O Plenário da Câmara dos Deputados rejeitou a emenda que estabelecia uma cláusula de barreira para os candidatos participarem de debates de rádio, TV e internet. Essa emenda, votada ontem no Senado ao Projeto de Lei 5498/09 que muda as regras das campanhas eleitorais, estabelecia que só tivessem direito de participar dos debates os candidatos de partidos com no mínimo 10 deputados na Câmara.
O Plenário aprovou três das 67 emendas aprovadas ontem no Senado, entre elas as que tratam do uso da internet. Os deputados mantiveram a liberdade dos sites e blogs para expressar a opinião por um ou outro candidato, ressalvado o direito de resposta. A respeito da propaganda paga, os parlamentares retiraram a permissão para que candidatos à Presidência paguem por anúncios em sites jornalísticos. Foi derrotada também em plenário , por 221 votos a 38 e 2 abstenções, um destaque do PSDB . O partido queria aprovar emenda para permitir a divulgação de propaganda eleitoral paga na internet até a antevéspera das eleições presidenciais.
O projeto segue agora para a sanção presidencial, como foi votado antes de 3 outubro já vale para as eleições de 2010.
Contra os interesses comerciais da grande mídia
O PSOL teve papel destacado na resistência à tentativa de cercear o debate político e restringir a participação de candidatos. A proposta votada no Senado foi feita sob pressão dos grandes meios de comunicação, interessados em empacotar os debates segundo seus interesses comerciais e políticos. O senador José Nery protestou contra a votação da emenda e destacou que o PSOL recorreria ao STF caso a proposta não fosse derrubada na Câmara. “Não podemos aceitar tratamento diferenciado na participação dos partidos e de seus representantes. Ficará a bel prazer dos órgãos de comunicação garantir a participação dos pequenos partidos. É um retrocesso que não podemos aceitar”, declarou Nery logo após a votação da emenda no Senado.
Na opinião do deputado Ivan Valente, caso fosse aplicada a regra estaria inviabilizado a participação dos partidos ideológicos, os que têm propostas alternativas para apresentar à sociedade. Pouco antes da votação em plenário, Ivan Valente fez um pronunciamento onde destacou os principais problemas da cláusula de barreira e fez outras considerações sobre as emendas votadas no Senado e a pressão da grande mídia para distorcer o projeto.
Leia o pronunciamento na íntegra:
Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, ocupamos a tribuna neste momento para falar de algo muito grave que ocorreu no Senado Federal, ontem, com mudanças na Lei Eleitoral. Particularmente, uma questão quero tratar aqui: a mudança feita, que estabeleceu uma nova cláusula de barreira.
Para os partidos políticos participarem de debates públicos nos meios de comunicação será necessário que tenham, no mínimo, 10 Deputados. Ou seja, já amputaríamos vários partidos com assento nesta Casa. Aqueles que têm 12, 13, 14 Deputados estariam também quase ameaçados.
Essa proposta estabelece uma cláusula de barreira. Ela é antidemocrática, inviabiliza os partidos programáticos, ideológicos, que têm o que mostrar para a sociedade, de participar dos debates públicos para concorrer.
Mais do que isso, estamos inviabilizando o surgimento de novos partidos que tenham reconhecimento e legitimidade na sociedade; estamos estabelecendo que só os grandes partidos — e ainda permitindo o financiamento privado de campanha — é que podem participar dos debates, ou, então, a critério dos donos dos meios de comunicação de massa. É disso que se trata.
Quero dar um exemplo paradigmático. A ex-Senadora Heloísa Helena, do PSOL, participou do processo presidencial em 2006 e obteve a votação gigantesca de 7 milhões de votos, chegando a ter 12%. Hoje, ela está em todas as pesquisas de opinião com 12 a 24% nas intenções de voto, dependendo do cenário político.
Pois bem. Ela não participaria dos debates, porque o PSOL só tem 3 Deputados na Casa.
É alguém que está concorrendo e competindo para vencer inclusive, que tem respeitabilidade programática e ideológica na sociedade.
Ora, é evidente que alguém poderia dizer: Os órgãos de comunicação terão bom senso. Os donos dos meios de comunicação se guiam pelas regras do mercado financeiro — do mercado! —, aquilo que lhes interessa. Se isso proporciona maior ou melhor ganho. Nós não podemos submeter a democracia brasileira à boa vontade de quem está no comando dos grandes órgãos de comunicação deste País.
Por isso, Sr. Presidente, nós não aprovamos isso na Câmara, está voltando para a Casa. Nós pedimos a imediata retirada desse dispositivo, sua supressão, ao Relator do processo, e a todos os partidos políticos que falam em democracia, que querem garantir o debate transparente e democrático, que sejam favoráveis a essa retirada.
Sr. Presidente, a outra questão diz respeito ao que falsamente estão chamando de liberdade total na Internet. A liberdade total na Internet é para o cidadão, o usuário dos meios eletrônicos de comunicação. Ou seja, nós entendemos que o cidadão no seu blog, no seu site, no seu site de relacionamento, no twitter, possa fazer propaganda de quem quiser. Mas devemos levar em conta que os grandes portais de comunicação pertencem exatamente às grandes empresas de comunicação deste País. São os mesmos. E lá também estão cerceados de participar os partidos que não alcancem a nova cláusula de barreira de, no mínimo, 10 Deputados Federais.
Ora, nós elegemos os Deputados da outra Legislatura. Isso inclusive viola a resolução do Supremo Tribunal Federal contra a cláusula de barreira. Por isso, somos contra essas 2 manifestações. E mais, entendo que a Câmara deve rejeitar essas propostas que vieram do Senado, manter o seu projeto, ao qual temos muitas críticas, mas, assim mesmo, é bem melhor do que o outro.
Anuncio que, se isso não ocorrer, só nos restará recorrer ao Supremo Tribunal Federal, porque entendemos que essa medida quer inviabilizar, quer impedir o livre debate democrático, quer transferir aos grandes meios de comunicação, sejam eletrônicos, sejam televisivos, sejam radiofônicos, aos grandes jornais o direito de dizer quem vai participar dos debates. Não há bom senso que dê jeito nisso. Ali vale a regra para fazer o jogo do mercado ou então escolher uma candidatura para fazer campanha. Isso nós não podemos aceitar. Não é democrático. Aqui se discutem regras para a população brasileira.
Muito obrigado.