Apesar das inúmeras manifestações contrárias dos povos indígenas do Xingu ao projeto de Aproveitamento Hidrelétrico (AHE) de Belo Monte , a Funai (Fundação Nacional do Índio) emitiu, no último dia 14 de outubro, parecer favorável no que concerne à avaliação do componente indígena dos Estudos de Impacto Ambiental (EIA) da obra. Um problema a menos para o Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) que anuncia como certa a emissão da licença para esta semana.
A Funai, órgão do governo responsável por questões relacionadas aos povos indígenas, informa que o processo de licenciamento cumpriu o previsto no Decreto Legislativo 788/2005. No entanto, tal decreto, cujo trâmite se deu em tempo recorde no Congresso e Senado em 2005, autorizava a construção da AHE Belo Monte sem determinar quando as populações afetadas, em particular as indígenas, seriam ouvidas. O mesmo decreto foi alvo de representação por parte de organizações da sociedade civil e de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), em 2005, pela Procuradoria Geral da União.
Apesar de não ter sido acatada, a ADI gerou outros recursos judiciais responsáveis pelo adiamento das obras.Previstas na Constituição Federal e na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), as oitivas às populações indígenas deveriam ser parte fundamental na concepção e licenciamento de grandes obras de infra-estrutura – como os projetos de aproveitamento dos recursos hídricos – e de medidas legislativas ou administrativas que possam afetar os povos da floresta. No caso de Belo Monte que, há quase 20 anos enfrenta resistência das comunidades indígenas do Xingu, o desrespeito a essa premissa legal deixa evidente a tentativa de burlar nossa Carta Maior em prol do Plano de Aceleração do Crescimento e dos interesses comerciais de concessionárias e mineradoras de olho na grande janela de oportunidade que Belo Monte representa.
Mas as populações indígenas do Xingu seguem resistindo. No final desse mês, na Aldeia Piaraçu, um grande evento reunirá lideranças indígenas e movimentos ambientalistas para protestar contra o projeto.
Representantes de órgãos de governo incluindo os Ministérios das Minas e Energia e do Meio Ambiente, além dos governadores do Pará e Mato Grosso foram convidados. A julgar pela forma como esse processo vem sendo conduzido, o governo não quer, nem de longe, ouvir a voz que vem do Xingu.
Veja a moção de repúdio das organizações contra o parecer da Funai.
MOÇÃO DE REPÚDIO AO PARECER TÉCNICO EMITIDO PELA FUNAI
Somos os povos das florestas, dos rios, das chuvas, dos povoados, das aldeias, das cidades, dos quilombos, dos assentamentos. Somos muitas vozes fazendo o mesmo chamado: é preciso deter a máquina que empurra o planeta e a humanidade para o abismo. Dar fim ao sistema que transforma a natureza em mercadoria e sobrevive às custas da exploração e humilhação de bilhões de seres humanos. Dizemos que é tempo de libertar o trabalho e a imaginação para reinventar a Terra, e fazer dela a casa comum onde todos vivam com justiça e liberdade.
Condenamos os projetos de grandes usinas hidrelétricas como alternativas de “energia limpa”, como é o caso do projeto de construção da UHE de Belo Monte sobre o Rio Xingu. O discurso utilizado para legitimar projetos de construção de barragens considera apenas o gás metano emitido na superfície do lago, sem sequer mencionar as emissões das turbinas e vertedouros. Esta é uma distorção ainda mais grave no caso de Belo Monte, uma vez que, do
modo como está planejado o projeto, haverá um grande volume de água passando pelas turbinas, o que leva a uma maior emissão de gases.
A energia que será gerada em Belo Monte atenderá, sobretudo, à demanda de grandes empresas eletro-intensivas, que historicamente sempre contribuíram para a destruição da Amazônia, em nome do saqueio e da exportação de nossos recursos naturais. A construção de
Belo Monte atingirá 18 aldeias indígenas, representando desta forma uma ameaça ao modo de vida dos povos originários e das populações tradicionais da Amazônia, verdadeiros interessados na preservação da floresta, e de suas culturas ancestrais.
Não entendemos como a Fundação Nacional do Índio (FUNAI), órgão do Governo Federal constituído para reforçar a cidadania indígena, pode aprovar o projeto da Hidrelétrica de Belo Monte. Enquanto isto, dezenas de líderes Kayapós estarão realizando uma assembléia nas cabeceiras do Rio Xingu, no final deste mês de outubro, rejeitando completamente o projeto.
Pautado nestes elementos, o Comitê Metropolitano do Movimento Xingu Vivo para Sempre, a Rede FAOR, e o FSPA, vem a público denunciar e repudiar o parecer técnico emitido pela FUNAI que, em relação à avaliação do componente indígena dos estudos de impacto ambiental da UHE Belo Monte, considera o empreendimento viável. Uma análise apurada deste parecer mostra facilmente sua fragilidade e inconsistência, deixando clara a única intenção do Governo Federal, do Presidente Luís Inácio “Lula” da Silva, de cumprir as exigências legais e empurrar “goela abaixo” a hidrelétrica de Belo Monte.
Por isso gritamos.
“BELO MONSTRO” NÃO
VIVA A RESISTÊNCIA DOS POVOS DA FLORESTA
VIVA A ALIANÇA ENTRE O CAMPO E A CIDADE
VIVA O RIO XINGU, VIVO PARA SEMPRE
Belém, 25 de outubro de 2009
Comitê Metropolitano do Movimento Xingu Vivo para Sempre: FUNDO DEMA, FASE, IAMAS, IAGUA, APACC, CPT, SDDH, MST, SINTSEP, DCE/UFPA, MLC, GMB/FMAP, UNIPOP, ABONG, CIMI, MANA-MANI, COMITÊ DOROTHY, FUNDAÇÃO TOCAIA, CIA. PAPO SHOW, PSOL, MHF/NRP, COLETIVO JOVEM/REJUMA
Fórum da Amazônia Oriental (FAOR)
Fórum Social Pan-Amazônico (FSPA)
Fonte: Site do Greenpeace