que não foi casual. Encontramos-nos com forças e organizações políticas especialmente Latino americanas de El Salvador, Honduras, Venezuela, Peru, Argentina, Uruguai, Paraguai, que temos vários pontos em comum. No seminário falamos que tínhamos reeditar um projeto como foi o Fórum de São Paulo, neste novo contexto. E a verdade é que estamos vendo que há condições de aprofundar este processo iniciado que nos leva a uma nova coordenação e um futuro reagrupamento internacional, com a participação de correntes que ao mesmo tempo que rechaçam o sectarismo e o ultra-esquerdismo, não capitularam ao poder da institucionalidade burguesa. C
orrentes revolucionárias que em sua maioria vêm de processos de massas ou atuam dentro de processos de massas. Correntes e organizações que estando no mesmo lado tampouco fazem um seguidismo cego das direções nacionalistas, ou do bolivarianismo. Correntes que têm o desafio de se construir como alternativas políticas de massas em seus países. Isso ocorre em El Salvador e no Uruguai e muito particularmente a possibilidade de que em Honduras esse processo seja de massas é uma realidade concreta.
Acreditamos que temos uma série de pontos em comum para construir um programa comum de ação continental e em cada um de nossos países. A declaração que fizemos no seminário do Brasil foi um primeiro ponto muito parcial de acordo para a ação, mas bem defensivo ante a contra-ofensiva e que é insuficiente para encarar as tarefas comuns que estão colocadas.
Está colocado formular esse programa na esteira das tarefas concretas de solidariedade a Honduras e organizar um encontro internacional já com uma convocatória mais precisa. Acreditamos que isso é uma necessidade e um sentimento comum que já foi tratado em conversas que fizemos entre participantes do seminário internacional. Formular um programa de pontos comuns de acordo não parece tarefa difícil. Dar passos concretos é uma tarefa para os próximos meses para dessa maneira dar um salto qualitativo na esteira do processo hondurenho.
Pedro Fuentes é secretário de relaçõies internacionais do PSol